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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCCCLXII)

Porto, 29 de abril de 2042

Pessoa adulta, sensível, o António não desistia de escutar a criança que havia em si e fazia-me recordar palavras das crianças de uma escola lusa, que ele visitou. Escreveram no seu “jardim da poesia”: as palavras são como as cerejas / esta palavra é irmão / Aquela palavra é silêncio. E, no português de Portugal, o António transmutava a minha saudade da pátria em prodigiosas considerações, num labor que, harmoniosamente, misturava avencas na catinga com alecrim no canavial…

Quer na Escola da Ponte (que o amigo António visitou no início deste século), quer na Escola da Várzea de Sintra, quer ainda nas pontes que buscava fazer num Brasil palpitante de sonhos e de inícios, reencontrava nas palavras do António ecos de uma pátria de exílios. Mas, também, a intenção de re-ligare

O António tinha consciência de que um projeto pressupunha superação de limites, através de processos de cooperação, geradores de solidariedade, respeito mútuo, formação cidadã, que caracterizavam um paradigma educacional emergente. 

Era nesse sentido que o António sublinhava a necessidade do investimento no trabalho de equipe, gerador de espaços de práticas educativas reflexivas, propiciadoras de produção e de partilha de saberes, contribuindo para que professores e alunos assumissem com inteligência crítica o seu papel de agentes ativos de transformação social. 

O António dava sentido à sua vida, dando sentido à vida dos jovens. Com ele, senti ser necessário agir num silêncio “escutatório”, fundamento do reconhecimento do outro. Numa relação de escuta, a circulação de afetos produzia novos modos de estruturação social. No contexto do exercício da profissão, não se negava o potencial da razão e da reflexão, mas se agregava emoções, intuições, experiências de vida. 

A escuta, para além do seu significado metodológico, teria de ser humanamente significativa, de abdicar de atitudes magistrais, para que todos os intervenientes aprendessem mediados pelo mundo.

Vem tudo isto a propósito de um episódio exemplar. No abril de vinte e dois, a Francisca e o Francisco me levaram até à Faculdade de Letras do Porto. Foi frutuoso o diálogo com os alunos. No final, um professor de Didática, se mostrou a antítese do António, pois manifestou incômodo e fez questão de dizer que, em sala de aula, conseguia “praticar metodologias ativas”.  

Compassivamente, lhe disse que nunca demonizei a aula. Eu afirmava, fundamentando, a impossiblidade de o instrucionismo rimar com “metodologias ativas”, por exemplo. E que a introdução de paliativos em sala de aula nada acrescentava ao frontal anônimo onde a individualização e a personalização raramente aconteciam.

Deveríamos valorizar aquilo que de muito bom se fazia. Valorizava a competência dos professores, que, através da Didática, ou de qualquer outro modo, se assumiam como mestres, quando o discípulo estava pronto para aprender. Mas não esquecia que, por melhor que fosse a qualidade de uma prática, seria possível melhorá-la, a partir daquilo que nela era bem-feito, criando dispositivos para resolução de pontos identificados como frágeis. 

Era esse um dos papéis da formação. De uma formação que acontecia quando o educador se decifrava através de um diálogo entre o eu que agia e o eu que se interrogava. 

Para que acontecesse mudança e inovação, não eram somente necessários bons projetos de formação, eram necessários projetos sustentáveis de desenvolvimento. Como diria o poeta da reinvenção, o Manoel de Barros, aprender é desaprender, para vencer o que nos encerra e aliena”

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCCCLXI)

Góis, 28 de abril de 2042

Queridos netos, no abril de há vinte anos, andarilhei por terras do Alto Minho acompanhado por pessoas de bondade em estado puro. Em Crasto, fui acolhido pela família do João. Depois, viajei para Vieira, ao encontro de educadores de um agrupamento de escolas, que viria a integrar o projeto das comunidades.

Terminei o périplo desse dia em Braga. No decurso do evento no Conservatório de Música, proporcionado por um extraordinário ser humano de nome Jaqueline, e no encontro com professores de Religião e Moral, propiciado por outro extraordinário ser humano chamado Paulo, pude comprovar que uma nova geração surgia disposta a operar transformações. Mas, a sua generosidade não era suficiente. Ajudei-os a transformar sonhos em realidades.

O “como fazer” estava acoplado ao “por que e porquê fazer”. Isso mesmo: a par da ajuda prática, resolvi tornar pública parte da construção teórica, que se vinha acumulando na memória do meu velho computador, aguardando testagem. 

