Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MLXIV)

Mendes, 24 de novembro de 2042

No Município de Mendes e no novembro de há 59 anos, sob a égide de Darcy, realizou-se um amplo debate sobre os problemas que a educação encontrava, no final da ditadura. A Folha Dirigida disso dava notícia com título “A dívida com a escola pública”. Desse encontro saíram “possibilidades de mudança” jamais concretizadas. Darcy regressava a Mendes, 39 anos depois, na pessoa de professores éticos e pela iniciativa de uma secretaria de educação exemplar.

Por essa altura, a Carolina atravessou o mar, para visitar a Escola da Ponte. Enviou-me um texto com as suas impressões de visita: 

“O que vivi na Escola da Ponte foi surreal. Estudantes – de 5 a 14 anos – que me contaram sobre todo o funcionamento da escola; como são os trabalhos, a metodologia, os desafios, as muitas dificuldades que existem, especialmente a rotatividade dos professores, já que se trata de uma escola pública, que é a única no mundo a ter contrato de autonomia pedagógica. 

Fiquei impressionada, boquiaberta. Não há nenhum luxo e nem uma superestrutura física; a riqueza é o nível de fluência e raciocínio que as crianças, todas elas, conseguiram ter, ao me explicarem o que importa na escola, o que eles precisam fazer para melhorar a quadra e tantos outros problemas da pequena cidade! 

Saí de lá com os desenhos deles e com a alma leve. Feliz, pois o que eu acredito e sonho, vi concretizado em um espaço que o professor Pacheco disse que precisa evoluir ainda muito e rapidamente!”

Recordar-vos-eis, certamente, de vos ter falado das três crises de que fui acometido, no exercício da profissão de professor. A primeira, de natureza moral, eclodiu quando eu compreendi que sabia muito de eletrotecnia, mas não sabia ser professor. Eu dava aula. E havia alunos que não aprendiam. 

A segunda das crises, sendo de natureza ética, libertou-me da prisão da sala de aula e me impeliu ao trabalho em equipe. Mas, decorrido meio século, na maioria das escolas o magistercentrismo se mantinha. Apesar de os teóricos afirmarem o primado do pedocentrismo.

A Ponte terá sido a primeira escola a romper com o instrucionismo. E isso lhe valeu dissabores e desvios de rota. Chegados ao século XXI, a Ponte e transformara num objeto de turismo educacional. 

A Ponte continuava sendo uma excelente escola. Mas, a intuição da Carolina permitiu-lhe compreender que a Ponte “estacionara” em práticas do paradigma da aprendizagem E observou que alguns dos novos professores até manifestavam procedimentos, que a Ponte abandonara nos idos de setenta. Parecia que a inovação começava a matar a inovação.

Nos idos de vinte, na margem sul do Atlântico, um novo Governo tomava forma. Discutia-se o novo Ensino Médio, propunha-se lenitivos para a recuperação de aprendizagens, reinventava-se a roda da educação. Não se cuidava de conceber uma alternativa à Escola da Modernidade, que tanta violência já causara. 

As boas intenções anunciadas era trocadas pelo pagamento de favores eleitoralistas. Uma administração autoritária apoiava manifestações anti-democráticas, enquanto neutralizava focos de autonomia. Um sistema hierárquico mantinha a Família alheada da Escola, a Escola isolada da Sociedade e o Ensino Superior separado do “Inferior”.

A cupidez das empresas do ramo educacional e as agências de financiamento contribuíam para a mercantilização da Escola Pública. A perversão dos áulicos (que Darcy denunciou) introduzia paliativos num obsoleto modelo educacional, tentando curar uma escola doente com pensos rápidos made in Sobral e remédios milagrosos made in Finlândia. 

Que fazer?

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