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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCLXXXI)

Santo Aleixo, 30 de junho de 2043

Netos queridos, como já vos disse, quando decidi trocar a engenharia pela educação, eu sabia de eletrotecnia, mas não sabia que não sabia ser professor. Eu sabia dar aula (embora não soubesse por que durava 50 minutos9. Impunha (porque me impunham) o ritmo do trimestre, e do ano letivo. Aplicava testes, dava “positivas e negativas”. Classificava, sabia aprovar e reprovar. Não sabia que não sabia avaliar. 

Eu sabia dar aula, à semelhança do titular de um qualquer curso, que enveredava pela profissão de professor. E dava aula da melhor maneira possível, guiado pela intuição pedagógica e pelo “quanto baste” de vingativas intenções.

Sim, vingativas. Não sei se já vos disse o porquê dessa opção. 

Se não vos disse, aqui vai. Salvo “in extremis” de morrer antes dos trinta (um dia destes, vos contarei essa estória), quando me perguntavam por que quis ser professor, eu respondia que, quando decidimos ser professor, o fazemos por amor ou por vingança. Fui por vingança, para vingar a sorte daqueles que não saíram da Ilha dos Tigres, que sofreram miseráveis padecimentos e morreram sem que florescessem os seus talentos.

Certo é que não conseguia vingar-me. Eu dava aula bem dada, mas havia, sempre, alunos que não aprendiam. Mais tarde, compreendi que, se eu dava aula e eles não aprendiam, eles não aprendiam porque eu dava aula. Pois é! Mas eu só sabia dar aula. E adiava a “vingança”.

Pensei em abandonar a profissão, em voltar para a engenharia. Não poderia continuar dando aula, sabendo que não conseguiria assegurar a todos o direito à educação. Tomei consciência de que, dando aula, incorria na prática de “abandono intelectual”. Eu sei que é duro afirmá-lo. E longe de mim responsabilizar os meus colegas professores por esse indício de delituosa prática. A culpa morreria solteira…

O resto já o sabeis. Assumi um compromisso ético, me integrei em movimentos de renovação pedagógica. Operamos coerentes transições paradigmáticas, até que atinamos com algo impensável, até então. Operar ruturas (e até duplas ruturas) de nada servia. Necessário se mostrava, juntar aquilo que cada paradigma propunha, para integrar a pedagogia com a antropagogia – Religar!

A inovação tomava o lugar dos paliativos de um velho modelo educacional e a ética se libertava de discursos bem-intencionados, fertilizando novas práticas. Compreendemos que de nada valia tentar melhorar o sistema de ensino. E, já em pleno século XXI, partimos da sala de aula, para conceber um sistema de aprendizagem – os círculos e as comunidades de aprendizagem. 

Revisitamos o que, nos anos oitenta, nos levara a repensar o sistema de ensinagem, aconteceu um reencontro com a obra de Agostinho da Silva. 

No final do encontro de Montemor, um evento que se transformou num divisor de águas, uma jovem professora de oitenta anos de idade me interpelou:

“Quando você disse “Quando eu era professor”, eu vi Agostinho no palco, junto convosco. Até fiz uma anotação no meu caderninho de memórias. Era isso o que Agostinho dizia perto do final da sua vida. E tinha mesmo sido professor. Sabe porquê?”

Eu sabia. E a Julieta vira Agostinho no palco. Ele estava ali, entre nós, dizendo:

“Acho que o ideal é que ele [o ser humano] vá pensando, vá construindo o seu próprio sistema e, se um dia puder chegar a não construir sistema nenhum, ainda melhor. Porque os sistemas prendem gente”

Até amanhã, netos queridos! Ficai com a poesia de um sábio humilde:

“Lembrei-me agora de um título

Que, pois raro, o céu me assuma

Ser também honoris causa

De coisa alguma”

(Agostinho da Silva, Quadras Inéditas)

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCLXXX)

Torre da Gadanha, 29 de junho de 2043

Precisamente, há vinte anos, se fechou um ciclo de vida caraterizado pela adesão a múltiplas tentativas de reforma, desde finais da década de sessenta. Abortada a do ministro Veiga Simão, com a abertura democrática e animado pelo “espírito de abril”, em 75, fui coordenador de uma equipe de “animação pedagógica”. 

No ano seguinte (se não me falha a memória) ajudei a compor o “Programa de Capa Laranja”, o primeiro dos currículos, pós-revolução. E aceitei participar como formador na chamada “Coordenação Pedagógica. Sempre com o mesmo espírito de serviço, fiz parte da equipe que concebeu o “Programa de Capa Verde”. 

Em 1977, formador para os “Novos Programas”, ajudei escolas a elaborar os seus “projetos pedagógicos”. Constatei que os currículos eram conhecidos apenas pela cor das capas. Os professores não os tinham lido e copiavam “projetos” de outras escolas, para os apresentar aos inspetores como se fossem seus. 

