Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MLXIX)

Diadema, 29 de novembro de 2042

Durante muitos anos, aprendiz atento, acompanhei reflexões de exímios mestres. Quando pude lê-los no WhatsApp (recordais-vos desse arcaico aplicativo?), duas coisas pude inferir. Confirmei serem sábios e generosos. E que, pelo modo como comentavam atos de um governo de transição, estavam perto de agir, para evitar que se perdesse mais uma oportunidade de mudança.

Amanhã, vos falarei em pormenor sobre aquilo que esses sábios fizeram e que contribuiu para evitar que lideranças tóxicas liquidassem, à nascença, mais projetos com potencial inovador. 

“Professor Zé, infelizmente, informamos o senhor que o Conselho de Escola decidiu, em reunião ocorrida ontem, não autorizar que continuemos a desenvolver o nosso projeto. É triste!”.

Assim mesmo: decisão sem fundamento, sem justificação plausível. A Escola Pública definhava. E os meus amigos das ciências da educação manifestavam perplexidade e preocupação:

“No seminário, senti que precisamos debater e refletir muito sobre a Educação. Principalmente sobre a Educação Básica, tão pouco considerada. Para ajudar a esclarecer, inspirar e motivar as lutas que teremos que fazer nos anos que virão (…) para retomar, consolidar e avançar o projeto social, político e educacional da Pedagogia dos Direitos e da Humanização”.

Estávamos em 2022, no final de um tempo de desmonte da Escola Pública, de “corrupção e degradação da Educação do Brasil”. E o meu amigo e comentador acrescentava:

“Desvario, incompetência, violência, irresponsabilidade e mediocridade necrófila na Educação. Temos que recompor o ethos da Pedagogia da Inclusão, da Educação Integral e das metas do valente PNE. Mas, não tem sido esse o tom dos discursos que tenho acompanhado. Estou um tanto assustado. 

O protagonismo dado ao Todos pela Educação, às fundações e empresas privadas de serviços educacionais é uma preocupação. Quase um desespero. A ausência de uma fundamentação filosófica, política e pedagógica emancipatória, democrática, participativa e coletiva, que priorize as universidades públicas, os movimentos sociais e as organizações educacionais e culturais da sociedade civil brasileira é uma aberração tantas vezes repetida. Avaliação, resultados, excelência e bobagens do gênero. 

Chega, eu não aguento mais esse ramerrão estúpido composto de conceitos toscos como “avaliação em larga escala”, ” IDEB, Saeb, BNCC, Pisa”, alinhavados pela proposição de “competências e habilidades”, “protocolos e descritores” insossos, inodoros e vazios.” 

Como eu compreendia a indignação desse meu amigo! Ele possuía a percepção exata do risco de perder mais uma oportunidade de se fazer Escola Pública.

Outro amigo não demorou a replicar, pondo o dedo em feridas já abertas: 

“Eu concordo plenamente. Mas, o que fizemos, ou não fizemos, que resulta no fato de que neste momento somos menos escutados que aqueles que preconizam marketing educacional de empresa? 

Como funciona a formação de professores nas nossas universidades? Relacionada mesmo com as escolas e os professores? Trabalhamos para formar mesmo profissionais do ensino, ou para irmos dormir satisfeitos de estarmos do lado do povo? 

Acho que chegou o momento de reflexão sobre nosso próprio funcionamento. O que temos a dizer e fazer, para que mude mesmo uma situação em que ainda muitos jovens de meio popular não consigam ultrapassar o nível de quarto ano?” 

Intrometi-me na conversa, para dirigir a esses amigos fraternas interrogações. Para começar, quedei-me por uma pergunta elementar:

“O que é o “quarto ano”?

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