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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCLXXXV)

Niterói, 4 de julho de 2043

“Adaptar as escolas não seria suficiente; era preciso transformá-las.” Com esta sentença encerrei a cartinha de ontem. Hoje, pretendo retomar parte do conteúdo do manifesto dos jesuítas da Catalunha. Eles sabiam que de nada valeria tentar remendar um sistema de ensino obsoleto. Urgia substituí-lo, gradual e prudentemente, por novas construções sociais, por um sistema de… aprendizagem. 

Despontava uma nova visão de mundo, a busca da cura das chagas de uma sociedade doente. Consumava-se a humanização numa nova educação. Dispositivos primordiais foram instituídos. Os seus autores deram-lhes o nome de “círculos de aprendizagem”. Deles vos farei uma descrição fundamentada. Agora, vos deixarei com os extraordinários educadores jesuítas da Catalunha:

“A Fundação iniciou em 2009 um processo participativo chamado Horizonte 2020 (em catalão, Horitzó 2020) com o objetivo de propor debates sobre como deveria ser a escola ideal para enfrentar os desafios do século 21. Mais de 13 mil pessoas relacionadas direta ou indiretamente à rede de escolas jesuítas foram convidadas a participar, entre elas alunos, pais, professores, diretores, gestores, empresários, funcionários de instituições, políticos e membros da Igreja. Nas atividades propostas, o grupo foi incitado a refletir sobre três questões fundamentais: 

Que escola queremos? 

Que futuro desejamos? 

Como deve ser a escola em 2020?

Em um primeiro momento, os participantes foram orientados a pensar exclusivamente no futuro que desejavam, deixando de lado o “como” fazê-lo. A ênfase estava em explorar o sonho e a imaginação de cada um dos envolvidos para que pudessem surgir ideias sem limitações. De acordo com a Fundação, o objetivo era que, ao final desse processo, fosse construído coletivamente um Ratio Studiorum do século 21.”

Por essa altura, as escolas ditas públicas desconheciam por completo a existência de uma proposta de Ratio Studiorum do século 21, bem como a do século 16. As escolas ditas alternativas pecavam por não atualizar as propostas de Steiner, de Dewey, de Montessori, de Freinet.

O Modelo Pedagógico jesuítico estava baseado em “onze pilares: equipe docente integrada, criativa e inovadora; alunos protagonistas; espaços flexíveis e dinâmicos; participação das famílias; recursos digitais; tempo flexível; avaliação dinâmica; metodologia diversa; estimulação precoce das inteligências; contato com o inglês e integração de valores. 

De todos os pontos, o de maior destaque foi a necessidade de substituir os espaços antigos por outros, mais acolhedores e motivadores, com a intenção de desenvolver projetos globais e diversos para a estimulação das inteligências múltiplas.

O uso do tempo foi igualmente reformulado. Sem horários fixos, os alunos passaram a desenvolver atividades debatidas no início da manhã, com avaliação ao final da jornada. O recreio tampouco ficou com um horário estabelecido: os estudantes passaram a decidir quando sair, de acordo com o momento em que consideravam necessário. Os deveres de casa também não existem. Os alunos passaram a ser estimulados a pesquisar temas relacionados aos projetos.”

E o amigo Pepe comentava:

“Como a intenção não é vincular a aprendizagem à realização de provas, eles estão mais atentos ao que fazem e têm a capacidade de explicar como e por que realizam determinadas atividades.”

Na Catalunha da primeira década deste século, eram desenvolvidas práticas do século 21. No Brasil e no Portugal da terceira década, as escolas desenvolviam práticas do século 16. 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCLXXXIV)

Silveiras, 3 de julho de 2043

Estávamos no agosto de 2015 e a notícia rezava assim:

“Escolas jesuítas da Catalunha apostam na renovação do modelo pedagógico para se adaptar aos novos tempos. Experiências espanholas mostram como pensam os jesuítas do século XXI”. Na mesma Ibéria católica, que havia engendrado o modelo de ensino, durante séculos, praticado pela Companhia de Jesus, o modelo era questionado. 