Hoje, pretendo falar-vos dos círculos de aprendizagem, enquanto projecto existencial. E é bom que vades guardando estas bagatelas, mais ou menos, teóricas, porque eu não duro sempre e vos cumpre continuar a conferir-lhes significado, a revê-las, a atualizá-las.

Naquele tempo, o círculo de aprendizagem concretizava algumas das muitas correntes do campo da aprendizagem: a livre escolha do objecto, assim como o momento e o lugar, considerando o sujeito de aprendizagem no contexto de uma relação comunitária, criando vínculos.

O compromisso do indivíduo com uma prática desse tipo radicava em projectos de existência que, de latentes, se tornavam deliberação, ação. O aprendiz decidia suportar o questionamento da sua prática, a exploração da sua própria identidade, porque se supunha acompanhado de pares com idêntica disposição. 

Esse questionamento não era meramente intelectual, mas existencial, um modo concreto de escapar a um destino pré-estabelecido. Para tal,  o círculo oferecia ainda o testemunho alheio, que confirmava ou contrariava o vivido pessoal, prefigurando a utopia dos pequenos grupos não uniformizados, que escapavam ao círculo vicioso da reprodução através da reinvenção de formas criativas de resistência. 

As utopias não tinham morrido: transformavam-se. Eram absoluta e urgentemente necessárias como função crítica do real. Nos espaços intersticiais das contradições dos sistemas sociais, seria preciso mobilizar essas energias criativas fundadoras de uma atividade humana não alienada.

Num livro polêmico do início da década de noventa, Fukwyama escrevera:

“Uma forte vida comunitária é, em democracia, a melhor garantia para que os seus cidadãos não se transformem nos últimos homens”. 

Reconhecia-se a existência de uma centralidade subterrânea e informal, que assegurava o perdurar da vida em sociedade. Era na direcção dessa realidade que deveríamos olhar. Tratava-se de um desafio para decénios vindouros. Um desafio não desprovido de riscos e obstáculos. 

Comparadas  às obrigações absolutas, que uniam os indivíduos nas estruturas autoritárias, as comunidades aglutinadas por um interesse próprio comum, demonstravam múltiplas fraquezas. O irracional originário, as inquietações, as errâncias, os desejos, eram cimento forte, mas não suficiente para a sua preservação. Importava vigiar o erro, que nos preservasse de erros alheios.

Não me recordo se lera algures que as instituições eram a medida do Homem, mas sabia que o círculo de aprendizagem poderia ser um aferidor do instituído que oprimia. 

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCCCLX)

Várzea de Sintra, 27 de abril de 2042

Vai para vinte anos, o amigo António me convidou para redigir um prefácio para o seu livro. Esse livro prestava um excelente serviço à causa da Escola Pública. Tratava-se de uma obra rara, dado que o seu autor habitava do chão da escola. Se obras congêneres consistiam em teorizações de teorias, essa falava-nos de uma práxis, isto é: de uma prática coerente com a fundamentação teórica, que o autor muito bem sinalizava. 

A obra expunha algumas preocupações, nomeadamente, sobre a necessidade de se aprofundar o conceito de ” flexibilização curricular”. Surgia num momento crítico, num tempo em que decorria mais uma tentativa de “autonomia e flexibilização curricular”. Eu, que já passara por quatro projetos de “flexibilização”, por quatro oportunidades perdidas, sabia que pouco ou nada fora flexibilizado com esse novo velho projeto. A intenção seria, secundando a obra do António, a de procurar evitar que a generosidade dos colegas que participavam do projeto se convertesse, mais uma vez, em desilusão. 

Causou-me grande espanto e apreensão ver uma proposta de “flexibilização” reduzida a um singelo jogo de somas e subtrações de tempos letivos. Apercebi-me de que a ênfase na “organização” se referia a passar de trimestre para semestre e outras minudências. Não seria a “flexibilização” muito mais do que simples alterações na gestão de tempos, dos espaços, ou no elenco de conteúdos e matrizes curriculares?

O voluntarismo dos agrupamentos de escolas deveria ser realçado. Mas o entusiasmo, por si só, não era suficiente. Um projeto desse tipo pressupunha auto iniciativa, não se poderia restringir à adesão a propostas ministeriais. Essas propostas, por mais meritórias que fossem, deveriam ser reinterpretadas, permanentemente refletidas, para que não se constituíssem em réplicas, cópias sem identidade. Fora o hábito de mera interpretação técnica de diretrizes, em detrimento da iniciativa das escolas, a mesma que condenara ao esquecimento muitas úteis iniciativas, que as transformou em clonagens sem nexo. 

