Cordeirinho, 10 de dezembro de 2041
Estávamos já em plena quarta revolução industrial. Entrando na geração 5.0. já dispúnhamos de impressoras 3d, com as quais podíamos fabricar objetos, sem sair de casa. A exploração espacial conduziria à criação de fábricas no espaço, produzindo objetos mais baratos, sob o efeito da gravidade zero.
A energia solar descentralizada e outras energias renováveis e limpas já iam substituindo o uso de combustíveis fósseis. A Internet das coisas e os sensores de controle facilitavam tarefas domésticas e a vida em comum. O wi-fi planetário transformava o mundo uma pequena aldeia. O carro autônomo, a robótica e o desenvolvimento exponencial da inteligência artificial iriam substituir o ser humano em múltiplas situações.
Nesse início dos anos vinte, se anunciava que oitenta por cento das profissões existentes desapareceriam em menos de dez anos. E as escolas continuavam a preparar os seus alunos para profissões do século XX.
Neste tempo de incertezas e transições, carecíamos de um novo sistema ético e de uma matriz axiológica clara, baseada no saber cuidar e conviver. Urgia transformar a educação, transformando os contextos em que ela acontecia. Urgia, também, estabelecer interação humana entre a escola e a cidade, capaz de dar sentido ao quotidiano das pessoas e influenciar positivamente as suas trajetórias de vida, contribuindo para a criação de verdadeiros laboratórios de laços sociais, onde a vinculação ética ao outro tivesse a marca da solicitude mútua.
Novos questionamentos davam origem a projetos de produção de vida e de sentido para a vida, na relação com um território biológico e psicológico de partilha em redes de aprendizagem. Quem aprendia apropriava-se, não apenas do conhecimento, mas também do processo pelo qual adquiria conhecimento.
Mas as escolas mantinham-se ancoradas em velhos e inúteis modos de transmissão de informação.
Dizia a Clarisse que, em matéria de viver, nunca se pode chegar. E que a trajetória éramos nós mesmos. Alguém dissera, também, que o educador era mais aquilo que fazia do que aquilo que sabia, sendo mais aquilo que era do que aquilo que dizia.
Era possível obter mudanças efetivas no comportamento e na cultura humana, questionando a estrutura das formas de educação que praticávamos. O desenvolvimento de atitudes de respeito, solidariedade e preservação da vida ajudava a superar visões fragmentadas e a, aprender a ver as relações entre as coisas. Mas a atividade docente perenizava uma visão de mundo retrógrada e as escolas mantinham-se na contramão da mudança. Haveria muitos modos de concretizar utopias. Mas a distopia escolar obstava a que tal acontecesse.
Não passava de um grave equívoco a ideia de que se poderia construir uma sociedade de indivíduos participantes, democráticos, enquanto a escolaridade fosse concebida como mero adestramento cognitivo. Para exercer solidariedade, seria necessário compreendê-la, vivê-la em todo e qualquer momento. Projetos eram atos coletivos, consubstanciados numa lógica comunitária, que pressupunha profunda transformação cultural.
Urgia reformular terminologias: desenvolver trabalho COM e não trabalho PARA; substituir o OU pelo E; trocar o EU pelo NÓS. Urgia considerar o aluno como participante ativo de transformações sociais, reconfigurar as práticas escolares.
Bastaria que os professores se interrogassem. Da interpelação das práticas, talvez emergissem dispositivos de mudança nas escolas e em outros espaços sociais onde ocorresse aprendizagem.
Mas, as escolas…
Por: José Pacheco
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