Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCXLVII)

Tanguá, 15 de fevereiro de 2043

Netos queridos, dias atrás, atribuí a um projeto um nome fictício – “Praticar Darcy” – e pretendo mantê-lo. Mesmo decorridos vinte anos, importa manter alguma confidencialidade, dado nele terem participado pessoas que (felizmente!) ainda estão vivas. 

Na minha vida de trabalhador da educação, convivi com a solidariedade de gente nobre e suportei a malignidade de canalhas. Nesse projeto, com ambos aprendi. Nobres educadores ajudaram a concebê-lo e a preservá-lo das investidas da maledicência e da intriga. E ele se converteu em referência dos milhares de projetos que, entretanto (e cada qual a seu modo), empreenderam caminhos de mudança.

Procurei saber o que motivava aqueles nobres educadores. Numa das escolas onde reaprendi a arte do companheirismo, isto escutei:

“Os meus filhos foram excluídos. Diziam que eles “não acompanhavam a aula”. Eles sofriam muito. Troquei-os de escola. mas eles continuavam sem saber ler. Durante as férias ensinei-os. No google, fiz com eles um “livrão” de salvar animais.” 

“Tive um filho que reprovou três vezes. Ele era muito curioso, mas os professores acostumaram-se a dar respostas sem ouvir perguntas. Um dia, perguntei o que ele queria ser e ele me disse “eu quero ser astrónomo”. Passou a aprender e com ele aprendi a pesquisar.”

“Eu odiava estar na escola, nunca me adaptei. Uma amiga me disse que havia vaga numa escola montessoriana. Me salvei. Voltar para o tradicional nunca mais!” 

“Amo alfabetizar sobretudo alunos com problemas, porque me sentia indignada. Eles estavam abandonados. Estive “readaptada”, mas decidi voltar, porque este projeto é mesmo de inovação. Quando fizemos combinados com os alunos, não dividimos as turmas e um aluno disse “Graças a Deus! Estamos praticando respeito.” 

“Num ônibus, escutei: “O meu filho é como eu. Não serve para a escola. A escola também não era para mim”. Mas eu sei que a escola que produz fracasso também pode produzir potência.”

“Nunca me encaixei. O poder público propõe pedagogia diferenciada, mas continua a fazer o antigo. Transgredimos. Não voltaremos para a sala de aula.” 

“Funcionários perguntavam: “Estas crianças não vão estudar? Quando vão ter lição?” não compreendiam que aprendemos em comunidade.”

Eu saía das escolas emocionado, feliz, disposto a ultrapassar armadilhas montadas pelos “porquenãos”. Deles vos falei nas cartas para a Alice. Mas, era uma praga atrás da outra… 

Piaget dizia que a educação era a única área das ciências humanas em que todo o mundo se considerava especialista e dava opinião. E Darcy diria que a educação não era para amadores. Mas, os destinos da educação estavam nas mãos de amadores (não no sentido de amar, mas de ignorar) e o autoritarismo juntava-se ao diletantismo, para complicar o desenvolvimento dos projetos.

O amigo Zé Morgado assim caracterizou os “tudólogos”:

“Os tudólogos pensam que sabem tudo de tudo. É vê-los a emitir os seus achismos por todo o lado onde apareça um microfone, ou uma página de jornal ou revista. Eles “acham”, sobre não importa o quê. Por vezes, aparecem acompanhados por pessoas conhecedoras das áreas em discussão, de quem, arrogantemente, exigem a caução da sua óbvia ignorância mascarada de “opinião esclarecida”.

Uma comunicação social mal preparada deleitando-se com a exibição despudorada de um umbigo tão grande quanto a ignorância, subscreve e amplia as maiores banalidades ou disparates que, diletantemente, os tudólogos emitem.” 

Encontrei tudólogos que alegavam “divergências”, para complicar processos. Deles vos falarei, amanhã.

 

Por: José Pacheco

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