Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCCLXXXI)

São Bento do Sul, 2 de fevereiro de 2042

Nos idos de vinte, António Nóvoa, insistia em falar “Da Pedagogia e dos Pedagogos:”:

O pedagogo existe na zona de encontro entre a prática e a teoria. A sua palavra não lhe vem apenas da experiência, mas é nela que encontra o seu sentido. O seu pensamento não é uma mera especulação teórica, mas antes um esforço para refletir sobre a ação educativa. A escrita pedagógica define-se neste entre-dois e alimenta-se da procura de um “terceiro lugar” para falar das coisas educativas.
Só há ensino, quando as crianças aprendem. Ser pedagogo é acreditar na possibilidade de educar todas as crianças, sem nunca esquecer que só há ensino, quando alguém aprende. Ser pedagogo é não se contentar com a obrigatoriedade da instrução e tudo fazer para que haja aprendizagem. Ser pedagogo é valorizar a cultura, uma cultura que se inscreve numa pessoa, contribuindo assim para a sua formação.

Contrariamente a uma opinião corrente, os pedagogos são os maiores defensores da cultura, porque são eles que a promovem diariamente junto das gerações mais novas. A missão essencial do educador é apresentar o mundo aos que chegam: é deles a primeira palavra. Mas o processo formativo tem como finalidade permitir a cada um “dizer-se pessoa”: a última palavra pertence aos educandos.

A pedagogia como exercício de intervenção cívica. Os percursos pedagógicos definem-se pela insatisfação face ao estado da escola e pela busca de novos caminhos. Quando os outros desistem, os pedagogos continuam teimosamente a querer formar todos os alunos, evitando a exclusão e o “apartheid”. Quando os outros se resignam, os pedagogos associam-se coletivamente para, na partilha de experiências, encontrarem as respostas úteis e necessárias.

Uma atenção permanente à formação de professores. Quando se estudam os textos pedagógicos, desde meados do século XIX, deparamo-nos com uma atenção permanente às questões da formação de professores. Não há pedagogo que, num ou noutro momento da sua vida, não tenha participado na organização ou na dinamização de programas de formação inicial ou contínua de professores. Eles sabem, melhor do que ninguém, que o esforço de educar, enquanto esforço de cultura e de relação humana, depende acima de tudo da competência e do talento dos mestres”.

Os discursos do amigo Nóvoa eram música para os ouvidos. Nóvoa era hábil no uso da palavra, da palavra-substância, coerente com o que de valioso o discurso das ciências da educação aportava. Repetiria esse discurso ao longo de décadas de congressos e formações. Muitos o ouviam. Raros eram os que o escutavam. 

Como explicar a falta de “pedagogos” e de “antropogogos”? Cadê o “esforço para refletir sobre a ação educativa”, se a “especulação teórica” permanecia apanágio de universitários ociosos?

Cadê as evidências de que se acreditava na possibilidade de educar todas as crianças? Nos idos de vinte, a ensinagem não gerava aprendizagem, mesmo que o índice de decoreba da educação chegasse a ser dez. E a pedagogia (praticada!) não era exercício de intervenção cívica – a última palavra não pertencia aos educandos. 

Mas, em algo o amigo Nóvoa tinha razão. Nesse tempo, havia quem manifestasse insatisfação face ao estado da escola, havia quem buscasse novos caminhos. Quando a maioria desistia de agir, educadores teimosos ajudavam a evitar a exclusão, não se resignavam, agiam.

Encontrei-os em São Bento do Sul, decorria o mês de fevereiro do já distante dois mil e vinte e dois. Com eles partilhei experiências. Com eles reaprendi a encontrar respostas úteis e necessárias.

 

Por: José Pacheco

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