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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (CXCIV)

Vargem Grande, 21 de agosto de 2040

Voltei à leitura de crônicas publicadas há quase um século por uma poeta, que, pelos seus dezesseis anos, se fez professora. E, se na cartinha anterior evoquei um dos heterônimos pessoanos, nesta eu registro um episódio semelhante àquele que foi protagonizado por Cecília Meireles.

No ano anterior à sua morte, Fernando Pessoa submeteu a concurso a sua obra maior: “Mensagem”. Essa obra prima foi considerada “segunda categoria” pelo júri indicado pela ditadura salazarista. Um obscuro poetastro conquistou a “primeira categoria”. Enquanto isso, Cecília candidatava-se à cátedra de literatura da Escola Normal. Foi preterida, porque a sua tese sobre liberdade individual não agradou ao júri. A subcultura medieval do ditador Salazar, como o submundo do negacionismo, infligiam torpes vinganças àqueles que se rebelavam.

Contemporâneo da Cecília, o pedagogo Celestin Freinet, nos campos de batalha da Primeira Guerra Mundial, tomava consciência de uma das origens do conflito: “os professores foram tão longamente condicionados pela velha pedagogia que permanecem incapazes de se libertarem de práticas de que conhecem, por experiência, os perigos”.

Ao longo de duzentos anos, a “velha pedagogia” havia gestado uma sub-humanidade. Os “perigos da velha escola” se revelavam, ciclicamente, sempre que uma crise do sistema (ou um vírus) colocava no poder políticos com aparência de gente. No mesmo ano em que Freinet lançava o seu aviso, a “velha pedagogia” ajudava a eleger… Adolf Hitler.

Na década de 30, em verso e numa prosa corrosiva, Cecília expressou a sua rebeldia. Nas páginas dos jornais do Rio, pugnou por uma efetiva renovação educacional, ousou romper tabus de uma sociedade moralmente doente, denunciando um regime, que invocava “a Liberdade como sua padroeira, enquanto submetia o povo a “velhas situações de rotina, de cativeiro e de atraso”.

Quase um século decorrido, as crônicas da Cecília ganhavam atualidade. O rumo da educação da “patriazinha que não rimava com mãe gentil” do Vinícius era merecedora do mesmo comentário da Cecília às reformas do Capanema. A poeta e professora pugnava por ”uma reforma de finalidades, de democratização da escola, todas essas coisas que a gente precisa conhecer antes de ser ministro da educação”. Numa prosa mordaz, assim comentou uma formação de professores semelhante àquela que, em 2020, ainda se fazia:

“Que lhes valeu todo o curso que fizeram? Em vão, beberam a caudalosa erudição dos catedráticos imponentes, fizeram provas escritas de inúmeras laudas. Palavras, palavras, palavras, que o vento levou. As aulas de psicologia e pedagogia ficaram geladas nos livros; as outras não levaram em si nenhum gérmen dessas duas, que são indispensáveis a quem vai ser professor. Pobres alunas, que não tiveram quem as orientasse a tempo! Depois de tanto trabalho, terão de fazer, por si mesmas, toda a cultura técnica que ninguém pensou ou lhes pode fornecer no momento devido”.

Cecília contestou uma Escola reprodutora de iniquidades, feita de burocracia e liderança toxica, que perdera todo o sentido. Denunciou uma construção social feita de salas de aula habitadas por solidões, que sobrevivia qual cadáver adiado suportado em projetos paliativos. E colocava em verso o seu apelo: “Vem, retira as algemas dos meus braços, porque a vida só é possível reinventada”.

Cecília bem mereceu os versos que o Manuel Bandeira lhe dedicou: “Cecília, és tão forte e tão frágil / Como a onda ao termo da luta / Mas a onda é água que afoga / Tu és enxuta”.

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (CXCIII)

Teófilo Otoni, 19 de agosto de 2040

Enquanto colocava alguma ordem no caos dos meus arquivos, encontrei o registro de um encontro virtual em que participei, nos idos de vinte. Com o amigo Leonardo e outros extraordinários educadores dos institutos federais mineiros, vivi momentos de escuta e muitas aprendizagens. A audição desse registro suscitou a escrita desta cartinha.

Há uns sessenta anos, o Olivier avisava que aprender, em todos os domínios, era desaprender, mudar de hábitos no mais íntimo do ser humano. Aprender era romper com hábitos que se tornaram uma segunda natureza, abandonar pseudocertezas, afastar “obstáculos epistemológicos” oriundos da tradição e da experiência ingénua. Aprender seria desaprender, recusar as verdades primeiras, os “erros primeiros” do Gaston.