Há bem pouco tempo, no decurso de um debate, alguém perguntara por que se tinha reduzido tempos numa determinada disciplina e aumentado em outra. Ninguém se dignou responder. E haveria resposta? Se a compartimentação disciplinar contrariava a emergência de verdadeiros projetos educativos, também a neurótica preocupação de dar o programa fazia prevalecer a lógica do ensino em detrimento da lógica da aprendizagem e produzia uma “caricatura” de flexibilização curricular.

Analisei as fichas de avaliação do chamado “projeto de flexibilização curricular”. Deparei com itens como: ““% de carga horária a gerir livremente”, ou “carga horária (minutos) por ciclo/nível e ano”. Eram “contas de mercearia”, que denotavam um determinado conceito de currículo. Impunemente, se continuava a contrariar o disposto na lei: “primado dos critérios de natureza pedagógica sobre os critérios de natureza administrativa e à possibilidade de adoção de soluções organizativas diversas”.

No início do projeto da “autonomia e flexibilização curricular, tudo ficava como antes estava, quando era toda a cultura de escola que urgia mudar. Seria preciso saber se estaríamos a lançar andaimes onde assentassem novas práticas de desenvolvimento curricular, ou se estaríamos apenas a pôr remendos em velhas rotinas. 

O que mais me desgostava era o fato de ser alguém formado em ciências da educação a coordenar esse inútil projeto, pois era obscena a conivência com espúrios desígnios ministeriais. 

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCCCLIX)

Sobral de Monte Agraço, 26 de abril de 2042

A estória conta-se em poucas palavras. Tudo começou com a morte da mãe do João e com o namorico do Artur. 

O João era dotado de uma inteligência excepcional. Apesar da sua origem humilde, “estava fadado para altos voos” (no dizer da Professora Lurdes). Até ao dia em que a sua mãe faleceu e, sendo o irmão mais velho de seis irmãos, foi trabalhar na construção civil, para os sustentar. Ofereci-me para o ajudar nos estudos, mas o cansaço de um trabalho insano o fez desistir, nada pude fazer por ele.

O Artur, jovem de inteligência mediana, desistira de estudar, até ao dia em que conheceu a Ilidia. Ela, filha de pai milionário; ele, morador da miserável Ilha dos Tigres. Pediu-me ajuda, para tentar entrar na Universidade, para chegar a ser engenheiro e poder pedir a Ilidia em casamento. Fui um improvisado “explicador” do Artur. Passou no exame de acesso à Universidade, se fez engenheiro, ficou rico e conseguiu do pai da Ilidia a autorização para a desposar.

Nesses destinos opostos, me descobri educador vocacionado para extinguir ou, pelo menos, desgastar uma manifesta desigualdade social, o que não era empresa fácil, como iremos ver. 

Decorria o ano de 1976, quando uma escola ousou desobedecer às ordens expressas da Inspeção Escolar e escapar às armadilhas da sorte, logrando estabelecer práticas do paradigma da aprendizagem. Nessa escolinha o aluno assumiu autonomia, passou de objeto a sujeito de aprendizagem, ou como se dizia nessa altura, passou a ser “protagonista”.

Não se apagou a figura do professor, apenas se modificou o seu papel. À semelhança dos seus alunos, o professor se assumiu como sujeito autônomo, na dignidade de trabalhador da educação, ao serviço de um projeto que uma comunidade adotara.

Trinta anos após esses eventos, a Ponte era bem conhecida lá fora, enquanto era ignorada na sua terra. Só porque os seus professores tomaram a decisão ética de inovar, a escola sofria violências sem conta. Deixei-a com um contrato de autonomia e me ausentei do país que a maltratava e tentava destruir.

Voltei, vinte anos depois, e apercebi-me de que no país de brandos costumes pouco ou nada havia mudado. Uma cortina de silêncio caíra sobre a escola que pela primeira vez na história da educação, passara do instrucionismo à aprendizagem. Embora os seus educadores fizessem cursos na Internet e fossem convidados para palestras, raras escolas seguiam o seu exemplo.

O sistema estava tão instrucionista como em 2003. Durante esses vinte anos, tinham-se sucedido regulamentações da lei, que dissiparam o que de autonomia havia no contrato firmado entre a Ponte e o ministério, em 2004. 

Quisera saber se restava algo da Ponte que deixara nos primeiros anos deste século. Visitei-a, soube dela pelos olhares atentos de doutorandos, conversei com ex-alunos. O essencial fora preservado. Sobretudo no domínio de uma educação cidadã. aquela que o Nóvoa mencionara num comentário a um ensaio de António Sérgio:

“A escola de António Sérgio é, acima de tudo, caracterizada pelo valor pedagógico da autonomia e, por isso, sugere: “não vos canseis com os problemas de compêndios e programas: cumpre revolucionar os próprios métodos, o ambiente social em que a criança vive”. 