Nesse faz-de-conta, como em muitos outros simulacros de reforma, se hipotecou a dignificação do profissional desenvolvimento humano, se perdeu mais uma oportunidade de elevar o estatuto social da profissão de professor.

Em 1978, era publicado o primeiro número do “Projeto”, boletim do recém-criado Centro de Documentação Pedagógica. Eram muitas as notas de leitura e os boletins seguintes davam notícia de encontros de tertúlias literárias. Apoiamos centenas de outros projetos e concebemos a “Associação PROF”, que, em 1992, criaria o primeiro centro de formação contínua.

Em 1987, foi eleito coordenador concelhio do Programa Interministerial de Promoção do Sucesso Educativo (PIPSE), que visava reforçar a ação e os meios educativos em zonas prioritárias de intervenção caracterizadas por índices muito elevados de insucesso. 

As ações prioritárias incidiram sobre: o reforço dos cuidados de alimentação, a prestação dos cuidados de saúde, prevenção e diagnóstico, o alargamento da cobertura em educação pré-escolar, o fortalecimento da educação especial, o apoio a famílias carenciadas, o apoio pedagógico, a Iniciação profissional, entre outras. 

Em 1991, o programa foi extinto. E, em 2020, um edital do Programa Nacional de Promoção do Sucesso Escolar (PNPSE) repetia intenções plasmadas no PIPSE de 1987, num sofisticado discurso, que não disfarçava a pobreza da prática. Trinta anos depois do PIPSE, o ministério da educação apenas mudara uma letra: o I era substituído por um N. 

Sem abandonar a equipe da Ponte, jamais saindo do chão da escola, participei em todos os projetos reformadores, voluntária, gratuita e… entusiasticamente.

Em mais de três décadas, muitas réplicas de antigos programas e projetos tinham sido lançadas, todas com efeito nulo. Por exemplo, na década de noventa, o projeto de “Gestão Flexível do Currículo”. Acompanhei todo o processo e li o relatório que, com esmero, o Vítor fez. O relatório de avaliação apontava para a necessidade de rever o modelo de ensinagem. 

Nessa altura, eu era membro do Conselho Nacional de Educação. E fui autor de um Parecer sobre uma proposta de lei de “Reorganização Curricular”. Nele evidenciei a necessidade de rever o “modelo de ensinagem”. Já então, era urgente conceber um modelo alternativo ao que herdáramos da Prússia Militar. 

Vinte anos depois, o ministério lançou o projeto “Autonomia e Flexibilização Curricular”. O relatório de avaliação desse projeto era semelhante a uma réplica do relatório dos anos noventa. Apenas acrescentava um absurdo a que chamaram “inovação”: passar de trimestre para semestre.

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCLXXIX)

São Cristóvão, 28 de junho de 2043

Na véspera do 27 de junho de há vinte anos, a Caetana me ligou, dizendo ter descoberto um professor que ainda não tinha morrido. Na manhã seguinte, bem cedo, que a tarde seria de mais de 40 graus, com a Cristina, a Maria e o Leandro, abalei para São Cristóvão, ao encontro do Nuno e dos seus jovens alunos. 

O Nuno explicou a opção por aquele lugar. E, se a Lei de Bases propunha que o professor residisse na comunidade onde exercesse o seu múnus profissional, o Nuno estava a pensar ficar por lá. Tinha passado por escolas-presídios, na região de Lisboa, e até tinha pensado em desistir de continuar professor. Felizmente, ainda estava vivo.

Apresentou-nos os seus alunos, um a um. O Rafael, um exímio domador de cavalos. O André, um promissor rapper. A Alice, de quem diziam ser mentirosa, mas que apenas era imaginativa. Nas paredes, pinturas feitas pelas crianças. No ambiente, a proverbial amorosidade alentejana.

Os “finalistas” do quarto ano só falavam de despedidas. No ano seguinte, deveriam viajar, diariamente, quarenta quilómetros para ir fazer o quinto ano na sede do município.

“Porquê?” – perguntei – “Por que terão de ir para a sede do município? O que irão aprender por lá que não possam aprender aqui?”

“Nada” – foi a resposta.

“Então…?”

A aldeia dispunha de uma seleta equipe de formadores: a Dona Joaquina, que sabia usar ervas medicinais, e outros “especialistas em saberes locais”, habitantes habilitados com tecnologias sociais ajustadas ao meio, professores aposentados, que desejavam continuar a ensinar… Até o Leandro, professor de música, colocou a hipótese de ir para lá morar.

Então, por que carga de água as crianças seriam forçadas a viajar?

