Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCCCXXV)

Figueira de Castelo Rodrigo, 21 de março de 2042

No Brasil, chegara o Outono. Em Portugal, a Primavera. O Inverno de 2022 fora atípico e se sabia que “fevereiro quente trazia o diabo no ventre”. Temia-se que a geada pudesse gelar flores promissoras de bons frutos. 

Celebrei o equinócio primaveril em Figueira de Castelo Rodrigo e em boa companhia. A Maria, o Daniel, a Rita, a Célia, a Inês e a Inês me receberam como os beirões sabiam receber. Anfitriões afáveis, um vinho de excelente qualidade, gente envolvida em projetos sociais… que mais poderia eu querer? 

Queridos netos, já sei o que estareis a pensar que irei falar-vos de gula e bem-estar. Talvez volte a fazê-lo, quando convosco voltar a conversar sobre Castelo Rodrigo e as minhas anfitriãs. Falar-vos-ei da generosidade beirã e do inestimável labor do amigo José, que resistia ao desgaste do despovoamento e da progressiva desertificação do interior português.

Por essa altura, chegou-me às mãos – melhor dizendo, à tela do computador – o repensar do “sistema”. Não tinha indicação de autor. Suspeitava que fosse da autoria do Meirieu. O textinho não aportava novidade e já se passaram vinte anos sobre a sua publicação. Se já nem o WhatsApp existe, ouso transcrever excertos “adaptados”. 

“Com o termo do ano escolar chega a época de exames. Os jornalistas e os intelectuais não deixam de dar os seus famosos conselhos quanto à forma de se preparar para o grande dia. De passagem, ter-se-á afastado os quarenta por cento de alunos dos liceus profissionais que, infelizmente, parecem negados na sua própria existência”

Diga-se, em abono da verdade, que os liceus tinham sido extintos, há décadas. Mas, em 2022, ainda havia professores que colocavam no Facebook, como local de trabalho o… “Liceu Nacional”. Continuemos…

“Quem dirá o mal que engendra ignorância? Quem gritará suficientemente alto, para denunciar a impostura de uma sociedade que não cessa de pregar a revalorização dos percursos profissionalizantes e, ao mesmo tempo, os instala em bairros mais problemáticos e envia para lá os alunos com mais dificuldades, os priva das disciplinas artísticas, deixa que alguns acedam ao ensino superior sabendo perfeitamente que essa impostura se desembaraçará desses alunos em poucos meses?” 

Alguém das ciências da educação e por isso, autorizado comentava a realização de exames, que mais não eram do que instrumentos de darwinismo social. Nos idos de vinte, ainda havia testes, provas, exames, apesar de a Finlândia já os ter banido, quase por completo, na década anterior. 

Ignora-se o custo social, a médio e a longo prazo, de um sistema que erige desta forma o desprezo em regra de funcionamento. Mas, para lá destes fenómenos tristes, temos também de nos interrogar quanto à concepção do exame que progressivamente se foi impondo.

O que ocupa e monopoliza a energia da maioria dos nossos estudantes do ensino secundário é uma coisa completamente diferente. O exame é reduzido a uma operação comercial, a um empinanço de alguns meses ou de algumas semanas onde, com a ajuda de uma literatura para-escolar, que invade as prateleiras das nossas livrarias,, se organiza um simples “reenvio ao remetente” de conhecimentos rapidamente memorizados e rapidamente esquecidos.

Esta “pedagogia bancária”, como dizia o pedagogo brasileiro Paulo Freire, é a própria negação da inteligência. Reduz o sistema escolar a uma máquina.

 

Por: José Pacheco

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