Em 2022, o Programa de Governo para a Educação continha objetivos que a Ponte concretizara em… 1976. Talvez por isso, Nóvoa concluísse a sua análise com estas palavras:

“Self-government, foral, município escolar”, palavras que me permitem, à luz daquilo que conheço da Escola da Ponte, sugerir uma releitura das propostas de António Sérgio”. 

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCCCLVIII)

Braga, 25 de abril de 2042

A minha “carreira” foi subitamente interrompida, quando o país precisava de “carne para canhão”. Eram três as frentes da guerra colonial. E, sabendo o regime que o vosso avô era “contra a Ditadura”, fez de um jovem estrábico um atirador de infantaria. 

Sempre que me perguntavam por que trocara a engenharia pela educação, eu respondia:

“Quando decidimos ser professor, fazemo-lo por uma de duas razões: ou por amor, ou por vingança. Fui para a educação por vingança. Nela fiquei por amor”.

Fracassou a intenção de me fazer morrer em terras africanas. E quem se “vingou” fui eu. Militar pacifista, no “25 de abril” de 74, vesti farda de combate, para ajudar a fazer a “Revolução dos Cravos”, extinguir o fascismo, recuperar a democracia. 

Educador consciente de que ninguém adormecera “fascista” no dia 24 de abril, nem acordara “democrata”, no dia 25, me lancei na senda de uma educação libertária. Pois, como diria o amigo Marcos, “os “dias de” não passam mesmo de uma efemeridade, de um analgésico para entorpecer a responsabilidade nossa de todos os dias”. 

A Ditadura durara 48 anos. O “25 de abril da Educação” demorou 48 anos a chegar, o tempo em que vigorou uma espécie de “ditadura da burocracia”. 

O 25 de abril de 2022 me encontrou em Braga. Na mesma cidade onde, no “28 de maio” de 1970, o dia comemorativo da implantação da Ditadura de Salazar, eu estivera. 

Era um jovem impulsivo. Intervim no evento, criticando o regime. E experimentei as consequências desse irresponsável ato. Nada que se comparasse ao sofrimento daqueles que pagaram com a vida a ousadia de defender ideias democráticos. 

48 anos depois, os presos políticos do tempo da Ditadura lutavam pela preservação de uma memória coletiva. Nos jornais, alertavam para o branqueamento do fascismo e recordavam a dura Ditadura: 

Maria e José, presos políticos durante o Estado Novo, pagaram com o corpo por lutarem pela liberdade, contra a censura, contra a guerra colonial, pelos direitos dos jovens e das mulheres. Por ser visto como um líder nas ruas, José foi muito torturado. 

“Acreditem, foi realmente muito duro. Eu já devia estar praticamente a morrer quando eles desistiram. Portanto, viram que eu não falava” – conta, incapaz de conter as lágrimas. Foi interrogado durante 21 dia e só dormiu uma noite. Foram mais de 500 horas de tortura, que deixaram marcas no corpo e na memória. 

Nos idos de vinte, quando assisti à ascensão ao poder de alguém que venerava torturadores e à ascensão da extrema-direita na França, deparei com uma mensagem de WhatsApp, que dizia assim:

“Madame Le Pen pode ganhar na próxima.  Tem projetos nacionais, embora todos horrorosos. Mas já tem 41,2% dos votos. Em Portugal, a extrema direita passou de 1 para 12 deputados na Assembleia da República”.

Comentei o “post”:

“Na França, em Portugal, como nos EUA ou na Rússia, basta ficar atento ao que se fez (e se continua a fazer) da educação familiar, social e escolar, para encontrar uma primeira explicação para esse fenômeno.

Com paliativos pedagógicos mantemos um instrucionismo que agoniza, desde há mais de um século. Nem sequer criamos práticas fundamentadas no paradigma da aprendizagem (são escassas as iniciativas, são particulares e, quase todas, caricaturais). Urge conceber uma Nova Construção Social de Educação, síntese dos dois paradigmas e acrescentada de contribuições do paradigma da comunicação. Se o não fizermos, novas ucrânias surgirão. Os extremismos se consolidarão, a barbárie se instalará”.

Como dissera a Mónica, “quando o Homem para de se questionar, a Humanidade para de evoluir”.

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCCCLVII)

Braga, 24 de abril de 2042

No Facebook de há vinte anos, se dava notícia de pequenos grandes passos de humanização, que eram dados em Mogi das Cruzes. 

