Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MXXXI)

Itaipuaçu, 21 de outubro de 2042

Quando nascestes, para vós escrevi dois livros com cartinhas de um “avô coruja”. A última das cartas para a Alice, enviada no 15 de setembro de 2001, começava assim: “Algures, em 15 de Setembro de 2007”.

“Querida Alice, Aqui estou, a entregar-te este montinho de cartas. Quando a decifração dos códigos da linguagem dos homens to permitir, hás-de lê-las. São tantas quantos os dias que mediaram o dia de completares seis anos e o dia de ires à escola.

Esta é a última das cartas, que não o fim da estória. Este é o dia da tua primeira ida à escola, o início de uma outra história. E ambas terão os desfechos que lhes quiseres dar. Basta que não nos confinemos aos estreitos limites do entendimento das coisas e dos seres deste nosso tempo da proto-história dos homens.”

Nos conturbados tempos dos idos de vinte, o da proto-história da humanidade, a mentira imperava e os gestos fraternos eram escassos. A solidão era, muitas vezes, o destino de pássaros a quem calhou por sina o conhecimento e a bondade.

Um pássaro chamado Tomás de Aquino escreveu que o dom da inteligência está associado ao dom das lágrimas. Porém, o sal do pranto vertido não corroera o sagrado destino das gaivotas das cartinhas da Alice. É sempre útil recordar que, quando as gaivotas da estória decidiram abalar dos rochedos junto ao mar, indo à aventura terra adentro, até desaguarem do seu longo peregrinar numa terra entre dois rios, nada conseguiriam se as gaivotas de outras margens se recusassem a partilhar a construção e a coabitação de ninhos onde jovens aprendizes de voar aprendessem o voar mais longe.

Foi na observação atenta do guacho edificando ninhos que as gaivotas se iniciaram numa sabedoria que não se adquire na contemplação de reflexos num espelho.”

No hemisfério sul dos idos de vinte e dois, quando a Primavera aportou rituais de sedução e uma azáfama de acasalamento nas copas das árvores, mercê de insondáveis e latentes desígnios, sucederam-se cópulas para perenidade das espécies, sem que o instinto se sobrepusesse ao cotio da liberdade.

E o Verão chegou com prommessa de bons frutos. Presencialmente e à distância, criávamos condições de continuidade.  Acompanhávamos protótipos de comunidades de aprendizagem, avaliados tendo por referência uma política de direitos humanos. No Outono, providenciamos a sustentabilidade de uma rede de projetos, que se transformava, multiplicava, consolidava. Após im Inverno do nosso descontentamento, a Terra do Brincar e outras comunidades emergentes se abriram à visita de educadores de verdade.

Como estratégia de mudança, recorríamos a metáforas, como as que Kotter criou e o José Alves me encaminhou:

“Vou precisar da tua ajuda” – disse ela a Fred. – “Preciso que estejas preparado para ajudar os outros a verem e sentirem o problema.”

Após uma breve pausa, acrescentou:

“E prepara-te para que algumas das aves não queiram ver qualquer problema. Temos de convocar imediatamente uma assembleia geral da colónia e convencer tantos pinguins quanto possível de que existe um grande problema. Temos de reunir muitos amigos e familiares e sensibilizá-los para esta questão! Só assim podemos encontrar soluções aceites pela maioria.”

Estavam a ficar, obviamente, desesperados. Foi então que um membro mais velho e altamente respeitado da colónia sugeriu que se tentasse algo de novo.

“Talvez devessem fazer o que o Fred fez quando descobriu o nosso terrível problema. Andar por aí, de olhos e mentes abertos. Ser curioso.”

E o Pinguim Chefe, reconhecendo a necessidade de uma abordagem diferente, concordou.”

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