Mostrastes surpresa, por terdes verificado que, com algumas “nuances”, a jesuítica Ratio Studiorum de 1552 pontificava em pleno século XXI. Maior surpresa tereis com a notícia, que aqui vos deixo, uma notícia que, nos idos de vinte, não havia chegado ao conhecimento da maioria dos educadores. Era lamentável que a formação de professores não os dotasse com conhecimentos mínimos de História da Educação. 

Mais grave ainda era o fato de, não possuindo esse e outras áreas de conhecimento das ciências da educação, os professores não saberem explicar por que faziam aquilo que faziam. Um médico sabia por que usava um estetoscópio. O pedreiro sabia por que usava o fio de prumo… 

E o que dizer do conhecimento da lei? Foram muitas as vezes que escutei professores dizendo:

“A lei não permite.”

Perguntava pela lei. Não sabiam o que responder. A lei e as ciências da educação tudo permitiam… exceto aquilo que a maioria das escolas fazia.

Sempre que os funcionários do ministério pretendiam impor o meu regresso à sala de aula, perguntava-lhes por que deveria fazê-lo. E lhes dizia que, enquanto profissional do mesmo ofício não aceitaria respostas “achistas”, ou sem fundamento legal e científico.

Eu até não tinha lido muito, mas lido o suficiente para deixar os “superiores hierárquicos” sem saber o que responde os seus “inferiores”. 

Um inspetor, desistindo de me apoquentar, exigiu que eu fundamentasse a minha prática. Já não me recordo dos nomes que lhe apresentei. Hoje, lhe daria um longo rol:

Lauro de Oliveira Lima, Piaget e Vygotsky, da Psicologia da Educação; Agostinho da Silva e Edgar Morin, da Filosofia da Educação; Pedro Demo e Florestan Fernandes, da Sociologia da Educação; Lawrence Stenhouse e Celso Vasconcelos, do Desenvolvimento Curricular; Paulo Freire e Humberto Maturana, da Epistemologia; Simon Papert e Castells, das Tecnologias de Informação e Comunicação; Darcy Ribeiro, da Política Educacional; António Damásio, das Neurociências; Nise da Silveira, da Psiquiatria; Carl Rogers, da Psicanálise; António Nóvoa, da História da Educação; Anísio Teixeira, Freinet, Montessori, Steiner, Dewey, Kilpatrick, Nilde, Decroly e outros educadores escolanovistas.

O inspetor quis saber o que diziam esses autores. Com todo o respeito devido a um “superior hierárquico”, respondi-lhe que os lesse. Era só o que faltava! Ensinar o padre nosso ao vigário? Certo é que os inspetores eram cientificamente ignorantes. E os professores não aproveitavam essa fragilidade.

Regressemos à boa notícia provinda da Catalunha:

“Repensar a escola requer uma postura flexível, autocrítica e aberta às possibilidades de entender a educação a partir de diferentes pontos de vista. 

Imbuídos desse espírito, diretores da Fundação Jesuítas Educação lideraram um processo de reformulação do modelo pedagógico, até então adotado. 

O que motivou a iniciativa foi o reconhecimento da defasagem do sistema, incompatível com as novas maneiras de ter acesso ao conhecimento e de transmiti-lo, com as novas necessidades profissionais e com a complexidade da realidade atual. 

Adaptar as escolas não seria suficiente; era preciso transformá-las.”

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCLXXXIII)

Pitamariça de Baixo, 2 de julho de 2043

Na “sincronicidade” das coincidências dos inícios do Verão português e do Inverno brasileiro de vinte e três, decisões decisivas (e não é pleonasmo…) foram tomadas. Das consequências vos falarei mais adiante. 