No poema XXIV, Alberto Caeiro dizia-nos ser necessário desaprender. Porque apenas pensar é estar doente dos sentidos. “O essencial é saber ver, saber ver quando se vê, o que exige um estudo profundo, uma aprendizagem de desaprender.”

Urgia incluir nos currículos de formação uma pedagogia da desaprendizagem. Precisávamos reelaborar a nossa cultura pessoal e profissional, “raspar a tinta com que nos embotaram os sentidos”, para ouvir e escutar pedidos silenciosos de alunos, para sentir apelos inauditos e compreender os motivos de um não querer.

O que resta para a Escola ensinar? – perguntava, em 2010, a minha amiga Ely. E logo me vieram à mente os quatro pilares do relatório da UNESCO. Teria a Escola ensinado aquilo que o Jacques Dellors, muitos anos antes, havia recomendado? Os jovens teriam aprendido a conhecer, a fazer, a ser e a conviver?

Aprender a conhecer era algo arredio do universo escolar. Quanto muito, os jovens eram depositários de informação jamais transformada em conhecimento, quase-inutilidades, que apenas serviam para debitar em provas e alcançar um diploma. As escolas deveriam ser espaços de aprendizagem, mas eram espaços de ensinagem. A escola que, infelizmente, tínhamos nos idos de vinte não lograva concretizar os quatro pilares da UNESCO. E nem suspeitava de que havia mais três: o aprender a desaprender, o aprender a desobedecer e o aprender a desaparecer. Nesta cartinha, vos falo do primeiro. Talvez vos fale dos restantes, numa outra.

Dizia o Manoel que aprender era desaprender, para vencer o que nos encerrava, nos alienava, porque “desaprender vinte e quatro horas por dia ensina princípios”. Para o amigo Nóvoa, o centro (e o sentido) da escola era a aprendizagem e as pessoas que a realizavam. Mas, nos anos vinte, carecíamos de desaprender.

A resposta à pergunta da Ely era simples: se a família não ensinava a viver, à Escola restava ensinar tudo… e não conseguia. Até a Clarisse havia dado conta da falência do instrucionismo, expressa numa espécie de autocrítica:

Quando penso que eu dava aulas de matemática e português a ginasianos, mal acredito. Porque hoje seria incapaz de resolver uma raíz quadrada. Quanto a português, era com o maior tédio que eu dava regras de gramática. Depois, felizmente, vim a esquecê-las. É preciso antes saber, depois esquecer. Só então se começa a respirar livremente”.

Há quase meio século, um professor propôs que usássemos a internet de maneira investigativa e criativa. Na sequência e no contexto da pandemia, uma jovem me dizia que tinha tudo aquilo que precisava para estudar. Em casa, na biblioteca, na internet… sem precisar cumprir horário de aula.

Essa jovem tinha compreendido a mensagem de um vírus. Os educadores dos institutos federais mineiros, também.

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (CXCII)

Registro, 18 de agosto de 2040

Quando já tinham passado vários anos sobre o dia em que entreguei um macinho de cartas a uma Alice, que, entretanto, aprendeu a ler e se fez psicóloga, me perguntaram por que escrevia cartas e dicionários.

Esclareci o sentido das passagens mais rebuscadas das cartas e me penitenciei do recurso a vocábulos de código elaborado. Daí em diante, não mais escreveria com nota de pé de página, ou rodapé. Passei a evitar o recurso ao jargão científico porque, não raramente, ele tinha servido para pseudocientistas da educação ocultarem ignorâncias,

Em 2040, as cartas que vos envio são sementeiras de palavras com visibilidade pública, para encurtar o fosso entre saberes e fazeres. Aquelas que, na vossa infância, vos enviei foram as mais difíceis de compor. Escrever para adultos é fácil. Difícil é explicar a uma criança – em linguagem de gente, claro está! – o sem-sentido da Escola que tivemos até aos anos vinte deste século.

Em meados de 2020, convidei alguns amigos, que açoitavam os ancestrais hábitos de uma escola obsoleta, para participar nu projeto de criação de redes de comunidades de aprendizagem. Para uma nova construção social de aprendizagem seria necessária uma nova nomenclatura. E ensaiei a feitura de um glossário. Acumulei tantas e tão díspares explicações, que deliberei anexá-las a um dos meus livrinhos, que dava pelo longo título de “Inovar é Assumir um Compromisso Ético com a Educação”.

Cito de memória apenas um dos verbetes desse glossário, composto numa linguagem que todo mundo entendesse: “Escolas não são prédios; escolas são pessoas aprendendo na intersubjetividade, isto é, umas com as outras, numa relação mediada pelo mundo”. Prometo que, se eu encontrar o velho livrinho sobre inovação, vos enviarei o glossário inteirinho.