O amigo André memorava que tivera início o Projeto de Educação Integral. Regressado ao Grande ABC, consciente de que fizera o melhor possível, o André desejava que todas as crianças fossem bem-sucedidas em sua Jornada do Conhecimento. Aos Profissionais de Educação do Município reiterava a honra de ter trabalhado lado a lado com pessoas tão dedicadas.

O amigo Wander escrevia:

Comunidades de Aprendizagem de Mogi das Cruzes, 7 de abril de 2022: Cerimônia de posse do Conselho Mirim na EM Professora Florisa Faustino Pinto.

Falar de protagonismo da criança virou modinha e todo mundo fala, mas dar espaço real para o protagonismo da criança, dar oportunidade para que elas falem, se posicionem e participem de decisões, isso é raro e muito precioso”. 

Fraternas e auspiciosas notícias iam chegando de Mogi, de Maricá e de muitos outros lugares. Há vinte anos (finalmente!) chegava ao Brasil uma educação do século XXI.

Em Portugal, um movimento de renovação se esboçava. O amigo António, que até chegara a estar prestes a “soçobrar”, a desistir, tentava, mais uma vez, fazer-se ouvir. 

“A escola do século XXI deve ser a escola da aprendizagem (profunda), das competências (para a vida) e da comunicação. A resposta a esta necessidade de transformação tem de brotar por dentro das escolas e das comunidades de que são parte integrante. 

A escola pública, que continuamos a ter (mesmo com novos edifícios), é velha, cheira a bolor e está a estrebuchar de incapacidade em dar uma resposta eficaz às necessidades das crianças e dos jovens que a frequentam. 

Chega de dizer (sempre e de cada vez que se tenta mudar alguma coisa) que o problema é de outros. A resposta tem de vir de cada um de nós (diretores de escola e professores, em primeiro lugar). Sem estes atores (educativos e não burocráticos) terem uma visão clara e determinada do que é necessário fazer, andaremos a navegar ao sabor das ondas, “surfando” aquela que permita continuar a “boiar” em cima da “prancha” e manter-nos num lugar que dá jeito ter (diretor de escola), ou que é necessário ocupar por uma questão de sobrevivência. 

A mudança necessita de pessoas com visão de futuro, corajosas, determinadas e capazes. De facto, não basta sabermos muita coisa, termos muita informação. Informação não é Conhecimento. O saber, por si só, não altera nenhuma realidade. É fundamental termos consciência, ou seja, aplicar o conhecimento que construímos a partir da informação que temos. 

Dito de outro modo, é urgente nas escolas uma nova práxis pedagógica (fundamentada na ciência e na lei) que substitua a racionalidade anterior, pois ela é, atualmente, muito irracional. É necessária uma práxis que faz da aprendizagem significativa e da autorregulação da aprendizagem com conteúdos (projetos) diversificados a nova dimensão da ação pedagógica dos professores e da aprendizagem dos alunos. 

Para isso temos (ainda) de continuar a mudar muita coisa nas escolas: nos projetos educativos, no desenvolvimento curricular, nas (tristes) salas de aula, na ação pedagógica e na interação com a comunidade. 

Essa mudança, para tornarmos a escola pública portuguesa num espaço educativo de felicidade e de verdadeira aprendizagem, começa em cada um de nós, no seio de uma equipa educativa”.

Pois, até já Gandhi o dissera:

“Quando um homem muda a sua própria natureza, a atitude do mundo muda para ele. Este é o mistério divino supremo. Não precisamos esperar para ver o que os outros fazem.” 

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCCCLVI)

Valongo, 23 de abril de 2042

Nunca aceitei convites para cargos, a eles acedi por via de concurso, ou eleição. Por isso, quando recebi convite de cooptação para o Conselho Nacional de Educação e, gentilmente, recusei. 

Viria a ser eleito para esse órgão, como representante da Educação Básica. Durante alguns anos, redigi propostas, relatórios, “pareceres” sobre propostas de lei.

O CNE era constituído, maioritariamente, por reitores e professores universitários. Sendo eruditos nas suas áreas de especialização, as ciências da educação eram para eles “ciências ocultas”. Embora bem-intencionados nas suas reflexões, ignoravam as origens das crises vividas no chão das escolas da Educação Básica. Mas, os seus votos decidiam os rumos da… Educação Básica.

Quando, no início do ano 2000, foi publicado em Diário da República o “Parecer sobre a Proposta de Lei de Reorganização Curricular”, apesar de o meu nome constar como coautor do Parecer, nele não me reconheci. O documento fora descaracterizado. 

