Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MLXXVII)

Rio das Flores, 7 de dezembro de 2042

Já aqui referi a existência de um terceiro manifesto da educação brasileira. Publicado em 2013, foi votado ao ostracismo. Desta vez, o menciono, em palavras de outro dos seus coautores. Faço-o, à distância de trinta anos, para que a memória dessa geração e da geração dos “pioneiros” e “convocados” não se apague.

O Terceiro Manifesto foi fruto de árduo trabalho. Não me refiro à tarefa de o termos redigido, mas da tentativa (frustrada) de o operacionalizar. 

Numa entrevista, a Ely isto dizia:

“Um sistema ultrapassado e tenta perdurar. Não tem mais sentido científico nem legal. É um bolo com massa e recheios podres e um lindo glacê branco por cima. Vem um governo e troca o glacê, vem outro e põe um moranguinho. Nenhum mexeu na massa.

Cadeiras enfileiradas em frente ao professor que fala por 50 minutos sem parar. O cenário comum às salas de aula brasileiras já não é mais tão bem aceito por alguns educadores, tampouco pelos alunos.”

Assim se expressava a Ely. Dez anos decorridos, as cadeiras continuavam enfileiradas em frente a um professor, que falava por 50 minutos. E a inovação maior desse período – a Escola do Projeto Âncora – ia sendo destruída, deixando raras réplicas.

Entre os anos de 2004 e de 2013, os Românticos Conspiradores elaboraram o Terceiro Manifesto. Lançaram-no na primeira CONANE. Depois, no entender da Ely, ele terá sido… “engavetado”.

O manifesto demonstrava, com base em estatísticas oficiais, que a situação da educação brasileira estava aquém do desejado. Um relatório da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), de 2010, revelava que 56 bilhões de reais tinham sido desperdiçados por más políticas públicas do setor. Entre os 100 países com melhor Índice de Desenvolvimento Humano do mundo, o Brasil era o terceiro com maior taxa de abandono escolar. Anualmente, três milhões de jovens deixavam de estudar e 47% dos universitários desistiam no meio do curso.

A divisão etária dos alunos era questionada. Dizia a Ely que “a separação das crianças pela idade, no momento de entrada na escola, tinha tido origem na década de trinta, quando essa medida era necessária para limitar as vagas públicas, devido à grande procura e pequena oferta. Entretanto, o Estatuto da Criança e do Adolescente tornou obrigatório o oferecimento das vagas. 

Os períodos de 50 minutos em que as aulas são divididas remetem-nos a um período ainda mais distante. É herança da divisão precisa de tempo imposto pela Primeira Revolução Industrial do século XIX, e a segmentação cartesiana das disciplinas enfraquecia o diálogo entre disciplinas.

O corte etário não é científico. Que diferença existe entre a criança nascida em 30 de maio e a nascida no 1º de junho? O instrumento para diminuir a quantidade de vagas é comparável ao Enem, que serve para reduzir a quantidade de vagas na universidade. São dois absurdos!”

E a Ely apontava um possível caminho: 

“A grande aposta é a da implantação de comunidades de aprendizagem, “derrubar muros”, libertar ´professores e alunos da sala de aula, numa aprendizagem de contato direto com a comunidade. 

Além da interação com o entorno, propomos uma nova avaliação, evidências de aprendizagem comprovadas cientificamente. É uma proposta diferente das comunidades de aprendizagem criadas pela Universidade de Barcelona e implementado pela UFSCar.”

Na entrevista, a Ely referia-se a uma das fake news em que a comunicação social desse tempo era fértil. Como essa de São Carlos ser “referência em comunidades de aprendizagem no Brasil”. 

Dessas falsas comunidades vos falarei.

185total visits,1visits today

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Scroll to top