As crianças do nosso tempo surpreendem-se quando deparam com um mestre fóssil – ainda os há por aí… – e, respeitosamente, dirigem-lhes perguntas fundadoras de qualquer reflexão sobre a Escola. Perguntas que, em recuados tempos, poucos ousavam fazer, por quase todos se terem esquecido de que também tinham sido crianças, que também haviam passado pela idade dos porquês.

Nessa idade ficastes, porque os vossos professores não vos proibiram de perguntar, ninguém vos destruiu a curiosidade. E ainda fazeis perguntas de bom senso, questionando escolares e arcaicos usos e costumes:

É verdade que, antigamente, as escolas tinham campainhas penduradas nas paredes?

É verdade.

E para que serviam as campainhas?

Como se poderá explicar a um ser inteligente aquilo que não tem explicação? Poderão as crianças de hoje acreditar que, nas escolas de antigamente, alunos e professores andavam a toque de campainha? Será possível que entendam ocultas razões, pelas quais havia um toque para ir para a aula de Matemática, outro toque que mandava ir para a aula de Português, outro que reencaminhava corpos para o recreio?

Pensando em voz alta, murmurei a palavra “aula”. Logo uma criança perguntou:

O que eram “aulas”?

Depois, eu explico… – respondi, tentando ganhar tempo, pois não estava certo de conseguir explicar. Nesse tempo, como hoje, torna-se muito difícil explicar o sentido de velhos artefatos como “aula”, “tempo letivo”, “aula online”, “ensino híbrido” ou “carga horária”.

Está bem, depois tu explicas. Olha que eu não me esqueço! Mas juras que é mesmo verdade que, quando as campainhas tocavam, os meninos tinham de entrar, ou sair, ou chegar, ou ir embora?

É verdade.

Mesmo que não lhes apetecesse ir embora?

Sim. Mesmo que não quisessem ir embora.

 

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (CXCI)

Cananeia, 17 de agosto de 2040

Em meados dos anos setenta, colaborei na organização de uma “feira de livros”. Poucos foram os visitantes e um deles captou a minha atenção, por ter pousado as mãos sobre uma pilha de livros e me perguntar:

“Quanto custam estes livros? Estão encadernados em couro, não estão?”

“Sim, estão, mas você tem as mesmas obras numa publicação mais barata” – respondi. A pessoa fez questão de comprar os livros mais caros:

“Lá em casa, tenho um móvel, onde cabem aí uns vinte centímetros destes livros. São muito bonitos!”

Em 1978, fui eleito coordenador pedagógico de um programa de formação continuada. Nele encontrei um princípio de resposta para a perplexidade sentida no episódio da compra dos livros… mais por intuição do que por referência a um quadro teórico.

Fiz do primeiro momento um encontro de escuta, em grupo. A Ponte havia-me inculcado a prática do trabalho em equipe. Fora eleito pelos professores e era com eles e por eles que qualquer projeto deveria concretizar-se. Procedemos a um levantamento de recursos e detectámos a existência de uma biblioteca escondida numa arrecadação da prefeitura. Jamais havia sido utilizada pelos professores.

Retirados do pó e das teias de aranha, levamo-los para as escolas. Foram úteis, no decurso das pesquisas e os professores descobriram a Montessori, o Freinet, o Dewey e saborearam as obras de escolanovistas, até então ignorados.

Estávamos em 1978. Em novembro desse ano, era publicado o primeiro número do “Projeto”, boletim do recém criado Centro de Documentação Pedagógica. Nesse primeiro boletim, eram muitas as notas de leitura. Os boletins seguintes davam notícia de encontros de tertúlias literárias, e a biblioteca já não conseguia satisfazer todos os pedidos de livros.

Entretanto, o poder público tudo fez ao seu alcance para destruir algo que pressentiam fugir ao seu controle. Resistimos, mas não pudemos evitar a destruição do projeto. Em 1979, a biblioteca foi conferida, fechada e voltou para a arrecadação onde a tínhamos encontrado. Volvidos alguns anos, foi criado o “Programa Interministerial de Promoção do Sucesso Educativo”, de que vos falei numa cartinha anterior a esta. No hiato entre as duas iniciativas ministeriais, a Escola da Ponte voltou a ganhar relevância, reconhecimento de muitas escolas e professores, pelo que me coube, novamente, o papel de coordenar o programa. Eleito, reunida a nova equipe, inventariando recursos, encontramos a mesma biblioteca tal qual a deixamos em 1979: apenas faltavam os dicionários e não havia qualquer registo de requisição, entre 1979 e 1987.

