Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCCXVI)

Ipê, 4 de agosto de 2043

Para que não digais que só vos falo de desaires e queixumes, vos ofereço alguns excertos de boas-novas, recebidas nos idos de vinte.

A “profecia” de Agostinho dos anos sessenta tomava forma concreta. Se o Portugal quinhentista havia desembarcado na África, na Ásia e na América, era chegada a vez de Portugal desembarcar em… Portugal. 

A Escola Aberta de São Paulo abria as portas, para acolher educadores sedentos de novas e humanizadoras práticas. A Marta e a Rute foram as primeiras professoras que atravessaram o oceano, para participar de “vivências” numa das escolas de referência de uma nova construção social. Outras “travessias” se seguiriam. 

“Muito bom dia professor! Escrevo-lhe para confirmar que, nos dias 21, 22 e 23 de agosto, estarei na Escola Aberta de São Paulo. Esta oportunidade vem renovar a esperança de voltar a acreditar que é possível fazer evoluir uma comunidade para valores genuínos, de respeito mútuo, aquela que é a base da co-construção de cada projeto de vida, que pela escola/comunidade se cruza.

É muito importante para mim renovar esta esperança, sobretudo porque a maternidade me trouxe não só essa urgência, mas também uma maior consciência do que quero oferecer ao meu filho e, se possível, aos que se cruzam com ele, comigo (connosco), neste lindo caminho que é a vida. 

Um abraço, até breve, Marta.”

“Bom dia, professor! Sou a Rute, professora viva de São João da Madeira. Hoje, terei reunião com a diretora Helena e o representante do centro de formação, o Daniel. A reunião será às 11h, se surgir alguma dúvida no momento, posso contactá-lo?

Professor obrigada por tudo. A turma-piloto segue, já hoje, para a aprovação. Como eu já não tinha dúvidas, fui respondendo a tudo sem problema e com a ajuda do Daniel. A primeira pergunta que a diretora me colocou foi se eu tinha a certeza. Eu respondi que não só tenho a certeza, como estou à espera disto, há anos!”

“Boa tarde, querido professor! Como está? Só para lhe dizer que a nossa turma piloto foi aprovada na escola de Fundo de Vila. 

Próximo passo? Constituição do Núcleo de Projeto. Desenhar a Lista de Valores e uma proposta de termo de autonomia. Não tenho parado de ler, professor. Mas, o mais importante será trabalhar com o coração.”

Voltando a Portugal, estas educadoras operaram profundas transformações nas suas práticas, e não estavam sós. Nas duas margens do Atlântico, centenas de educadores se lhe seguiram o exemplo. Diretores apoiavam iniciativas. Os projetos das escolas eram analisados pelos núcleos de projeto. Eram elaboradas matrizes axiológicas. Cartas de Princípios definiam o rumo dos projetos que assegurariam coerência escrita e prática. Contratos e termos de autonomia eram enviados para a administração educacional, acompanhados de propostas de diálogo. Planos de inovação eram esboçados. 

E, porque Freire dissera que criar o que não existia deveria ser a pretensão de todo sujeito que estivesse vivo, famílias procuravam nas escolas professores que ainda não tivessem morrido. Na génese das comunidades, se deveria priorizar a necessidade da transformação do professor-objeto de formação em professor-sujeito, no contexto de uma equipe de projeto. Uma formação de novo tipo teria início no décimo segundo dia de agosto. 

O empreendimento era grande demais para ser assegurado por uma pequena equipe. Na semana que antecedeu o primeiro encontro virtual de formação, foram criadas as primeiras “assembleias de redes de comunidades de aprendizagem” (ARCA), em regiões onde já havia “projetos de referência”, como o da Escola Aberta. 

 

Por: José Pacheco

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