“Aqui, é só até ao quarto ano. Já foi até ao sexto. Mas, agora, só podem ficar até ao quarto. No próximo ano letivo, terão de ir para Montemor.”

“Quarto ano”, “quinto ano”, “sexto ano”, a costumeira segmentação cartesiana. Sendo a escolaridade organizada em “ciclo”, de ciclo quase não se falava. 

O Rafael disse que preferia ficar com os amigos. E eu perguntei a professores e a gestores por que razão teria o Rafael de sair da sua terra? Por que não ficavam ali os alunos do segundo e terceiro ciclo? E os do Secundário? E até os universitários! 

Se, ao longo do ano letivo, precisassem de ir ao “centro de interpretação” ou a uma sessão de teatro, o “transporte escolar” os levaria. A propósito: escrevi “ano letivo”, mas por que havia “ano letivo”? A inteligência parava de funcionar em junho e voltava a funcionar em setembro?

O amigo Matias me enviara um texto produzido, em dezembro de 2016, por um “aluno triste do 9º ano”. Tinha por título “The dark side of de moon”.

“Até ao 8º ano, era um aluno que passava sempre com uma ou zero negativas. A primeira vez que reprovei foi no oitavo, com 4 negativas, foi a partir daí que comecei a ficar sem um bocado de interesse. 

Mas, na segunda vez no 8º ano, lá consegui passar. 

No ano a seguir, a primeira vez no 9º ano. Reprovei outra vez por culpa minha, porque não queria saber da escola, reprovei com sete negativas. 

Agora é a segunda vez no 9º ano. Entrei bem o período com interesse nas disciplinas, mas agora já estou a perder um bocado o interesse nas disciplinas. Quando começar o 2º período, vai começar muito diferente de como acabou o 1º período. O que me levou a ficar sem interesse pela escola foi por alguns professores do ano passado, que estavam sempre a reclamar comigo. E também estava desanimado, por causa de já ter reprovado uma vez.”

No dia seguinte à nossa ida a São Cristóvão, aconteceria uma “mutação genética” do sistema. Amanhã, disso vos falarei.

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCLXXVIII)

Amendoeira, 27 de junho de 2043

No início deste século, se vaticinava o fim da espécie, daqui a cerca de cinquenta anos. Não creio que tal aconteça. Mas, à cautela, fomos fazendo a nossa parte, no reino da educação, contribuindo para criar uma construção social de aprendizagem, que substituísse a velha construção parida na Prússia militar do século XVIII e que, por pouco (felizmente!), não cumpriu o seu fatal destino.

Durante meio século, fazendo a minha parte, atravessei o oceano, vezes sem conta. Recordo-me de, no final do périplo de vinte e três, me terem perguntado se eu iria mesmo parar de viajar. Respondi que iria tentar reduzir ao mínimo possível a minha andarilhagem. 

Por finais de junho, partira de Milfontes para o Freixo, na companhia da Tânia e da Ariane, uma aliança luso-brasileira, que, nos anos seguintes, protegeriam o Pedro, a Inês e o Valentim das agruras das salas de aula. Para trás ficavam mais de meia centena de lugares e uma nova geração de projetos. Hoje, revi um vídeo desse tempo. Nele, um amigo me interpelava.

“Então, ficará por cá?”

“Também ficarei por cá. Em setembro, voltarei Portugal. Mas, continuarei a viver no Brasil.” 

“E o que fará, quando voltar à pátria?”

“Trarei notícias da mátria Brasil, da terra que adotou o Mestre Agostinho e onde ele criou a primeira comunidade de que há memória.”

“E o que fará, entretanto? Continuará a acompanhar o projeto das comunidades?”

“Certamente. Mesmo longe, estarei por perto. “

“E o que fará, tão longe desta terra e dos projetos que por cá deixou?”

“É certo e sabido que a Internet tem contribuído para aumentar a solidão das pessoas e para desumanizar, ainda mais, a educação que cá se faz. Mas a Internet também pode ser um instrumento de humanização, bem usado pela A.R.C.A.”

Netos queridos, em outra cartinha vos direi o que foi a ARCA. Por agora, vos direi que, durante essas viagens, ajudei muitas famílias a reivindicar uma nova educação para os seus filhos. A sociedade despertava para uma realidade até então oculta sob um manto diáfano de fantasia. Sonhos viravam realidade acreditávamos ter “chegado a hora”. Apressei-me a enviar a uma Alma Gentil a boa notícia recebida do Adrian e da Raquel:

“Conseguimos abrir turma piloto com a Professora Rute! A Rute está entusiasmada e a diretora está contente por avançarmos.