Em 1992, o programa foi extinto. Mas, a biblioteca não voltou para a arrecadação. Ao cabo de muitos meses de burocráticas negociações, a Associação PROF se encarregou de a dinamizar. E muitos professores se fizeram… leitores.

Em 2020, numa entrevista, uma professora protagonista do “Estudo em Casa” – a versão portuguesa do disparate das aulas online brasileiras – assim respondeu, quando o entrevistador lhe perguntou o que andava a ler:

“Não sou muito de leituras. Não sou muito de ler livros, mas sempre adorei tê-los”.

O cenário das aulas televisionadas portuguesas estava emoldurado por estantes carregadas de livros. Entretanto, o desgoverno brasileiro pretendia recriar, agravar o imposto sobre os livros.

Recupero uma denúncia feita por Frei Beto, nesses tempos sombrios:

“Em 1960, uma progressista cidade do interior de São Paulo tinha, seis livrarias e uma academia de ginástica; hoje, tem sessenta academias de ginástica e três livrarias!”

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (CXC)

Alter do Chão, 16 de agosto de 2040

Nos idos de setenta, assim falava a Jacinta:

“Nos projetos, que neste centro foram gerados, impera a alegria e a boniteza freireana. E esse tal “sistema”, que dizem que não permite mudanças… somos nós! Que rigor e que exigência existem num modelo educacional, no qual alunos do século XXI são “ensinados” em aulas do século XIX?”

Já nos anos 20 deste século, eu escutei a mesma pergunta, mas… “atualizada”. E a Jacinta, formadora da Associação PROF, estranhava que, decorrido meio século, ainda houvesse quem ignorasse a existência do princípio do isomorfismo na formação, quem acreditasse que a teoria precedia a prática, quem considerasse o formando como objeto de formação, quando deveria ser tomado como sujeito em autotransformação, no contexto de uma equipe, com um projeto. há vinta anos, prevaleciam práticas carentes de comunicação dialógica, culturas de formação individualistas, de competitividade negativa, das quais estava ausente o trabalho em equipe.

Uma das fundadoras do centro de formaçãoda  PROF escreveu numa avaliação do trabalho em círculo de estudos:

“Temos melhorado o modo de ensinar, mas não combatemos o mal pela raiz. Se deixarmos de reunir, tudo volta ao princípio. A minha vida tem sido difícil na escola. Os quinze anos de trabalho já contam como trinta. Tenho necessidade de parar, para refletir. Não há direito de não nos deixarem trabalhar de maneira difeente. Os professores e gestores que impedem o nosso trabalho deveriam ser castigados. Há valores que falham nas pessoas dos professores. Teremos de mudar o nosso comportamento. Não estou doente. Estou consciente. Como elemento da associação devo falar isto. A associação deve permitir estes desabafos, sem termos medo de que nos considerem malucas. De outra forma, não me interessa continuar a ser professora. Não quero ser controlada por gestores ditadores”.

Em outro encontro de formação, ouvi falar de solidariedade, de senso crítico, de uma cultura feita de uma digna autonomia:

“Uma das coisas que esta associação conseguiu foi a partilha. E se não tivesse havido os ataques que nos fizeram, nem teria tido graça. Ouvia dizer que “eu tinha a mania que era diferente”, mas consegui acabar com a mediocridade. Deixai-me contar isto… Um inspector veio à minha escola e só queria números. Em termos da realidade que ali se vivia, nada! Não se pode admitir! Nós é que sabemos o que é melhor para os alunos! Disse que era superior herárquico. Respondi-lhe com respeito, mas de maneira que ele se foi e não voltou”.

Nesse tempo, resquícios da ditadura ainda se faziam sentir e incutiam insegurança e medo nos professores. Mas, o medo  não era um sentimento que na PROF se cultivasse, como podereis verificar nestes excertos:

“Muitos colegas tiraram um curso para repetir o que lhes meteram na cabeça. Deixam-se manipular por outros. Para que o meu marido me considerasse (o trabalho dele é de fazedor de dinheiro e o meu é mal pago mas faz crescer outros) eu precisei de acreditar em mim em primeiro lugar. O meu marido não respeitava a minha profissão, dizia que era banal e insignificante. Ao fim de vinte e quatro anos de serviço e de vinte como casada, ele dá-me valor. Eu cresci perante o meu marido como pessoa, através da minha profissão.”       