Algo inusitado acontecera. Não encontrava explicação plausível para certos fenômenos. E os desfechos não seriam explicados racionalmente, tinham mãozinha do esotérico. 

Enfim! Entre julho e agosto, uma “ARCA” seria constituída, juntando a boa-vontade e a perícia de boa gente nas duas margens do oceano. E, durante esses dois meses, nos encontros das quartas e dos sábados conversaríamos sobre o “quanto baste” de fundamentação teórica do projeto das novas construções socias de aprendizagem e de educação.

Setembro marcaria o reinício do projeto, o voltar a uma formação concomitante com a mudança. Era o primeiro dia do resto das nossas vidas de profissionais de um desenvolvimento humano humanizador, do exercício da solidariedade a partir de dificuldades e obstáculos encontados, pois qualquer dia seria um bom dia para recomeçar, mais uma oportunidade de tomar uma decisão ética. 

Hoje, continuarei a descrição da origem remota (embora a mais remota se situe na Antiguidade Clássica) do velho modelo de ensino. Nos colégios seiscentistas, era comum a prática de denúncia ou delação. Era permitido e estimulado denunciar ao Principal as faltas cometidas por colegas. Os alunos estavam divididos em grupos comandados por um decurião e a distribuição dos alunos, por ordem de mérito, estava relacionada com a divisão desta em várias decúrias.

O ensino praticado nas Universidades foi adotado nos Colégios, em regime de internato, sujeito a horários e regulamentos precisos. 

Herdeiro da escolástica, o modus parisiensis adotava a lectio e momentos de disputatio. As vitórias davam direito a prémios, louvores e condecorações. Nas repetitiones, os alunos repetiam as lições ouvidas ao professor. Eram aplicados castigos corporais, corrigindo faltas disciplinares e, também… como incentivo aos estudos. 

Em 1552, a Ratio Studiorum passaria a uniformizar o funcionamento dos Colégios. E, em 1599, foi publicada a edição definitiva da Ratio Studiorum, o modelo de ensino praticado durante séculos pela Companhia de Jesus. As quatrocentas e sessenta e seis regras, que a compunham, abordavam temas como: formação dos professores, relações com os pais dos alunos, manuais de ensino, metodologias, plano de estudos de humanidades, filosofia, história, ciências físicas e matemáticas, orientações pedagógicas, regime de avaliação, regras administrativas e disciplinares, prémios e castigos. 

Ao longo dos séculos, com uma acentuada degradação da Ratio Studiorum, a velha escola já nem conteúdos conseguia transmitir. As adaptações operadas na velha proposta jesuíta foi desvirtuada – no século XXI, poder-se-á aceitar, por exemplo, a reprovação de alunos com 100% de assiduidade? 

Pedia-se à escola “educação financeira e para o consumo, pedia-se que educasse para para a saúde, mas ela engendrava inadimplentes e alunos com obesidade mórbida. Pedia-se que houvesse educação sexual, e alunas eram estupradas em “trotes”, dentro das universidades. Falava-se de autonomia, e os professores cativos de uma platônica caverna, para onde uma “formação” deformadora os atirarau, semeavam heteronomia em sala de aula. Compeiae-lhe “educar para a cidadania”, mas era imposto o voto obrigatório,. Naturalizava-se a violência, num país onde se matava professores e alunos, dentro das escolas.

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCLXXXII)

Vale de Ansa, no primeiro dia de julho de 2043

O autor do livro “Why Don’t Students Like School?” afirmava:

“Aprendemos mais sobre o cérebro humano nos últimos vinte e cinco anos do que nos dois mil e quinhentos anteriores.”

Isso significa que, nos idos de vinte, deveríamos dispor de conhecimento suficiente para melhor ensinar e aprender. Na verdade, tínhamo-lo, mas não o praticávamos. Se o conservantismo tardio tentava “tornar as aulas mais cativantes”, o alternativo roussoneano acreditava que bastaria deixar a criança descobrir as coisas por si mesma. 