Foi a “gota de água”. No final do meu mandato, quando a Teresa (a presidente do CNE) me perguntou se eu aceitaria o convite de conselheiro “cooptado” (não eleito), agradeci e o declinei. Fui correr mundo. 

Entretanto, numa das minhas últimas reuniões do Conselho, se a memória não me trai, discutia-se o sistema de financiamento das universidades. Sendo eu leigo na matéria, não me pronunciei sobre o assunto. E abstive-me no momento da votação. 

A Presidente dirigiu-se a mim nestes termos:

“Senhor conselheiro, o senhor sempre participa dos debates. Por que não se pronunciou neste caso?”

Se a maravilhosa (e irônica) Teresa teve a amabilidade de questionar a minha atitude, mereceu resposta:

“Senhora Presidente, os meus colegas universitários têm decido em assuntos da Educação Básica. Mas eu não me sinto competente para debater e votar questões que têm a ver com a Universidade”.

O ambiente ficou pesado naquela sala. Rostos carrancudos, uma “gentil” agressividade no ar… 

Há vinte anos, professores, diretores de agrupamento, autarcas e comunidades, crentes de que poderia ajudá-los, me convidaram a voltar a Portugal. Assim fiz. Renovada a esperança, eis-me viajando pelo país, reencontrando velhos amigos, assistindo ao emergir de uma nova geração de educadores. Também, com a agradável surpresa de encontrar muitas famílias, que, conscientes da miséria das práticas pedagógicas e dos maus-tratos sofridos pelos seus filhos, exigiam uma nova educação, uma nova escola.

Quis saber em que ponto estava o debate sobre novas propostas educacionais. Concluí que tinham sido assimiladas e neutralizadas. Velhos amigos colaboravam com a tradicional e desastrosa política ministerial, participando em estéreis debates, coordenando inúteis (e dispendiosos) projetos. 

Ontem, remexi no baú das velharias, procurando registos de palestras realizadas por amigos, nos idos de vinte. Num velho computador, consegui fazer funcionar uma, também, velha “pen drive”. E o que vi e ouvi esclareceu e confirmou o que eu vira e ouvira… vinte anos antes. Apresentando uma excelente fundamentação teórica, cientistas da educação determinavam o que deveria ser a Educação Básica, nos mesmos termos em que o tinham feito… vinte anos antes. 

Saturado da redundância teoricista, num abril dos idos de vinte, me irmanei com centenas de educadores, em mais uma tentativa – seria a minha última tentativa – de formação transformadora. Estavam reunidas condições para que a mudança e a inovação acontecessem. À margem dos teoricistas. No chão das escolas.

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCCCLV)

Sintra, 22 de abril de 2042

Vai para vinte anos, a minha amiga Ana deu-me boleia para as Caldas e o amigo João me levou até Sintra, ao encontro da Paula e de novas aprendizagens. Ainda hoje, guardo boas recordações desse dia. Ganhei uma amiga e, como cantaria o Sérgio, “coisa mais preciosa no mundo não há”. 

Nesse dia e ao cabo de meio século em que me considerei apenas professor, na companhia de designers me reconheci como “designer educacional”. Grata surpresa, num tempo em que já escasseavam as forças para empreender novos rumos profissionais. 

No último dos dias passados em Santarém, tinha ido com o Ricardo e a Joana a um encontro realizado na Escola Superior de Educação. A Joana carregava no seu ventre uma Luz prestes a ver a luz e já procurava modo de bem educar a sua filha, que isto de mudança em educação leva muitos anos a fazer.

Esperava-me uma sala repleta de jovens estudantes e alguns professores. Tive ensejo de conhecer gente interessada em rever a formação de professores. Falei-lhes de um livro que o amigo António havia publicado. E dei-lhes a conhecer parte do seu conteúdo. 

“Se tudo muda à nossa volta, por que motivo a escola pública continua assente em bases conceptuais com mais de duzentos anos de idade? Não será essa uma realidade muito irracional? Convenhamos que sim.

Sabemos, através das ciências da educação, que a escola pública foi uma criação do “Estado-Nação”, desempenhando um papel fundamental na emergência do “Estado-Educador”, através de um processo massivo de escolarização (a escola de massas). Este, que levou à formação dos sistemas nacionais de ensino, hierarquizados em níveis e anos de escolaridade e constituídos por disciplinas com programas próprios e únicos (de tipo prescritivo).

A este modo (burocrático) de coordenação estava associado um outro, de tipo profissional: o profissionalismo dos professores, expresso pela chamada “racionalidade pedagógica”. Tudo muito racional, como convinha para esse tempo. 