Com esta boa gente passei vinte anos, talvez os mais produtivos da minha vida profissional. Em 2020, as fundadoras da Associação PROF estavam aposentadas, outras haviam falecido. Mas, o seu exemplo de dignidade profissional inspirara e encorajara novas gerações de educadores.

Por: José Pacheco
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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (CLXXXIX)

Campos Belos, 15 de agosto de 2040

Na sua obra “A Educação e o Significado da Vida”, Krishnamurti, diz-nos que “a educação correta começa com o educador, que tem de se compreender a si mesmo e estar liberto de padrões de pensamento”. Eu convivia com educadores supostamente “libertos de padrões de pensamento”, que lhes tinham sido inculcados pela escola da ensinagem. E sofria, por ver que alguns desses educadores, talvez por distraída omissão, estavam mancomunados com um poder público cativo de tais padrões.

Nesse distante agosto, entre os jovens virtualmente “alcançados” pelos seus professores, havia a sensação de que aprenderam muito pouco com as aulas remotas. No ensino à distância, pouco, ou mesmo nada, se aprendia. Só faltava reconhecer que a ensinagem presencial era tão inútil e prejudicial como a ensinagem remota.

Nas discussões sobre a retomada das aulas, era frequente falar-se de ensino híbrido, um famoso paliativo do modelo da instrução. Escolas particulares e redes públicas de ensino usavam essa terminologia para designar a mistura de ensino remoto com o presencial. A Lilian apontava dois principais atributos das interações online: favorecerem que os alunos aprendam em seus tempos e ritmos e a riqueza de dados que este ambiente traz. “No ensino remoto, o aluno tem maior flexibilidade na gestão do seu tempo, podendo voltar ou pausar um vídeo”, como se consumir currículo em vídeo constituísse gestão autônoma. O Cláudio acrescentava: “O ensino híbrido possibilita que se supere aquela visão de que toda a turma precisa estar fazendo exatamente a mesma coisa”, no pressuposto na inevitabilidade da organização em “turma”.

Eu reconhecia nesses jovens capacidade para se libertaram de padrões de pensamento, que lhes tinham sido inculcados pela escola da ensinagem. Por que não se libertavam do obsoleto modelo de ensinagem? Por que não conseguiam pensar fora do “padrão”?

No decurso da pandemia, muitos foram os projetos de efetiva transformação das práticas. Muitos foram, também, os destruídos. Entre os empecilhos da mudança e da inovação, avultava a defesa do modelo da instrução, ainda que disfarçado de invertido, híbrido, ou qualquer outro paliativo. Porém, outros empecilhos nós identificávamos: o “alguém” e o “áulico”.

Do primeiro vos falarei em breve. Era um sinistro personagem, que habitava as catacumbas ministeriais. Não sabíamos se era homem, mulher, se era um indivíduo ou um coletivo. Apenas sentíamos os efeitos destruidores da sua insana atuação. Do segundo personagem vos passarei a falar nas próximas cartinhas. A ação de dissimulados áulicos era tão ou mais destrutiva do que as maldades cometidas pelo “alguém”. Porque os áulicos eram bem conceituados, quase todos doutores em educação, fazedores de opinião.

Todos viajaram “antes do combinado”, como diria o Boldrin. Já não estão entre nós, neste ano da graça de 2040. Espero encontrá-los no lugar etéreo, para onde, em breve, irei. Se, nesse lugar, memória desta vida se consente, embora imagine que não irão acreditar que já não existe “escola da aula”, lhes darei essa notícia. Não para lhes causar desgosto, mas para que saibam que o seu desdém e as torpes críticas dirigidas a educadores que contestavam o instrucionismo não impediram que a mudança e a inovação acontecessem. Para que sintam alguma vergonha da conivência com um poder público intelectualmente corrupto. Para que se arrependam das suas omissões e dos seus obscenos silêncios.

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (CLXXXVIII)

Patos de Minas, 14 de agosto de 2040

Nos idos de vinte, para muitos dos improvisados candidatos à docência, o objetivo era apenas o de conseguir um diploma. Promovidos a “dadores de aulas”, reproduziam o modelo da ensinagem experienciado enquanto alunos, no tempo das aulas de blá, blá, blá e power point.

Um auleiro queixou-se do seu magro salário e pediu-me que lhe “ensinasse o método da Escola da Ponte” (sic). Expliquei-lhe que não se tratava de um método, gastei muitas horas a descrever o modo como trabalhávamos e facultei-lhe dispositivos e documentos por nós utilizados.

Anos depois, encontrei-o num congresso, na qualidade de palestrante. Havia descoberto que a cientificidade poderia ser substituída pela “citabilidade”. Fez doutorado… e já era consultor. Longe ia o tempo do magro salário de professor de escola pública.

