Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCCXXXII)

Engenho do Mato, 12 de dezembro de 2041

Nunca será demais falar da Ponte, do que ela representou e quantos educadores inspirou.

No início deste século, a minha amiga Cláudia nela fizera a sua pesquisa de doutorado. Nos idos de vinte, dava à estampa um belo livro, em que sintetizava a sua tese. Partilho alguns excertos dessa obra. Sem os comentar.

“A solidariedade, no projeto de escola de todos, não é peça de retórica e tampouco a incorporação de um jargão esvaziado da vivência na prática. Integra um quadro de valores convergente à ética universal do ser humano defendida por Freire, que enfatiza:

“Mas, é preciso deixar claro que a ética de que falo não é a ética menor, restrita, do mercado, que se curva obediente aos interesses do lucro.”

A solidariedade, vivenciada na escola, no sentido que estamos a falar, expressa a comunhão de atitudes de cada um com o outro e com todos, formando uma unidade que favorece às aprendizagens, às situações de formação, de gestão coletiva, de diálogo e resistência às pressões externas.

Ao delegarem a palavra às crianças, enquanto instrumento para a participação, os educadores abdicam de uma posição histórica, que lhes conferia total soberania no ato educativo, mas a confiança que depositam nas crianças parece ser proporcional à responsabilidade com que assumem a formação cidadã das mesmas.

Há de se reconhecer um paradigma de racionalidade coerente com a teoria viygotskyana, que defende a figura do mediador social, alguém mais experiente que age, por meio da linguagem, colocando-se como facilitador da relação sujeito-objeto de estudo.

Um estudo de Macedo, pesquisador brasileiro, contribui de maneira significativa para a discussão em torno dos “fundamentos para uma educação inclusiva”, considerando que, para defendermos uma escola de todos, se requer pensar na lógica da inclusão, que transcende as semelhanças, para acolher as diferenças que singularizam cada ser humano. Partindo deste prisma, o conceito de inclusão toma uma abrangência para além do que se costuma verificar no léxico dos estudos sobre a educação de crianças com algum tipo de limitação, seja física ou orgânica.    

A escola que inclui, ou a escola de todos, é aquela instituição organizada, pedagogicamente, para a promoção da educação da maioria excluída, cerca de setenta por cento da população, formada, não somente pelos “portadores de alguma deficiência, mas também os pobres, analfabetos, famintos, os que não têm onde morar, os doentes sem atendimento (…) no acesso às boas condições de aprendizagem (…) e que podem receber uma educação em sua versão comum, não especial ou excepcional”

É observado um reforço por parte dos educadores, desde o trabalho com o grupo da faixa etária entre seis e sete anos, estimulando e encorajando as crianças a relatarem situações do cotidiano, a perguntar quando não entendem, a querer saber o significado de vocábulos ouvidos e não compreendidos, a colocarem-se sobre os assuntos tratados. Igualmente, o exercício à generosidade e ao respeito de ouvir o que o outro tem a dizer, é vital na cultura da Ponte.

O papel do educador não é minimizado, porém, assume uma outra configuração: ele é complementar, visto que, no contexto da relação educativa, os estudantes tanto apreendem, quanto ensinam. Aliás, nos seus estudos psicopedagógicos, Fernández reforça a importância da interação, para que ocorra aprendizagem, o que não acontece em meio à passividade, mas num ato dinâmico, que requer daquele que apreende assumir, por vezes, o lugar de ensinante para que se consolidem as aprendizagens.

Por: José Pacheco

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