Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCLXXIII)

Lavre, 22 de junho de 2043

Saramago viveu em Lavre, no concelho de Montemor-o-Novo, durante o tempo em que escreveu a obra “Levantados do Chão”, relatando a vida de um povo sofrido, num período compreendido entre o final do século XIX e até ao último quartel do século XX. 

Nesse tempo, como diria o Almada, todos os tratados que visavam salvar o mundo já estavam escritos, só faltava salvar o mundo. Quando decidi ser professor, todos os tratados que visavam salvar a Educação já estavam escritos, só faltava salvar a Educação. Muitos “manifestos” foram publicados, milhares de inúteis congressos foram realizados, inúmeras inúteis formações concretizadas, ao longo de mais de um século. Generosas intenções, redentoras teorias, excelentes projetos se perderam nos meandros de um pérfido sistema de ensinagem. 

Faz hoje vinte anos, duas Cristinas e uma Caetana preparavam um encontro, que marcaria para sempre (e apesar de sofridos retrocessos) o rumo da Educação que se fez nas décadas de vinte e de trinta. Os projetos educativos desse tempo eram quase cópias uns dos outros, sem correspondência prática.  Mas, o diretor João assumira algumas propostas de prática, que seriam levadas “à letra”, nos anos que se seguiram ao encontro do junho de vinte e três. 

O enunciado de princípios era claro: 

“Prestar um serviço educativo de qualidade num ambiente democrático de equidade e de inclusão, numa lógica de interdisciplinaridade, rompendo, de forma gradual, com a lógica da segmentação disciplinar;

abandonar o paradigma da educação transmissiva e fomentar práticas ativas e aprendizagens significativas, como meio de promover e valorizar a aprendizagem, a participação, o esforço e o saber de cada um e o bem-estar de comunidade educativa;

ultrapassar os muros da sala de aula e abrir a aprendizagem a diferentes espaços, formando cidadãos autónomos, responsáveis, participativos, solidários e com espírito crítico;

conceber uma escola em que todos participam de forma ativa.”

Lestes bem! “Abandonar o paradigma da educação transmissiva”, “ultrapassar os muros da sala de aula”, intenções que levaríamos às últimas consequências. E… 

“Proporcionar um serviço educativo de qualidade mobilizando os meios de que o Agrupamento dispõe, para que todos aprendam e participem ativamente na vida da comunidade educativa, numa lógica de Agrupamento moderno e atualizado, dinâmico e inovador, capaz de favorecer ambientes e contextos educativos e formativos, facilitadores de aprendizagens em cooperação e articulação com a comunidade, incentivando a formação de cidadãos livres, autónomos, responsáveis, conscientes de si e do mundo que os rodeia, criativos, interventivos e empreendedores, capazes enfrentar os desafios de uma sociedade globalizante.”

“Aprendizagens em cooperação e articulação com a comunidade (…) uma escola dinâmica, inovadora, no contexto local e regional, sob uma identidade própria e aceite pela comunidade” (sic), uma aprendizagem no exercício pleno de cidadania. 

Se uma escola não mudava como um todo, que mudasse quem tomasse a decisão ética de mudar. Se havia diretores-ditadores que impediam mudanças, também havia diretores democráticos, como o de Montemor-o-Novo, que criavam condições para tal. 

No cartaz de anúncio do encontro de 29 de junho estavam escritas as palavras “Educação, Inovação, Ética”. Seriam evidentes no projeto escrito e numa prática coerente. Em Montemor, como em outros lugares onde a ética prevalecia e a inovação realmente acontecia, o tempo do faz-de-conta-que-fazemos terminava.

 

Por: José Pacheco

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