No tempo da pandemia, voltei a encontrar consultores educacionais, que industriavam os gestores no “regresso às aulas”. Esses “especialistas” disfarçavam a sua ignorância sofisticando o discurso. Enfeitavam-se de citações e frases de belo efeito. Estavam na moda expressões como “inovação em sala de aula” e “metodologias ativas em sala de aula” – como se fosse possível desenvolver tais metodologias ou inovar em sala de aula!

Os “consultores educacionais eram contratados por escolas privadas, para recuperação de crédito, para saber como lidar com boleto vencido e sair da situação de inadimplência. Havia-os também nas secretarias de educação, na qualidade de assessores, ensinando a gravar videoaulas, a validar aulas remotas, a fazer avaliação à distância – como se aulas remotas servissem para alguma coisa e uma prova virtual fosse avaliação! Enfim!

Legitimadas pelo discurso dos “consultores” as escolas particulares viviam na ilusão de serem “boas escolas”. E as secretarias esbanjavam recursos, pagando “projetos” tão velhos e tão inúteis como aqueles que outros “consultores especialistas” tinham vendido à gestão anterior.

A maioria dos consultores era formada em pedagogia e marketing, pelo que me assaltava uma dúvida: esses “especialistas” agiriam por ignorância, ou intencionalmente? Com mágoa e preocupação, concluí que usavam a ignorância alheia para enriquecer. E, como o assunto não merece mais arengar, vos deixo com uma anedota, que caracteriza esse tipo de “consultor”.

Estava o pastor apascentando o seu rebanho, num verde pasto dos cafundós das Gerais e eis que um carro para na estrada. Dele sai um jovem bem parecido, paletó de executivo, pasta de computador na mão, e dele se aproxima.

Bom dia, doutor! – saudou o pastor – Uai! O que cê faz nesta biboca de Deus? Aqui só passa cata-jeca.

Venho fazer-lhe uma proposta – respondeu o jovem.

Bão, mar bão mermo!

Se eu adivinhar quantos animais você tem no seu rebanho, você me dá uma ovelha?

Combinado. Mas olhe que é difisdemais…

O jovem ligou o computador e instalou uma antena parabólica.

Uai! Cê besta, trem?

É um computador. Tecnologia!

Feitos os cálculos, o jovem disse que o rebanho tinha duzentos e trinta animais.

Certo! – confirmou o pastor – Cê pode pegar uma ovelha.

O jovem assim fez. E, quando se preparava para partir, o pastor assim falou:

Eu sei o que cê mexe com que.

Você disse que sabe qual é o meu trabalho? Foi isso? – replicou o jovem.

Sim. E, se eu acertar na sua profissão, cê devolve-me o animal?

Claro! Mas não vai conseguir. É uma profissão muito nova!

Eu acho que cê é consultor.

Certo. Mas, como soube que eu sou consultor?

Porque cê chegou e eu não o tinha chamado. Disse-me aquilo que eu já sabia. E, entre tantos animais, levou-me… o cachorro.

 

 

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (CLXXXVII)

Primavera do Leste, 13 de agosto de 2040

Há quase cem anos, na cidade de Socorro, as percursoras classes experimentais da Maria Nilde eram sementes do que viria a ser o Vocacional. Em boa hora o Luciano se apercebeu do valor desse projeto e convidou a Nilde para participar da comissão de educadores, que, nos idos de 1960, concebeu esse projeto.

O amigo Lauro afirmou que o Vocacional foi a experiência mais significativa na educação pública brasileira até à década de 1970. Em São Paulo, Americana e Batatais se concretizava a pesquisa, os projetos de intervenção na comunidade, a educação artística, o trabalho em equipe, os estudos sociais, num currículo integrado de escola comunitária. Nilde introduziu a prática da auto avaliação e substituiu notas por conceitos. Na base da construção do currículo estava a realidade social, características culturais e socioeconômicas do lugar.

Em São Paulo, o estudo noturno criou oportunidades para jovens trabalhadores do bairro, a quem a escola tradicional havia negado conhecimento. Mas, o projeto nem uma década durou. Nilde resistiu à “crise de 65”, quando negou a matrícula “ao jeitinho brasileiro” de um filho de funcionário de confiança do secretário de educação. Foi demitida. A mobilização de professores, funcionários e pais de alunos, em assembleias na capital e no interior, forçaram o governo a reconduzi-la no cargo de coordenadora. Porém, à semelhança de projetos destruídos, já no início deste século, os Vocacionais do século passado estavam sujeitos à ameaça, sujeitos à repressão e condenados à extinção.