Obrigado por tudo o que fez por nós e por nos guiar, nestas últimas semanas. Fez-nos não desistir e continuar a lutar. Em menos de um mês, estivemos juntos pela primeira vez e tudo mudou na nossa vida. Conseguimos juntar uma comunidade de pais interessados e uma professora viva, em apenas três dias. Agora, temos uma Professora viva e uma diretora alinhada.

Soubemos que já esteve nessa escola, há uns anos, e que até existe um livro sobre uma entrevista que fez lá. 

Um muito obrigado nosso! Um forte abraço!”

Nesse mesmo dia, já perto do fim da viagem a Portugal, a Cristina e a Caetana encontravam, em São Cristóvão, mais um professor vivo. Para lá fomos, no dia seguinte. No Portugal de 2023 se concretizava a “profecia”, que Agostinho deixara no Brasil de 1964:

“Nas chamas se consumirão hierarquias e autocratas; o que esperamos que surja é o lugar de educação e de vida para adultos e para crianças, em que o criar vá muito além do saber e lhe seja este puro servo, em que a liberdade crie sua própria disciplina; que das máquinas de fabricar adultos nem as ruínas sobrem; que a criança cresça harmoniosamente e livremente, sem as deformações que lhe infligimos, na vida que lhe fabricámos; que seja perfeita, na perfeição de suas conscientes intenções, não na perfeição do modelo que lhe demos”.

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCLXXVII)

Foros de Vale Figueira, 26 de junho de 2043

Neste mesmo dia, mas de há vinte anos, uma jornalista portuguesa publicou um artigo com o título: “Exames nacionais: vamos tirar a pressão”.

“Joana está a estudar para os exames nacionais do secundário. Está confiante, na última prova teve 20 valores (numa escala de 0 a 20). Ao seu lado, o telemóvel toca, é uma notificação: os rankings!

“Em que lugar ficou a minha escola?”

Procura a sua escola que, habitualmente fica em boa posição. Confirma-o com um sorriso, mas este desaparece quando encontra a nota de MACS. 

“Como é que é possível?”

De semblante carregado e lápis na mão, Joana começa a comparar a sua nota interna, aquela com que vai a exame, olha para a média da disciplina a nível nacional e a média da cadeira na sua escola (mais baixa que a nacional). 

“Isto não bate certo… Se calhar a minha nota interna não corresponde ao que eu sei, se calhar acho que estou bem preparada para o exame, mas não estou… Se calhar sei menos, comparativamente à média nacional… Como é que a média da escola foi tão baixa?”

Joana não aguenta e liga à mãe, quase em pânico…”

Voltarei ao artigo da Bárbara Wong (a jornalista). Mas, por agora, me quedarei pelo comentário a um vídeo que, também nesse dia – não seria poer acaso que haveria acasos… – e que, de algum modo esclarece a situação de “pânico” que se vivia em vésperas de exame de acesso à universidade.

Na outra margem do Atlântico, o Vítor, eminente professor universitário foi convidado para uma audiência na câmara dos deputados e começou por dizer: 

“No Brasil, está se fazendo aquilo que se deve fazer em educação. Estamos a formar pessoas para passar de ano, para ter um diploma. Que passem no SAEB, essa coisa horrenda, ou num ENEM, que não mede absolutamente nada.

Temos milhões de pessoas que sabem ler e escrever e que não leem nem escrevem. A pesquisa diz-nos que temos 65% de analfabetos funcionais. São analfabetos com diploma”.

O Vítor citava uma obra chamada de “VIDA E MORTE DO GRANDE SISTEMA ESCOLAR AMERICANO”, de que espero poder falar-vos amanhã, e concluía:

“A nossa escola está atrasada, pelo menos, cem anos. As ciências da educação não estão aplicadas na educação”.

Pois não. E o obsceno silêncio dos cientistas da educação perante a triste situação me fazia sentir vergonha

Para quem não saiba, o ENEM era a prova de acesso do “ensino inferior” ao “ensino superior”. O insigne professor e hábil pesquisador autor dessas frases denunciava a farsa dos exames e referia-se á importação de um modelo educacional oriundo do Estados Unidos.

No Brasil, o novo governo optara pela “sobralização” do ministério da educação, modismo norte-americano, exemplo típico de neocolonização que, ao longo de um mandato, apenas contribuiu para a mercantilização da escola pública. 

Em Portugal, usava-se o provérbio “da Espanha, nem bons ventos nem bons casamentos”. Se, no Brasil, nem “bons ventos”, nem algo inovador chegava dos anglo-saxônicos, certo é que, também em Portugal, não se estava “fazendo aquilo que se deveria fazer em educação”. 

A Lei de Bases não era cumprida. Os projetos educativos das escolas e os projetos de intervenção dos candidatos a diretores não eram cumpridos. 

Decretos como o 55/2018 tinham sido “neutralizados” por uma regulamentação de cariz técnico-instrumental e burocrático. Parecia que a única lei cumprida no reino da educação era… a “lei da gravidade”.

