Frutal, 2 de março de 2043
No início do mês de março de há vinte anos, estava próximo o primeiro dia da Conferência Nacional de Alternativas para uma Nova Educação (CONANE). Em 2013, eu participara da criação da CONANE e da elaboração do “Terceiro Manifesto pela Educação”, documento entregue ao Ministério da Educação pelas mãos da minha amiga Jaqueline.
Os companheiros e as companheiras da organização do evento pediram-me para fazer parte da Mesa de Abertura da Conferência. Disse-lhes que não seria possível, dado que, no dia anterior, estaria em Porto Alegre, ajudando educadores, até ao final do dia. Contudo, consegui “apanhar” um voo noturno e chegar a Brasília de madrugada.
Cheio de sono, fui para o local do evento. Sentei-me na cadeira mais distante do palco. Mas alguém me viu entrar no auditório e me chamaram para “compor a mesa”.
Quem ainda esteja vivo (se pergunto por velhos companheiros, quase sempre respondem “Morreu”) e nessa sessão tenha participado deverá recordar-se de que eu não fui capaz de articular discurso. Quando subi ao palco e olhei aquelas quatrocentas pessoas, me dei conta de que tinha estado com todas elas, no chão das suas escolas – uma forte emoção me embargou a voz.
Volvidos dez anos, a CONANE resultante da iniciativa de “Românticos Conspiradores” adquirira autonomia. A minha amiga Sônia e a sua equipe cuidavam da sua preparação. Porém, notícia de alguns “desvios” da ideia inicial me chegavam. E me inscrevi na CONANE, para apresentar três comunicações e dissipar receios.
No fundo do baú das velharias, achei os textos dessas comunicações e umas mensagens enviadas aos participantes na Conferência. Nas próximas cartinhas, irei transcrever alguns excertos desses documentos.
Nos encontros preparatórios da primeira CONANE, a de 2013, os Românticos Conspiradores (creio já vos ter falado desses extraordinários educadores) tentaram definir o que seria “alternativa” ao sistema instrucionista. A Conferência ostentava essa designação e visava tornar públicas manifestações de uma “nova educação”. Por isso, achei por bem formular três perguntas:
Quais eram as práticas “alternativas”? De que “nova educação” se tratava? Cadê as “práticas inovadoras” de que ouvia falar?
Nesse tempo, a voz e a escrita do Mestre Pedro incomodava teoricistas e praticistas, por ser muito claro (e fundamentado) aquilo que afirmava:
“Iniciativa primeira é abandonar o sistema atual de ensino. Não presta, nem é sanável. É um equívoco encalacrado em sua própria reprodução.
Impressiona o quanto a pedagogia instrucionista é arraigada, formando um consenso aterrorizante. Existe o temor do novo: que seria uma escola sem aula? Mas temos referências já: veja-se o Projeto Âncora; é comunidade de aprendizagem e ciência, bem integrado na comunidade, com muita participação, sem sala de aula, sem aula, com professores totalmente dedicados à aprendizagem dos alunos.”
Era preciso “não repisar a miséria, mas tentar sair dela”. Ir para além “do cinismo dos nossos dirigentes, denunciar “o mascaramento dos problemas”.
Assim falava o Mestre Pedro:
“Iniciativa primeira é abandonar o sistema atual de ensino. Não presta, nem é sanável”.
Lestes bem: abandonar o sistema de ensino, instituir um sistema de aprendizagem.
Acolhendo essa recomendação e mediante a “experiência” colhida em mais de cinquenta anos de projetos, também ousei recomendar. Com gente séria deveríamos estabelecer diálogo. E que com burocratas autoritários e “funcionários do sistema’, pacificamente, praticássemos não-violência e desobediência civil.
Por: José Pacheco
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