Mas, “tudo quanto vive vive porque muda; muda porque passa; e, porque passa, morre. Tudo quanto vive perpetuamente se torna outra coisa, constantemente se nega, se furta à vida. A vida é um intervalo, um nexo, uma relação, mas uma relação entre o que passou e o que passará”, lembra-nos Fernando Pessoa (através do heterónimo Bernardo Soares) no seu Livro do Desassossego.

Sabemos muita coisa… sabemos que a escola que continuamos a ter é a escola do ensino (heterónomo), do conteúdo (prescritivo) e da transmissão. É essa a trilogia da racionalidade pedagógica do paradigma da escolástica.

Esta realidade, em pleno século XXI deve ser entendida como um problema, uma realidade desadequada à vida atual. Na verdade, se pensarmos nas caraterísticas da nossa sociedade, rapidamente chegamos à conclusão de que ela é profundamente diferente daquela que levou à constituição da escola (pública) de massas.

Assim, é pertinente colocarmos a pergunta: se tudo muda à nossa volta, por que motivo a escola pública continua assente em bases conceptuais com mais de duzentos anos de idade? Não será essa uma realidade muito irracional? Convenhamos que sim. Se o é, por que motivo não a mudamos? Será por uma questão de imobilismo, medo, insegurança, ausência de perspectiva ou desconhecimento?” 

Como só pergunta quem sabe a resposta, o amigo António a viria a dar, num belo livro: “Recriar a Escola Pública, Refundar o Sistema Educativo”. Dele vos falarei, em breve.

No abril de vinte e dois, voltei à casa dos meus bons amigos António e Elisa, para conspirar, para os ajudar a recriar a Escola Pública e a refundar o “Sistema”.

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCCCLIV)

Caldas da Rainha, 21 de abril de 2042

No abril de há vinte anos, voltei ao lugar onde, inspirada na obra do pregador Frei Contreiras, a Rainha D. Leonor fundou um “Hospital Termal”, com a finalidade de pôr em prática as obras de Misericórdia para com os mais carenciados. Em 1512, por “necessidade de acudir aos pobres e necessitados”, a Rainha, ordenou a redação do “compromisso do Hospital das Caldas”, que seria o modelo dos compromissos das futuras Misericórdias. E elas se espalharam pelo mundo.

Nesse lugar, onde, por várias vezes, o amigo João me levara, “acudimos aos necessitados da educação”. O João organizara um encontro com professores e membros da comunidade caldense. Juntos, criamos um embrião de núcleo de projeto, redefinindo o papel do professor no contexto de protótipos de comunidade de aprendizagem.

O “papel do professor” foi objeto de comentário do amigo Nóvoa, no seu comentário de uma obra de António Sérgio:

Sérgio advoga que se conceda um foral às nossas escolas, «de modo que a turbamalta estudantil, em vez de um rebanho estúrdio mal pastoreado pelo mestre, reitor, diretor ou vigilante, formasse um verdadeiro município, sob a assistência, o conselho e a cooperação discreta dos professores»

Sérgio critica a albarda da resignação fomentada pela escola e afirma a necessidade de uma formação cívica prática: «a educação cívica meramente teórica parece um ensino de esgrima em que se não empunhasse uma arma, ou uma aprendizagem de piano em que os dedos se não mexessem: é um absurdo»

Ao professor ficaria, assim, reservado um papel discreto, de alguém que incita os alunos a encarar a res publica com toda a gravidade: para isto é necessário – conclui – que a autoridade dos educandos se venha adicionar, porém não substituir, à de quem ensina”.

Coincidindo com o pressuposto cultivado na Ponte de que não se educa para a cidadania, mas na cidadania, no exercício de uma liberdade responsável, o Mestre Nóvoa acrescenta:

O município escolar é assumido como o laboratório da aula de instrução cívica. O princípio dos municípios escolares está presente em toda a Educação Cívica. Mas é neste terceiro capítulo que António Sérgio elabora a sua definição, insistindo nas noções de governo democrático, na feitura de leis pela cooperação entre os cidadãos, na responsabilidade de cada um pelos problemas da cidade-escola: «o professor ensinará pois os estudantes a governarem-se a si mesmos, criando leis justas e sensatas e sobretudo executando-as e fazendo-as executar”

É absurdo pensar que, neste sistema, o papel do professor se esbate, arrastando a vida escolar para um falso igualitarismo. As diferenças de estatuto estão bem-marcadas no ideário sergiano. Mas isso não o impede de sustentar, uma e outra vez, a necessidade de instaurar uma vida democrática nas escolas. 