No encontro do Freixo do Meio, realizado a 29 de junho de 2023, os iniciadores de uma nova construção social de aprendizagem e de educação anunciavam o cumprimento da lei, fundamentado numa ciência prudente.

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCLXXV)

Santiago do Escoural, 24 de junho de 2043

Já havia participado em muitos projetos com as caraterísticas da Ponte e do Âncora. A Escola Aberta de São Paulo já garantia a todos os seus alunos o direito à educação. Enquanto isso, em Portugal, ainda havia professores agarrados a velhas e excludentes práticas. 

No junho de vinte e três, ainda havia diretores de  agrupamentos de escolas que inventavam pretextos para manter o status quo:

“Tenho que consultar o pedagógico.”

“Temos que pedir à Dgest.”

Era evidente que nada disso seria preciso fazer. Eram pretextos usados para adiar o cumprimento do projeto da escola (as práticas contrariavam o projeto escrito…), inviabilizar melhorias já comprovadas nas avaliações de outros projetos. 

Entre os anos de 2023 e 2024, redes de comunidades de aprendizagem surgiram, nas duas margens do Atlântico assentes na lei e cientificamente fundamentadas. Durante muitos anos, recorrendo à análise documental, à observação, a entrevistas e registos de encontros informais, esboçáramos um “ponto de situação” da educação. Reconhecendo a necessidade de validação dos dados obtidos, questionamos conclusões, testando-as em processos de mudança e inovação. 

Contemplando indicadores tradicionais e tendo por referência projetos de reconhecida excelência académica e inclusão social, elaboramos uma proposta de intervenção, para implementação de uma educação integral, humanizadora.

Se a manutenção de “centros de estudo” e de “explicações”, o elevado índice de reprovação e os “planos de recuperação”, eram algumas das evidências da falência do modelo instrucionista, por que se deveria adiar transformações?

Já vos tinha falado daquilo que era suposto que, nos círculos de aprendizagem, os jovens do núcleo de Iniciação aprendessem. Desta feita, não escapareis a mais um exercício de didática mínima. Em breves linhas, vos mostrarei o que esperávamos que os jovens aprendessem no núcleo de Desenvolvimento.

Aprendia-se através da reconstrução da experiência. Também se aprendia por associação. E nunca se aprendia uma coisa só. Toda a aprendizagem deveria ser integrada à vida, isto é, adquirida numa experiência real de vida

No núcleo de Desenvolvimento eram trabalhadas competências nas dimensões Linguística, Identitária, Naturalista, Lógico-matemática, Artística e Educação Físico-Motora. 

O jovem aprendia a compreender as suas responsabilidades e a ajudar a cumpri-las, em equipe. 

Mantinha uma boa relação com os outros jovens, aceitava e prestava ajuda, sempre que solicitado. 

Era persistente e revelava concentração no desempenho de tarefas, ultrapassando dificuldades. 

Tomava iniciativas adequadas às situações, sem intervenção alheia. 

Revelava segurança na execução das tarefas a seu cargo. 

Participava com criatividade e ativamente nas atividades realizadas pela escola. 

Aprendia a escutar, a intervir e a fundamentar. 

Aprendia a elaborar, desenvolver e atualizar planificações individuais, explicitando as suas intenções. 

Tornava-se capaz de extrair informações de materiais de pesquisa, de as trabalhar criticamente, de construir conhecimento e de o divulgar, comunicar… partilhar. 

Praticava sociocracia, técnicas de resolução de conflitos, tomada de decisões e reconhecimento de diferentes pontos de vista. 

Mobilizava saberes, para compreender e transformar realidades. 

Na pesquisa, manifestava a utilização de processos complexos de pensamento (a seleção, a análise, a síntese, o senso crítico, a comparação, a avaliação, a comunicação)… autonomamente. 

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCLXXIV)

São Cristóvão, 23 de junho de 2043 

Vai para uns vinte anos, um senhor chamado Jorge dizia que, com a inteligência artificial fazendo aquilo que era codificável, genérico, nós iríamos ter “um desemprego brutal e muitos novos empregos”. E foi isso que, em parte, aconteceu, em meados da década de vinte – o desempregado não tinha condições de assumir os novos empregos.

Quando a Escola preparava para o mundo do trabalho, a que trabalho se referiria? Ao dos empregos existentes no início dos anos vinte? Há vinte anos, os futurólogos afirmavam que, no final dessa década, oitenta por cento dos empregos de então já não existiriam. Hoje, são raros.

O Mestre Agostinho escrevera:

“O homem não nasce para trabalhar, nasce para criar, para ser o tal poeta à solta.”

