Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MLXV)

Mendes, 25 de novembro de 2042

Eis-me, de novo, em Mendes, quando já são passados vinte anos sobre o dia em que se comemorou o trigésimo nono aniversário de um encontro histórico. Aqui acorreram educadores românticos, para celebrar a darciniana utopia. Aqui se reuniram educadores conspiradores, para praticar Darcy. 

Nas duas décadas, que se seguiram, Mendes partiu de um tempo distópico para o anúncio e consolidação da utopia sonhada por Darcy. A primorosa equipe da secretaria de educação preparou com esmero um encontro, que levou até às margens do “Caminho Novo do Tinguá” o Mauro, a Valéria, a Tina e outros educadores, que, não só debateram problemas, como apresentaram possibilidades de mudança. 

A vinte anos de distância, talvez seja oportuno retomar velhas querelas e conflitos, no propósito de prevenir regressões em que a política educacional era fértil no tempo do “Encontro de Mendes”. No final da ditadura, viva-se um tempo de agitação e de esperança, mas a realidade era calamitosa. A Escola Pública fora “sucateada”, eram elevados os índices de evasão de alunos e de reprovação, num país que exilara uma geração de ouro de pedagogos, pioneiros do escolanovismo, cujo legado poderia infletir a crítica situação. 

No “Encontro de Mendes”, organizado pela Rosiska e pelo Darcy, visava-se concretizar diretrizes educacionais, num processo amplamente participado. Mais de cinquenta mil professores da Rede Pública debateram nas suas escolas problemas com que deparavam. E, nos dias 25 e 26 de 1983, delegados eleitos, representando todas as regiões do estado, analisaram milhares de cartas enviadas pelos seus colegas professores.

Concluiu-se que a “escola pública” se desenvolvera alheia a realidade locais, que as séries iniciais eram “grandes peneiras de alunos”, e que se “culpabilizava” os estudantes, as suas famílias e os professores pelo insucesso dos jovens. O fracasso escolar era atribuído a causas de natureza sócio-económica, ou sócio-emocional – ou os alunos não tinham livros em casa, ou os seus pais eram analfabetos. 

“A ilusão principal de nossa escola é a ideia de que ela seleciona e promove os melhores alunos, através de procedimentos pedagógicos objetivos. De fato, ela apenas peneira e separa o que recebe da sociedade já devidamente diferenciado. Ao tratar da mesma maneira crianças socialmente desiguais, a escola privilegia o aluno já privilegiado e discrimina crianças que renderiam muito mais se fossem tratadas a partir das suas próprias características”. Darcy tentava provar que o aluno pobre não não aprendia porque a escola não lhe dava condições de superar dificuldades – “Nossa escola atribui o fracasso das crianças pobres a deficiência que elas trazem de casa”. 

Os administradores do “sistema” não conseguiam entender que significativa quota parte da responsabilidade do fracasso se poderia atribuir à imposição às escolas de um modelo educacional hegemônico de cariz instrucionista. O insucesso dos alunos era, sobretudo, de origem sócio-institucional – o insucesso dos alunos era o insucesso da escola. E Darcy recusava a ideia de ser o professor o culpado pelo descalabro da educação, quando afirmava: 

“Nada há de mais simples, nem de mais econômico, nem de mais eficaz e acessível do que a educação com um bom professor devidamente capacitado e motivado”. 

Os novos e democráticos tempos dos idos de oitenta propiciavam oportunidades de os professores se erguerem da menoridade pedagógica a que os tinham condenado e de recuperar a autoestima perdida. 

E o que aconteceu nas décadas seguintes?

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