O obsoleto condutismo e o ingénuo não-diretivismo ignoravam que a criança não fazia aquilo queria, mas que queria aquilo que fazia.

Nos anos setenta, resolvi fazer uma experiência não-diretiva radical. Fiquei fora da sala de aula, enquanto os meus alunos, dentro dela, aprendiam do modo que eu considerava ser “autónomo”. Na década seguinte, repetiria a experiência, para nunca mais a fazer. Um sem-fim de dispositivos “substituía” o professor. Nada de autónomo ali havia. Compreendemos que o exercício da autonomia não era aprendizagem individual, era uma prática relacional. Compreendemos que a aprendizagem acontece na relação, no estabelecimento de vínculos.

No dizer de Freire, “o sujeito que se abre ao mundo e aos outros inaugura com seu gesto a relação dialógica”. E a Cláudia reencontra Freire, quando escreve na sua tese de doutoramento: 

“Nuno é como as demais crianças da Ponte, que desde cedo são encorajadas a inaugurarem o diálogo, apreendendo a importância de compreender “o que fazem e por que fazem (…) não há relação, quando o professor tem que interagir com mais de uma dúzia de alunos. Inegavelmente, com escolas e salas superlotadas abrem-se os caminhos para a exclusão.”

Nos dicionários diz-se que respeito é “sentimento que leva alguém a tratar outrem com grande atenção, profunda deferência; consideração, reverência”. Partindo dos pressupostos ilustrados por Agostinho em “Sanderson e a Escola de Oundle”, a convivencialidade marcada pela preocupação com os outros, tinha em si impressa a marca do amor: 

“Não há para o espírito do homem, ou no espírito do homem, nada que não seja relação. O que acontece é que chamamos desordem à ordem que nos não agrada, ao conjunto de relações em que não entendemos ou não aceitamos a relação connosco.”

Para melhor entenderdes, a raíz dos equívocos e fundamentalismos pedagógicos, nas próximas cartinhas, pretendo falar-vos da origem dos paradigmas da instrução, da aprendizagem e da comunicação. Tarde, mas ainda a tempo, cheguei à conclusão de que a aprendizagem não estava centrada no professor, nem no aluno, mas na relação. E que, ao invés de refutar propostas de qualquer dos paradigmas, dever-se-ia integrá-las. 

O instrucionismo, que correspondera a necessidades sociais do século XVIII e XIX, jamais deveria ser praticado em pleno século XXI, mas continuava hegemónico, obsoleto e sem fundamento científico. Filosoficamente, remontava ao século XVII, mas a proposta de Comenius tinha sido antecedida pela escola jesuíta. 

No “modus parisiensis”, como foi chamado, os alunos distribuídos por classes, instados a exercícios escolares constantes, sujeitos a um regime de incentivos ao trabalho escolar e “à união da piedade e dos bons costumes com as letras”. Imperava a ordem, a rapidez e a disciplina. 

Em 1509, no Colégio de Montaigu crê-se que, pela primeira, vigorou a divisão dos alunos em classes. Cada disciplina era segmentada em níveis, sete classes de Gramática organizadas numa complexidade crescente.

(continua)

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCLXXXI)

Santo Aleixo, 30 de junho de 2043

Netos queridos, como já vos disse, quando decidi trocar a engenharia pela educação, eu sabia de eletrotecnia, mas não sabia que não sabia ser professor. Eu sabia dar aula (embora não soubesse por que durava 50 minutos9. Impunha (porque me impunham) o ritmo do trimestre, e do ano letivo. Aplicava testes, dava “positivas e negativas”. Classificava, sabia aprovar e reprovar. Não sabia que não sabia avaliar. 

Eu sabia dar aula, à semelhança do titular de um qualquer curso, que enveredava pela profissão de professor. E dava aula da melhor maneira possível, guiado pela intuição pedagógica e pelo “quanto baste” de vingativas intenções.