Quando, no chão da escola, eu perguntava a uma criança o que ela desejava aprender ou queria ser (não “quando fosse grande”!), a resposta era, invariavelmente, esta:

“Eu posso dizer?”

Destituída do dom de perguntar, a criança perguntava se poderia perguntar. Perdera o direito à pergunta, fora privada de curiosidade, proibida de sonhar. Pois já tinha ouvido muitas respostas a perguntas que não fizera. 

De novo, Agostinho esclarecia:

“O que impede de saber não são nem o tempo nem a inteligência, mas somente a falta de curiosidade.”

A velha e obsoleta construção social de educação – o sistema de ensino – perpetuava-se, servida por funcionários dependentes de hierarquias autoritárias. Mas, nos anos que se seguiram, se a inteligência artificial fazia aquilo que era codificável, genérico, já havia robôs substituindo o dador de aula. O robô dava aula, não fazia greve, nem reclamava “condições de trabalho”.

O “sistema” tinha alcançado a sua fase do absurdo. E o Vasco da Maria era uma das vítimas dessa crítica fase. 

Dado que já nada mais havia a fazer para amenizar o drama, quando já todos os paliativos tinham sido aplicados, desesperadas e desesperadoras sessões de “desenvolvimento de inteligência emocional” eram vendidas às escolas. A Internet era fértil em “pérolas” deste jaez:

“Facilito formação a professores. E há um conjunto de questões que me fazem frequentemente. Uma dessas questões que mais me fazem é: Quais são os materiais essenciais para aplicar as estratégias que permitem ter uma sala de aula mais calma?”

Isto de “acalmar” miúdos tem muito que se lhe diga… Mas, há esperança minha gente!!! Existem algumas práticas que com pouco esforço e aplicadas com regularidade ou mesmo na rotina da tua sala, podem fazer uma GRANDE diferença. CLICA “5 Materiais Essenciais para ter uma sala de aula calma”. Vai lá ver tudinho. Estratégias para criares alguns materiais em versão caseira. Vá lá, são 3 minutos de leitura que te vão trazer calma, serenidade e tirar algumas dores de cabeça. Estás à espera de quê?”

É evidente que essa citação não merece comentário. Mas, crede que a Internet estava enxameada destes e de outros disparates-paliativos instrucionistas. E havia quem os comprasse, nomeadamente, educadores ministérios e adjacências.

A inteligência artificial não iria substituir o ser humano, mas exigia uma revisão, pedia a reinvenção e não apenas uma reforma da educação. Era isso que o Jorge reclamava:

“Nós temos que desencadear no mundo um projeto de educação para ontem. E os políticos não estão vendo isso, não estão falando disso.”

Pois não! Tinham andado a falar de uma mítica “Educação do Futuro”, de um futuro de que eu ouvia falar desde há mais de meio século e que tardava em chegar. 

Sem passado nem futuro, no junho de vinte e três, uma nova construção social de educação se fez presente.

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCLXXIII)

Lavre, 22 de junho de 2043

Saramago viveu em Lavre, no concelho de Montemor-o-Novo, durante o tempo em que escreveu a obra “Levantados do Chão”, relatando a vida de um povo sofrido, num período compreendido entre o final do século XIX e até ao último quartel do século XX. 

Nesse tempo, como diria o Almada, todos os tratados que visavam salvar o mundo já estavam escritos, só faltava salvar o mundo. Quando decidi ser professor, todos os tratados que visavam salvar a Educação já estavam escritos, só faltava salvar a Educação. Muitos “manifestos” foram publicados, milhares de inúteis congressos foram realizados, inúmeras inúteis formações concretizadas, ao longo de mais de um século. Generosas intenções, redentoras teorias, excelentes projetos se perderam nos meandros de um pérfido sistema de ensinagem. 

Faz hoje vinte anos, duas Cristinas e uma Caetana preparavam um encontro, que marcaria para sempre (e apesar de sofridos retrocessos) o rumo da Educação que se fez nas décadas de vinte e de trinta. Os projetos educativos desse tempo eram quase cópias uns dos outros, sem correspondência prática.  Mas, o diretor João assumira algumas propostas de prática, que seriam levadas “à letra”, nos anos que se seguiram ao encontro do junho de vinte e três. 

O enunciado de princípios era claro: 

“Prestar um serviço educativo de qualidade num ambiente democrático de equidade e de inclusão, numa lógica de interdisciplinaridade, rompendo, de forma gradual, com a lógica da segmentação disciplinar;

abandonar o paradigma da educação transmissiva e fomentar práticas ativas e aprendizagens significativas, como meio de promover e valorizar a aprendizagem, a participação, o esforço e o saber de cada um e o bem-estar de comunidade educativa;

ultrapassar os muros da sala de aula e abrir a aprendizagem a diferentes espaços, formando cidadãos autónomos, responsáveis, participativos, solidários e com espírito crítico;

conceber uma escola em que todos participam de forma ativa.”

