Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MLX)

Córrego Novo, 20 de novembro de 2042

No novembro de há vinte anos fui até aos cafundós de Minas, conhecer gente que fazia acontecer. A secretária Robenícia orgulhosa do desempenho dos seus professores, mas também consciente da necessidade de inovar. O Américo pediatra cuidando de crianças, e prefeito preocupado com o futuro das crianças grandes à sua guarda. O Bruno estimulando o capitão das congadas e buscando caminhos de recuperação de tradições perdidas. O educador Lucca embrenhado na tarefa de educar com responsabilidade, cumprindo o princípio básico da “cidade educadora”, aquela que entende o potencial do território, que explora suas possibilidades e as transforma em capital educativo.

Raúl Soares enveredava por práticas de aprender em comunidade, concretizava um projeto coletivamente concebido. O Mestre Florestan aprovaria, pois reconhecia que, para adaptar a educação aos recursos fornecidos pela ciência e às exigências da civilização científica, além dos obstáculos opostos às inovações necessárias pelo jogo dos interesses sociais ou pela estrutura rígida do sistema de instituições educacionais, os educadores enfrentariam dificuldades erguidas pela inexistência de uma perspectiva comum na escolha dos fins e dos meios das atividades educacionais.

Naquele tempo, Floresta e outros mestres eram ignorados, ou ostracizados. Mais de cem anos decorridos sobre a vaga escolanovista, que afirmou o primado do pedocentrismo, já no estertor do instrucionismo, ainda havia académicos que dissertavam sobre “protagonismo do aluno”, enquanto davam aula centrada no professor.

E o vosso avô invocava um jargão de décadas: os professores precisam mais de interrogações do que de certezas. Quando “especialistas” procuravam modos de melhorar a oferta daquilo a que chamavam “ensino médio”, perguntava: Por que há ensino médio? E o que é “ensino médio”? Sempre que criticavam um instrumento de darwinismo social a que tinham dado o nome de “vestibular” e apontavam virtudes de um “ENEM”, perguntava: Por que há ENEM? Enquanto exame, instrumento falível de avaliação, o que avalia o ENEM?

Paralelamente a estéreis exercícios de erudição pedagógica, em Raúl Soares e muitos outros lugares do Brasil já se ensaiava a criação de círculos de aprendizagem, federados em potenciais protótipos de comunidade, organizados em rede. 

No início deste século, o vosso avô rascunhara um projeto que dava pelo nome de “Escolas Inovadoras em Rede”. A “base teórica” do projeto ficara a levedar num cantinho da memória do computador. Em finais de vinte e dois, estava chegando o tempo de o testar.

O Projeto: “Escolas Inovadoras em Rede”, fora precocemente ensaiado no Projeto Âncora. Já então se fazia urgente, na medida em que pretendia reavivar a prática educativa, considerando cada contexto escolar como comunidade. Numa lógica de progressiva autonomia, inovações curriculares, pedagógicas e administrativas, deram origem a um modelo de organização de escola que, em muitos aspectos, divergia do modelo prevalecente de escola pública. 

O Estado e a sociedade civil estavam devendo às leis o seu cumprimento e à ciência a sua aplicação. Urgia interrogar práticas hegemônica. Urgia juntar à aprendizagem escolar o domínio da arte e cultura, da saúde pública e ambiente. Seria necessário um novo renascimento que religasse a teoria com a prática, que unisse a universidade, o poder público e o chão da escola. 

Ainda iríamos a tempo de reunir a escola, a sociedade e a família, na configuração de novas construções sociais de aprendizagem? 

 

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