Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCCXLIV)

Leiria, 1 de setembro de 2043

Quando setembro chegava, sucediam-se as adesões ao projeto “Novas Construções Sociais de Aprendizagem” e, també, pedidos de ajuda e esclarecimento.

Naquele tempo, a palavra ainda era fonte de mal-entendidos. Se eu pronunciasse a palavra “escolas”, a maioria dos meus ouvintes, mentalmente, representava as “escolas” como prédios feitos de salas. de aula e solidões, e eu pretendia que compreendessem que escolas eram pessoas. Se eu pronunciasse a palavra “projeto”, entenderiam que eu não estava a referir-me ao mero plantar de uma horta, ou a “aulas de meditação” 

De que estaríamos a falar, quando falávamos de escola, de inovação, de educação integral, de círculos de aprendizagem, de turmas-piloto, ou comunidades de referência? 

Face à dificuldade de me fazer entender, resolvi redigir um glossário. Já o amigo Rubem perguntara à Bárbara por que estava a fazer um glosssário. 

“É que nós estamos a estudar a Carta do Pero Vaz de Caminha. E há palavras em latim deturpado, que os mais pequenos não conseguem entender.”

“Foi uma professora que te disse para fazer o glossário?” – inquiriu o Rubem.

“Não! – exclamou a pequena – fui eu que quis fazer, para ajudar os meus colegas.”

Perante a solidariedade ativa daquela criança, o Rubem foi até à janela, olhou lá para fora, para que ninguém visse que estava a chorar de emoção. 

Eu vi. E, quando um homem chora de emoção alcança o primeiro lugar do meu ranking de humanidade. Aproximei-me dauqele visitante, conversei com ele. Nessse momento, sem que soubesse, estava dar o primeiro passo da minha diáspora brasileira.

Cito de memória alguns dos verbetes de um glossário composto, lá pelos anos noventa, numa linguagem que todo mundo entendesse. Comecemos pela letra E.

Escolas: Pessoas, que aprendem umas com as outras. no contexto de uma organização social dotada de autonomia, em todo e qualquer lugar com potencial educativo. Pessoas que aprendem no exercício de uma intersubjetividade geradora de vínculos estabelecidos com um objeto de estudo e com mediadores. 

Educação Integral: Será aquela que contemple a multidimensionalidade do ser humano: a formação no domínio cognitivo e uma plena formação pessoal e social (afetiva, emocional, ética, estética, dentre outras). 

Não deverá ser confundida com mais tempo passado dentro ou fora de um prédio, em atividades de desculpabilização curricular. 

Há quem refira fazer esse tipo de educação em sala de aula. É abusiva tal referência, Em sala de aula não é possível desenvolver “educação integral”, pelo que não se deverá usar essa expressão em vão.

Na intenção de clarificar o léxico de uma educação do século XXI, recuemos para a letra D.

Desenvolvimento Sustentável: Teia da qual defende nossa vida, projetada considerando a natureza. Pressupõe que o crescimento (ou uma humanização com referência a um “decrescimento”) benfazejo deve ser baseado nas energias renováveis, favorecer a comunidade local, ser crescimento qualitativo.

Design de Sistemas Sustentáveis: Conceito que pressupõe “envolvimento”, pois envolve soluções sistêmicas integrando as dimensões social, cultural, econômica e ecológica, com o objetivo de promover sustentabilidade na micro e na macro escala, isto é: uma boa qualidade de vida. 

Dispositivos pedagógicos: Estratégias e materiais a que se pode recorrer na prática educativa, concebidos criticamente e elaborados como propostas educativas adequadas às características socioculturais identificadas pelos professores como estando presentes no grupo de alunos com que trabalham.

(continua) 

 

Por: José Pacheco

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