Lestes bem! “Abandonar o paradigma da educação transmissiva”, “ultrapassar os muros da sala de aula”, intenções que levaríamos às últimas consequências. E… 

“Proporcionar um serviço educativo de qualidade mobilizando os meios de que o Agrupamento dispõe, para que todos aprendam e participem ativamente na vida da comunidade educativa, numa lógica de Agrupamento moderno e atualizado, dinâmico e inovador, capaz de favorecer ambientes e contextos educativos e formativos, facilitadores de aprendizagens em cooperação e articulação com a comunidade, incentivando a formação de cidadãos livres, autónomos, responsáveis, conscientes de si e do mundo que os rodeia, criativos, interventivos e empreendedores, capazes enfrentar os desafios de uma sociedade globalizante.”

“Aprendizagens em cooperação e articulação com a comunidade (…) uma escola dinâmica, inovadora, no contexto local e regional, sob uma identidade própria e aceite pela comunidade” (sic), uma aprendizagem no exercício pleno de cidadania. 

Se uma escola não mudava como um todo, que mudasse quem tomasse a decisão ética de mudar. Se havia diretores-ditadores que impediam mudanças, também havia diretores democráticos, como o de Montemor-o-Novo, que criavam condições para tal. 

No cartaz de anúncio do encontro de 29 de junho estavam escritas as palavras “Educação, Inovação, Ética”. Seriam evidentes no projeto escrito e numa prática coerente. Em Montemor, como em outros lugares onde a ética prevalecia e a inovação realmente acontecia, o tempo do faz-de-conta-que-fazemos terminava.

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCLXXII)

Montemor-o-Novo, 21 de junho de 2043

Prestes a viver o dia mais longo do ano no Freixo do Meio, fui almoçar com o amigo Alfredo e aprender com a Glorinha, que só havia conhecido ainda no ventre da sua mãe. 

Conversamos sobre o incontornável Agostinho. Pedi-lhe um livro emprestado, um saboroso livro (“Vida Conversável”), sobre o qual penso falar-vos em próxima cartinha. Inevitavelmente, discorremos sobre o futuro de Foros e do Freixo, do futuro presente das nossas crianças, das dificuldades encontradas e das possibilidades de projetar.

A crise da Escola prolongava-se sem fim à vista. Passara mais de um século sobre o primeiro sinal de alerta, dado no início do século XX pelos escolanovistas. Eurípedes, Anísio, Nise, Nilde, Agostinho, Irene, Freire e outros egrégios educadores reinterpretaram o movimento escolanovista, mas somente na década de sessenta ele tomou forma concreta. 

Paulo Freire assim se dirigia ao seu bom amigo Malaguzzi:

“O menino eterno pede-me, antes de eu retornar ao Brasil, que escreva algumas palavras dedicadas às meninas e aos meninos italianos. 

Não sei se saberia dizer algo novo a tal pedido. O que poderia dizer ainda aos meninos e às meninas deste final de século? Primeira coisa, aquilo que posso dizer em função de minha longa experiência neste mundo, é que devemos fazê-lo sempre mais bonito.

É baseando-me em minha experiência que torno a dizer: não deixemos morrer a voz dos meninos e das meninas que estão crescendo.” 

Dez anos depois de Reggio, a Ponte colocou o aluno no centro do processo de aprendizagem. e no mesmo ano (1976), Georges Bastin publicava o seu livro “A hecatombe escolar”. O prefácio assim rezava: 

“Este livro destina-se a pais ansiosos com as dificuldades que os seus filhos sentem, aos educadores que procuram uma explicação para a mediocridade dos seus alunos e para as suas próprias desilusões e a todos aqueles que se inquietam com as hecatombes escolares e que se interrogam acerca do futuro da juventude e da rentabilidade do sistema escolar. O autor analisa os diferentes fatores de sucesso e insucesso atribuíveis à organização dos estudos.

Constatando o enorme desperdício de esforços e de meios que representa para a sociedade a taxa crescente de inadaptações e de insucessos, o autor conclui pela necessidade urgente de uma tomada de consciência mais objetiva dos elementos de inadaptação, de uma colaboração mais estreita entre pais e pedagogos, de uma união dos esforços de todos os especialistas (médicos, psicólogos, sociólogos) em ordem a uma visão pluralista dos casos reputados difíceis.”

Entretanto, Mounier dissertara sobre a personalização do ensino e Dottrens sobre ensino individualizado. Bordieu e Giroux denunciavam a escola reprodutora de um modelo escolar e social iníquo. 