O “AI-5” impôs limitações. Nilde contestou-as. Policiais e militares invadiram os ginásios vocacionais. Nilde e os seus professores foram presos. A ditadura impôs a sua aposentadoria, crente de que a impediriam de agir. Nilde fundou uma assessoria de projetos, pesquisa e planejamento de ação comunitária e educacional, interveniente na defesa dos direitos humanos e dos perseguidos políticos do regime militar… e voltou à prisão.

Na década de 1970, já professora da PUC, Nilde implantou um programa para mulheres de baixa renda, nas favelas de São Paulo. Essa e outras iniciativas dotaram-na de formação experiencial, que lhe permitiu elaborar uma extraordinária tese de doutorado.

Visitei os lugares dos extintos ginásios vocacionais. Os jardins de sessenta tinham sido substituídos por muros e estacionamento de carros. O que restava dos edifícios tinha janelas ornadas de grades.

Nas minhas deambulações pelo chão das escolas brasileiras, me surpreendia o fato de, nos cursos de pedagogia, não se falar da Nilde e de outros egrégios pedagogos brasileiros. Nunca encontrei um livro de Lauro Lima nas bibliotecas das faculdades de pedagogia. Nunca encontrei professores que conhecessem a estória dos Vocacionais. Por isso, em muitos lugares a recontei.

Em 1999. com o seu desaparecimento da insigne educadora, a memória do projeto se esvaiu. Mas, ressurgiu no distante mês de agosto de 2010. Ex-alunos dos Vocacionais organizaram-se em associação. Acompanhei-os em emocionantes encontros e os recordo com saudade. Eram brasileiros conscientes de que o espaço público da educação ultrapassara a exiguidade das paredes da sala de aula e que essa mutação parecia ser imperceptível para a maioria dos professores. As medidas de política educacional continuavam cativas de vícios institucionais jamais questionados. Nilde questionou!

 

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (CLXXXVI)

Nova Mutum, 12 de agosto de 2040

Em 2020, ainda habitávamos a proto-história da humanidade e disso não nos dávamos conta. No tempo que nos coube em sorte viver, os homens matavam em nome de credos, usurpavam territórios em nome da paz, edificavam tribunais e prisões em nome da justiça. As frágeis instituições do início do século refletiam uma humanização precária. E a instituição Escola não constituía exceção. Fora concebida como berço de oportunidades, mas transformara-se em “berço de desigualdades”.

A política educacional estava condicionada por interferência transnacionais, num projeto de modernidade ainda por cumprir. Aferia-se o estado do sistema através de estudos comparativos, como se fosse possível reduzir a realidade a cifras. Sucediam-se os decretos, os despachos, as portarias. O erário público pagava gongóricos relatórios produzidos por inúteis grupos de trabalho. Acumulavam-se no ministério e nas universidades dispendiosos “estudos”, que não logravam ir além de óbvias “recomendações”.

As leis preconizavam que se deveria assegurar uma formação geral, comum a todos e proporcionar aos alunos experiências que favorecessem a sua maturidade física e socioafetiva. Porém, convivíamos com o “insucesso educativo”, como se essa expressão não fosse, em si mesma, paradoxal. Como poderia a palavra “educativo” ser adjetivo da palavra “insucesso”?

Tratando os “desiguais” como se fossem iguais, “em pé de igualdade”, não apenas se mantinha a desigualdade – durante a pandemia, ela aumentava. Metade dos alunos não eram “alcançados” pelos seus angustiados professores E o cansaço da produção de videoaulas era inútil porque os “alcançados” quase nada aprendiam escutando aula, cumprindo tarefa… uniformizados.

Não fora a dedicação e o anónimo esforço de muitos e bons profissionais da educação, há muito, o neoliberalismo teria extinguido a instituição Escola, como empresa falida. Ainda havia quem resistisse e me confidenciasse vivências, que confirmavam processos de exclusão:

“A tristeza vem, quando me deparo com a realidade das nossas escolas. Por que será que os professores resistem à diferenciação, quando a sua pertinência é tão óbvia?”.

Essa mesma voz me relatou um incidente crítico, que me custou a digerir:

“A colega dá-me licença?” – e, sem aguardar resposta, a “colega” entrou na sala “É o que faz deixar vir para a escola estes marginais lá do bairro! Antigamente, tínhamos uma escola tão bonita!”

A “colega invasora da sala” deu um sonoro par de tapas num dos alunos da fila dos “feios, porcos e maus”. E, na “fila dos bons”, um dos alunos murmurou:

“Tia, não foi esse que partiu o vidro!”

“Não foi? Então, pronto! Já fica com o tapa, para quando fizer besteira!”

