Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MXXVII)

Maricá, 17 de outubro de 2042

No segundo dia do ENARC, pude comprovar que em Petrópolis havia mais do que um povo resistente a enxurradas. A Cecília estava bem acompanhada no enfrentamento de outras catástrofes. Eram muitos e bons os petropolitanos conscientes da necessidade de mudar.

Nesse ensolarado domingo, aprendemos a observar pássaros, dançamos, plantamos árvores, aprendemos a aperfeiçoar a arte de ensinar, na arte do encontro.

A Adriana, Secretária de Educação, participou em todos os atos. Mas, não era só uma secretária que ali estava. Era uma pessoa! Um ser humano sensível, exercendo solidariedade. Na véspera, outra Adriana, que também estava secretária, me enviara a foto que junto a esta cartinha, com uns dizeres:

“Professor José Pacheco, eis nosso Mestre Darcy Ribeiro, a vida dele continua a existir na minha, na sua e nas de tantas outras pessoas. Obrigada por fazer parte minha vida e por me permitir fazer parte da sua.

Feliz Dia do Professor e Felizes sejam todos os nossos Dias”

A Adriana me agradecia, mas quem deveria agradecer seria eu. Estar grato à Adriana e a todos os educadores que, nos tempos difíceis dos idos de vinte, “seguraram o tranco” da Educação.

A expressão (brasileira) que utilizo traduz na perfeição o clima político que, então, se vivia, com metade do Brasil a agir “como um cego no meio de um tiroteio”. Só com expressões tão criativas como essas poderíamos caraterizar movimentos sociais desse tempo. Quanto mais eu aprendia o Brasil menos o entendia, o que provava que Darcy estava certo: o Brasil não era para amadores.

No final da tarde, outro bom brasileiro e amigo, o Paulo, voltava da Amazônia e me ligava dizendo ir visitar a Terra do Brincar. Para lá voltei, na boa companhia do Conrado e da Thais.

Partia para Maricá mais seguro de que, no final desse outubro, se começaria a inverter os descaminhos que a educação percorrera nos anos anteriores. Estava a ser atravessado por novas sensações. A de que o Brasil retomaria uma prática política que dele fizesse o que Darcy e outros anunciaram. E a de que, a breve prazo, eu poderia descansar de uma vida feita de viagens e canseiras. Outros tomariam o lugar deste velho e insuportável professor.

Na São Paulo do distante ano de 2004, a Carla, o Guga e outros amigos tinham cuidado de organizar “Românticos Conspiradores” dispersos. Em 2013, os RC publicaram o “Terceiro Manifesto da Educação com o lema “Mudar a Escola, Melhorar a Educação: Transformar um País”.

Entre o Google docs e as redes sociais, em internéticos e-mails, debates e reuniões presenciais, se gestou esse documento. O manifesto assumia-se como instrumento de debate e conduziu à realização de primeira CONANE – Conferência Nacional de Alternativas para uma Nova Educação.

Em suma; os RC apontavam como finalidade maior a transformação da Escola Pública, para que fosse, verdadeiramente… pública. Estava implícita na sua carta de princípios uma ideia de comunidade, de aprendizagem compartilhada. E, como não eram gente de meias intenções, lançavam o convite:

“Arregace as mangas e venha desdobrar o Manifesto em ações concretas!”

Os RC semeavam fraternidade, no sentido que lhe dava Francisco: “frater”, “irmão”. Uma fraternidade renovada, fundada no respeito pela dignidade da pessoa humana. A fraternidade que, em ato, a nossa irmã Cecília traduzia.

Com o “frater” Conrado rumei a Maricá, após três dias de fraterno convívio no Ciep Cecília Meireles, um lugar onde estudantes e professores agiam como cidadãos, repensando o mundo, apontando soluções.

Foi isso o que vi e vivi no ENARC de Petrópolis.

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