Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (CMXLIII)

Freixo do Meio, 23 de julho de 2042

Estávamos no ano em que celebraríamos o centenário do Darcy. E eu invocava Anísio, outro dos injustiçados da educação brasileira, juntamente com Agostinho, o português mais brasileiro de quantos para o Brasil emigraram.

Esse trio fantástico se reencontrou na Universidade de Brasília, quando o Distrito Federal começava a tomar forma. Aí, fundaram um protótipo de uma nova universidade, que a Ditadura viria a desmantelar. Anísio viria a ser atraído a uma cilada e assassinado. O sonho de uma nova cultura académica o tempo a consumiu.

Agostinho viria a escrever quase um “epitáfio” da universidade sonhada por Anísio e Darcy:

“O grande drama da Universidade brasileira, hoje, é que estamos tentando implantar no Brasil estruturas que são efetivamente de outras economias, de outros estágios educacionais e que de maneira nenhuma podemos adaptar ao Brasil”.

E, nos idos de sessenta, estas considerações teceu: 

“Podemos dizer que a Universidade atual, que vem da Universidade medieval, é uma Universidade que se alicerça sobre a idéia de fraternidade, sobre uma idéia, digamos, de caridade, sobre uma idéia de esforço comum para atingir uma verdade que não é já uma verdade puramente intelectual, mas uma verdade também de sentimentos, uma verdade de unidade entre os homens”.

O Paulo Borges comentaria o sonho agostiniano da “mais perfeita das Universidades”:

“Agostinho da Silva vislumbrava os tempos em que nela sejam formadas “novas gerações de cientistas com a noção de história da cultura, dos limites da atividade científica e de sua real grandeza” e os homens de cultura literária ou histórica com a idéia do que seja a ciência, sua axiomática e seu progresso e convencidos de que filosofia é fundamentalmente uma reflexão sobre a ciência”.

A missão específica que Agostinho da Silva atribuía à Universidade de Brasília era a de “integrar a cultura nacional”, a de preparar os quadros para o ensino superior no país, aliada à missão de assessoramento do governo, e a de produzir o pensamento, fazendo valer a sua opinhão “sobre os problemas com que o Brasil se defronta”. 

Os princípios, as bases deveriam ser, portanto, universais, mas a estrutura deveria corresponder ao particular histórico, econômico e cultural do Brasil, o que já não acontecia. Nos idos de vinte, apenas o meu amigo Isaac e outros notáveis educadores tentavam recuperar o espírito Anisiano, enfrentando a indiferença da sociedade e umo obsceno silêncio dos emudecidos pelo medo. Em tempo de crise moral, Anísio morria pela segunda vez, pois matavam a sua memória.

Assumindo as contradições da época em que viveu, Anísio defendia a aplicação do conhecimento científico na educação. Considerava ser a pedagogia uma arte, algo mais complexo do que uma ciência, crente de que a educação poderia atingir o nível das belas-artes. 

Criticava a “aplicação precipitada ao processo educativo de experiências científicas, que poderiam ter sido psicológicas, ou sociológicas, mas não eram educacionais, nem haviam sido devidamente transformadas ou elaboradas para a aplicação educacional”

Não imaginaria como o Brasil viria a sofrer com a invasão maciça de modismos e o transplante de produtos de ciência de laboratório para o chão das escolas, mantendo-se intocável o essencial do modelo instrucionista. O aluno era tratado como algo abstrato, “manipulado por critérios de classificação em grupos supostamente homogêneos, dando ao professor a falsa esperança de poder ensinar por meio de receitas, muitas das quais de científicas só tinham a etiqueta”. 

 

Por: José Pacheco

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