Na fila dos burros, onde o “desigual” contemplado com a bofetada vegetava, não havia quem soubesse ler o “quadro da belezura”, onde os alunos “puxa-saco” escreviam os seus nomes, no fim de cada aula. Nem o “quadro da feiura”, onde eram escritos os nomes daqueles que não conseguiam completar as tarefas no tempo pré-estabelecido, ou que as terminavam antes do tempo e usavam o restante em ameno falatório.

Na fila dos “desiguais”, estava o “lixo da escola” – foi a expressão que eu escutei numa escola igualmente desigual, muitos anos atrás – aguardando a hora do intervalo, esperando o fim da aula, desesperando…

Felizmente para os “desiguais”, nem todas as escolas eram “iguais”. E eu continuava a acreditar nos professores e na remissão do “sistema”. Esperançava que, algum dia, a Escola retomaria a sua missão de “berço de oportunidades”.

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (CLXXXV)

Tangará da Serra, 11 de agosto de 2040

No Portugal de 1987, por Resolução da Presidência do Conselho de Ministros, foi criado o Programa Interministerial de Promoção do Sucesso Educativo (PIPSE). Visava reforçar a ação e os meios educativos em zonas prioritárias de intervenção caracterizadas por índices muito elevados de insucesso.

As ações prioritárias incidiram sobre: o reforço dos cuidados de alimentação, a prestação dos cuidados de saúde, prevenção e diagnóstico, o alargamento da cobertura em educação pré-escolar, o fortalecimento da educação especial, o apoio a famílias carenciadas, o fornecimento de materiais escolares, o apoio pedagógico, a Iniciação profissional, entre outras.

O vosso avô foi eleito coordenador desse programa. Sem abandonar a equipe da Escola da Ponte e com outra equipe também constituída por excelentes profissionais, fui trabalhar no chão de outras escolas. Acompanhamos e apoiamos centenas de projetos. Ao cabo de quatro anos de intenso labor, avaliamos internamente o nosso trabalho. Eram relevantes os seus efeitos, tinha acontecido mudança, melhoria dos índices e até inovação. Em 1991, esse programa foi extinto. E não há notícia de ter sido avaliado externamente.

Em 2020, um edital do Programa Nacional de Promoção do Sucesso Escolar (PNPSE) convidava à apresentação de planos de desenvolvimento pessoal, social e comunitário, no âmbito da promoção do sucesso e inclusão educativos. Nesse edital, se repetiam intenções plasmadas no PIPSE de 1987, num lindo, sofisticado discurso, que não disfarçava a pobreza da prática:

“O sucesso e inclusão educativos requerem a garantia de condições para aceder ao currículo (…) devendo a escola ser um instrumento de mitigação das desigualdades socioeducativas, garantindo o acesso ao conhecimento como a chave para a mobilidade social e o êxito educativo de todos e cada um dos alunos e contrariando o absentismo e o abandono. Exige-se uma ação integrada da escola com os demais atores sociais com impacto educativo na comunidade, designadamente, no estreitamento da relação escola-família, da relação entre o aluno e o seu bairro/comunidade (…) que permitem a construção de uma relação diferente com a escola”.

Trinta e três anos depois do PIPSE, o ministério da educação lançava o edital do PNPSE. Apenas mudara uma letra: o I era substituído por um N. Em mais de três décadas, vários programas tinham sido lançados, todos com o mesmo efeito: o N de…nenhum!

Mais uma vez, se “reinventava a roda” da educação, com diferenças, que devo assinalar. O PNPSE de 2020 incidia na relação da escola com a comunidade, no pressuposto de que era preciso levar a comunidade para a escola ou a escola para a comunidade, admitindo que a escola continuaria sendo um prédio isolado da comunidade por muros e portarias. O PIPSE de 1987 transformava escolas em espaços de efetiva aprendizagem e em locus de encontro da comunidade a que pertencia. Enquanto o PIPSE, que coordenei, acabou com escolas da aula, melhorando a aprendizagem, produzindo efetiva inovação, o PNPSE pretendia dar “combate ao insucesso escolar… na sala de aula”.

Em 2020, ainda havia quem pensasse ser possível “inovar em sala de aula”. Ainda havia cabeças entre duas orelhas surdas aos avisos que um vírus lançava. Hoje, sabemos que o PNPSE não passou de mais uma inútil iniciativa ministerial. Mas, em 2020, houve quem acreditasse nas virtudes do programa e a ele aderisse. Impotente para deter mais essa ministerial besteira, restou-me pedir a Deus que os perdoasse.

 

Por: José Pacheco

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