E, voltando ao conceito de Self-government, Nóvoa conclui:

“Depois de Michel Foucault, é difícil falar do self-government com a mesma inocência do princípio do século XX. Um livro recente, da autoria de Jorge Ramos do Ó, analisa criticamente a ideia de governo de si mesmo, expondo a força de uma autoridade interior (invisível) quantas vezes bem mais totalitária do que a autoridade exterior (visível). A pedagogia não aspira apenas a formar um ser racional, mas também um ser razoável, responsável e sensível.” 

Decorridas quatro décadas sobre essa publicação do Mestre Nóvoa, a sua releitura me permitiu entender bem mais objetivamente o que, entretanto, aconteceu, na educação que se fazia no Brasil e em Portugal. 

Vos contarei, em pormenor, em próximas cartinhas. 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCCCLIII)

Santarém, 20 de abril de 2042

Na década de quarenta, o Ministério da Educação mandou construir escolas, com o propósito de “combater o analfabetismo”. Era comum presenciar situações como aquela que vedes na foto que envio com esta cartinha. Crianças cobertas de rotos andrajos, pés descalços, tremendo de frio, soletrando a lição, no “livro único” da Ditadura.

Nessa década, Portugal assemelhava-se a uma aldeia de milhões de miseráveis, analfabetos, num país em ruínas, assolado pela fome, semeado de sanatórios carregados de tuberculose.

Em meados da década seguinte, este vosso avô foi encerrado numa sala de aula, na companhia de outras crianças tão ou mais pobres do que ele, maltratadas por professores cruéis. Para se protegerem do frio, alguns dos meus colegas chegavam ensonados por efeito das “sopas de cavalo cansado”, um “energético” de outros tempos, regado com vinho tinto.

Essa situação observei, no decurso da década de sessenta. E a vivi, já como professor, em prédios de escola de chão de terra e até mesmo na… Escola da Ponte. Não era raro que alunos meus pousassem a cabecinha na carteira e adormecessem. Chegavam descalços e com um copito de aguardente a servir de primeira refeição do dia. “Para lhes abrir a inteligência”, diziam os seus pais.

Quem, nos idos de vinte, visitava o edifício-sede da EBI, no local para onde a Escola da Ponte tinha migrado por imposição ministerial, não imaginaria o que fora o local de início do projeto. Em 1976, não me surpreendi com o cenário em que iria “dar aula”. Era um prédio construído no século XIX e reinaugurado em 1919. As paredes de estuque esburacado combinavam com o caruncho de velhas carteiras e com o soalho de madeira esburacado. 

Custará acreditar e até haja que tente destruir a memória de tenebrosos tempos. Durante a manhã, eu amaciava a fome de muitas crianças com o queijo da Caritas, a que juntava uma caneca de “leite escolar”. Quarto de banho não havia apenas um buraco imundo, de onde saiam ratazanas, dentro de um cubículo de porta a cair dos gonzos. 

Foi aí que imaginámos outros lugares e modos de aprender. Como diria o O’Neill:

“Imaginar, primeiro, é ver. Imaginar é conhecer, portanto agir”.

Fui para a Ponte logo após a Revolução dos Cravos, que Salgueiro Maia e outros corajosos militares nos legaram

Vai para vinte anos, numa tarde excepcional, em que não viajei nem fiquei cativo do computador, tive oportunidade de assistir a um filme sobre a vida de Salgueiro Maia.

Quando, em 1973, se iniciaram as reuniões clandestinas do Movimento das Forças Armadas, Maia estava presente. No 25 de Abril do ano seguinte, comandou a coluna de blindados que montou cerco aos ministérios do Terreiro do Paço. No seu quartel e na madrugada desse dia, assim falou para os militares presentes: 

Meus senhores, como todos sabem, há diversas modalidades de Estado. Os estados socialistas, os estados capitalistas e o estado a que chegámos. Ora, nesta noite solene, vamos acabar com o estado a que chegámos! De maneira que, quem quiser vir comigo, vamos para Lisboa e acabamos com isto. Quem for voluntário, sai. Quem não quiser sair, fica aqui!”. 

Todos se lhe juntaram e seguiram para Lisboa, para acabar com uma ditadura de 48 anos. 

A sua coragem, posta à prova em outros momentos em que foi preciso defender a jovem democracia, granjeou-lhe muitos inimigos na classe política. Acabou sofrendo danos e perseguições. O Portugal de um Saramago exilado na Espanha e de outros gênios ausentes, assim tratava os seus heróis e sábios. A pesada herança do Estado Novo se fazia sentir sobre aqueles que rompiam com a mediocridade.

 

Por: José Pacheco

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