Ponta Delgada, 17 de abril de 2040
É isso mesmo, querido Marcos! Estas cartinhas são pretexto para ir contando estórias do tempo da velha escola. E, também, de como uma nova escola e uma nova educação surgiram, há cerca de vinte anos.
Em meados de abril, uma mãe fez algo maravilhoso e inesperado (sic): organizou uma videoconferência entre crianças. Convidou a diretora de turma do seu filho, que aderiu à iniciativa. A professora da disciplina de Tecnologias de Informação e Comunicação, responsável pela escolha da plataforma de e-learning, pediu para participar.
Na videoconferência, as professoras explicaram por que motivo a escola esteve quatro semanas afastada do convívio com as crianças. Conversaram com todos os alunos, dirigindo a cada um palavras reveladoras do que eles tinham de melhor. E com palavras esperançosas essa mãe concluía uma postagem no facebook: O facto de as professoras aceitarem fazê-lo em conjunto com os pais permite dar o Kick Off para uma verdadeira comunidade de aprendizagem.
Como não é por acaso que há acasos, quase no mesmo dia dessa videoconferência, a minha amiga Conceição – que protagonizaria uma bela “live”, no abril da pandemia – mandava notícia de novos rumos traçados nas açorianas ilhas: Passadas duas semanas de confinamento e depois de uma chamada de vídeo com os amigos, que já estavam a fazer a “roda da manhã” em suas casas, a vontade de “construir um Novas Rotas” em casa surgiu naturalmente. “Roda”, “folha de mostrar e contar”, “o estado do tempo”, “quantos somos?” – o “plano individual de trabalho” sendo elaborado… até que surgiu uma pergunta, que nos levou para novo projeto: Como é que somos por dentro? As crianças do Projeto Novas Rotas continuam a trabalhar, seguindo os seus roteiros de estudo, de forma autónoma, tendo as suas sessões de tutoria e momentos de especialista à distância.
Integrada na “Rede de Comunidades de Aprendizagem” – em próxima carta vos direi o que isso era – a Conceição percorria caminhos possíveis de aproximação escola-família, em tempos de distanciamento social. Como afirmara aquela mãe, a crise revelara múltiplas possibilidades de estabelecimento de laços. Viver junto assumira novos significados, o de contato intenso, real, de todas as horas, em espaços comunitários de aprendizagem interligados pelo virtual.
Na minha diáspora educacional, no dia 12 de setembro de 2018, chegava à ilha de São Miguel, para aprender aquilo que a Conceição me poderia ensinar. E para a ajudar a tornar sustentável uma comunidade de aprendizagem nascente.
O jornal “Açoriano Oriental” havia dado a boa-nova: O projeto Novas Rotas foi aceite pela Escola das Capelas. Conceição Medeiros, coordenadora do projeto afirma que este projeto-piloto de inovação pedagógica já recebeu o aval da Direção Regional da Educação. Será implementado no próximo ano letivo, na Quinta do Norte. Fará com que todos aprendam com todos. E que, em cooperação, contribuam para o bem comum. É um sonho tornado realidade. É com grande entusiasmo que aceitamos este desafio para apresentar o Novas Rotas, num ambiente de verdadeira Comunidade de Aprendizagem, onde prevalecem valores como a solidariedade, a cooperação, a criatividade… e o saber.
Pude testemunhar o envolvimento dos pais das crianças e ver crianças aprendendo, sabendo por que aprendiam. Uma motivação intrínseca os impelia para a descoberta de si e para o reconhecimento do outro. Davam forma corpórea aos versos da Adélia: Não quero faca nem queijo / Quero a fome.
Por: José Pacheco