Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCCLXXXI)

Guarulhos, 8 de outubro de 2043

Sazonalmente, teoricistas e empresários ressuscitavam um conceito ou copiam uma prática de antanho, para deles fazer enfeite de tese ou produto vendável no mercado da educação. 

Num dia de outubro de vinte e três. enquanto esperava que a Vovó Ludi chegasse a São Paulo, eu refletia sobre dois modismos em voga, por essa altura: o “socioemocional” e a “educação integral”. O anúncio de seminários e congressos chegavam à internet, em catadupa, fazendo as delícias de palestrantes e o lucro de empresas do ramo educacional. 

Essa “febre” passou, como haviam passado a das “taxonomias”, a do “ensino híbrido” e quejandos. Mas, provocou danos irreparáveis, por ter sido ilusão de momento e paliativo de um instrucionismo tardio.

“Educação integral” era uma das expressões mais usadas para enfeitar projetos político-pedagógicos e para sofisticar o discurso dos preâmbulos de decretos. Era um tema recorrente nas palestras de leitura de power point e na história das ideias pedagógicas, desde a antiguidade. Já Aristóteles falava em educação integral. E, no início do século passado, por volta dos anos vinte, Claparède e Freinet preconizavam “uma educação integral ao longo de toda a vida”. 

As práticas inspiradas nesses autores visavam o pleno desenvolvimento pessoal e social, exercício de uma pedagogia do lugar. Partiam do pressuposto de que o ser humano era multidimensional, um complexo composto de afeto, emoção, estética, ética, espiritualidade e cognição. Porém, as práticas inventariadas, nos idos de vinte e três, não passaram de caricaturas. 

No Brasil, as experiências de educação em tempo integral, de que tive conhecimento, eram tímidas e os seus efeitos eram condicionados pela prática de um modelo escolar inadequado, no qual ainda muitas escolas insistiam, despendendo avultados recursos e obtendo um retorno escasso. 

Com a Vovó Ludi, a Tina e a Zizi, fui até Cubatão, ao encontro de educadores conscientes do risco de perigosa adoção de paliativos e “soluções milagrosas” para os males do sistema. Uma secretaria avisada, consciente, dava aos seus professores a oportunidade de vivenciar práticas de efetiva educação integral. No pressuposto de que, quando se falava de educação socioemocional dos alunos, se deveria cuidar da formação sócio emocional dos professores. 

Do que aconteceu vos falarei em próximas cartinhas. Por agora, somente vos deixarei uma conclusão retirada da produção teórica e de formações e palestras sobre “educação integral”, desastrosas práticas que apenas contribuíram para prolongar a agonia instrucionista. Por que não se admitia que nas escolas de sala de aula jamais seria possível concretizar educação integral?

A instituição Escola mostrava-se surda ao apelo de Morin: 

Temos a necessidade de reformar radicalmente o atual modelo de ensino nas universidades e escolas. O conhecimento está desintegrado em fragmentos disjuntos no interior das disciplinas, que não estão interligadas entre si e entre as quais não existe diálogo. O modelo atual leva a negligenciar a formação integral e não prepara para enfrentar o imprevisto e a mudança”.

Apesar dos seus trágicos efeitos, uma cultura, sedimentada ao longo de quase três séculos, reproduzia-se a si própria, da universidade ao chão das escolas, impedindo a emergência de novas práticas. Muita da “educação integral”, que se fazia, enfermava desse mal. Nos idos de vinte já se questionava a “eficácia dos contra-turnos”, embora as “alternativas” fossem de duvidosa eficácia e eficiência. Disso vos falarei amanhã.

 

Por: José Pacheco

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