Escolas particulares tinham assimilado na exterioridade a proposta escolanovista, mantendo o status quo enfeitado de materiais Montessori, com hortinhas, aulas de meditação e arremedos digitais. E a rede pública nem isso assumia fazer. Os professores permaneciam distraídos, na solidão das salas de aula, reproduzindo um modelo de ensinagem hierárquico, autoritário, excludente, amoral e intelectualmente corrupto. Sob o manto diáfano de um agressivo marketing, recorrendo à mistificação, a administração tentava disfarçar a sua incapacidade de recriar a escola. 

A hecatombe educacional era um desastre “naturalizado”, não era um desastre natural, era um fenômeno produzido pela ação de seres humanos. E eram seres humanos que, no Alto Alentejo, abriam um “Caminho do Futuro”… no presente.

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCLXXI)

Foros de Vale Figueira 20 de junho de 2043

Netos queridos, 

Perdoai que vos fale de eventos tristes, lamentáveis, ocorridos há vinte anos. Faço-o, porque, ainda hoje, existe a tendência para matar memórias do tempo da proto-história da humanidade.

Remexi, mais uma vez, em velharias. E achei tristes notícias colhidas na Internet. No mês de junho de vinte e três, regressavam os ataques a escolas: 

Ataque em escola no Paraná: conheça a história de amor dos jovens que foram vítimas de atirador. Karoline e Luan eram namorados e frequentavam a igreja juntos. Em suas redes sociais, Luan se declarou à namorada: 

“É impossível pensar na felicidade, sem lembrar do teu sorriso. É impossível pensar num paraíso, sem lembrar dos teus abraços. É impossível pensar no amor, sem lembrar de você.”

O atirador, ex-aluno dessa escola, fez 12 disparos, após pedir o histórico escolar. A jovem não resistiu aos ferimentos e morreu no local do crime.” 

Nesse tempo, muitos brasileiros migraram para Portugal, em busca de segurança. Mas, não se pense que a outra margem do Atlântico estava imune à vaga de assassinatos.

“Apontado como o sexto país mais seguro do mundo, o país foi sacudido pelo assassinato de duas mães pelas próprias filhas.

No sábado, 9 de junho, depois de mais uma cobrança de Maria para que a filha entrasse nos eixos, Suzana partiu para cima da mãe e desferiu uma série de facadas na mulher que havia feito de tudo para lhe dar uma boa educação.

Depois de matá-la, saiu de casa como se nada estivesse acontecido.

A vida de Isaltina Gomes, 92 anos, também não estava fácil nos últimos tempos. Com a saúde debilitada, demandava cada vez mais atenção da filha, Luísa Madeira, 67 anos. De família de classe média alta de Coimbra, as duas sempre demonstraram manter uma boa relação.

No sábado, 17 de junho, Luísa atacou a mãe com uma pedrada na cabeça. Depois do crime, tirou a própria vida. Vizinhos se mostraram surpresos com o acontecido.” 

Filha matando a mãe, mãe matando o filho, e Kiev atingida por forte ataque de drones russos.

Os projetos (os escritos!) das escolas estavam repletos de referências a “educação socioemocional, cidadania, educação para a paz…”, mas era a Ponte que acolhia aqueles que outras escolas rejeitavam. Chegavam “desmotivados”, “violentdos”… violentados.

Chegaram dois jovens, que as escolas da região diziam não saber como ensinar.

O mais velho agredia-se com auto-mutilação. O seu corpo era todo uma cicatriz.

Não demorou a procurar um objeto cortante. Dirigiu-se à cozinha, mas não conseguiu pegar a faca, que viu em cima da banca. A “comissão de ajuda” estava atenta.

Sempre que algum “aluno difícil” (como os designavam) aportava àquela espécie de hospital das almas, um grupo de alunos se voluntarizava para constitutir uma “comissão de ajuda”. Era o valor solidariedade posto em ação…

Irritdo, por não poder cortar-se, foi até ao banheiro e urinou no cesto do lixo.

No dia seguinte, havia reunião de assembleia. Lá estava o novo aluno, rodeado pelos colegas da “comissão”, olhando à sua volta, sem saber o que se passava. Era a primeira vez que participava da assembleia. 

O Pedro foi o primeiro a pedir a palavra. E disse:

Amigos, nesta semana,um de nós urinou no cesto do lixo.

O novo aluno sobresssaltou-se. Iriam acusá-lo? Castigá-lo? Todo mundo sabia ter sido ele o autor da façanha. Olhou à sua volta. Ninguém olhou para ele. E o Pedro continuou:

Quem pode ajudar um de nós a não voltar a fazer isso?

Toda assembleia ergueu o braço. O novo aluno, também. Compreendeu que ninguém o iria acusar, ou punir. Estavam ali para o ajudar. Ele era “um de nós”.

 

Por: José Pacheco

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