Sim, vingativas. Não sei se já vos disse o porquê dessa opção. 

Se não vos disse, aqui vai. Salvo “in extremis” de morrer antes dos trinta (um dia destes, vos contarei essa estória), quando me perguntavam por que quis ser professor, eu respondia que, quando decidimos ser professor, o fazemos por amor ou por vingança. Fui por vingança, para vingar a sorte daqueles que não saíram da Ilha dos Tigres, que sofreram miseráveis padecimentos e morreram sem que florescessem os seus talentos.

Certo é que não conseguia vingar-me. Eu dava aula bem dada, mas havia, sempre, alunos que não aprendiam. Mais tarde, compreendi que, se eu dava aula e eles não aprendiam, eles não aprendiam porque eu dava aula. Pois é! Mas eu só sabia dar aula. E adiava a “vingança”.

Pensei em abandonar a profissão, em voltar para a engenharia. Não poderia continuar dando aula, sabendo que não conseguiria assegurar a todos o direito à educação. Tomei consciência de que, dando aula, incorria na prática de “abandono intelectual”. Eu sei que é duro afirmá-lo. E longe de mim responsabilizar os meus colegas professores por esse indício de delituosa prática. A culpa morreria solteira…

O resto já o sabeis. Assumi um compromisso ético, me integrei em movimentos de renovação pedagógica. Operamos coerentes transições paradigmáticas, até que atinamos com algo impensável, até então. Operar ruturas (e até duplas ruturas) de nada servia. Necessário se mostrava, juntar aquilo que cada paradigma propunha, para integrar a pedagogia com a antropagogia – Religar!

A inovação tomava o lugar dos paliativos de um velho modelo educacional e a ética se libertava de discursos bem-intencionados, fertilizando novas práticas. Compreendemos que de nada valia tentar melhorar o sistema de ensino. E, já em pleno século XXI, partimos da sala de aula, para conceber um sistema de aprendizagem – os círculos e as comunidades de aprendizagem. 

Revisitamos o que, nos anos oitenta, nos levara a repensar o sistema de ensinagem, aconteceu um reencontro com a obra de Agostinho da Silva. 

No final do encontro de Montemor, um evento que se transformou num divisor de águas, uma jovem professora de oitenta anos de idade me interpelou:

“Quando você disse “Quando eu era professor”, eu vi Agostinho no palco, junto convosco. Até fiz uma anotação no meu caderninho de memórias. Era isso o que Agostinho dizia perto do final da sua vida. E tinha mesmo sido professor. Sabe porquê?”

Eu sabia. E a Julieta vira Agostinho no palco. Ele estava ali, entre nós, dizendo:

“Acho que o ideal é que ele [o ser humano] vá pensando, vá construindo o seu próprio sistema e, se um dia puder chegar a não construir sistema nenhum, ainda melhor. Porque os sistemas prendem gente”

Até amanhã, netos queridos! Ficai com a poesia de um sábio humilde:

“Lembrei-me agora de um título

Que, pois raro, o céu me assuma

Ser também honoris causa

De coisa alguma”

(Agostinho da Silva, Quadras Inéditas)

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCLXXX)

Torre da Gadanha, 29 de junho de 2043

Precisamente, há vinte anos, se fechou um ciclo de vida caraterizado pela adesão a múltiplas tentativas de reforma, desde finais da década de sessenta. Abortada a do ministro Veiga Simão, com a abertura democrática e animado pelo “espírito de abril”, em 75, fui coordenador de uma equipe de “animação pedagógica”. 

No ano seguinte (se não me falha a memória) ajudei a compor o “Programa de Capa Laranja”, o primeiro dos currículos, pós-revolução. E aceitei participar como formador na chamada “Coordenação Pedagógica. Sempre com o mesmo espírito de serviço, fiz parte da equipe que concebeu o “Programa de Capa Verde”. 

Em 1977, formador para os “Novos Programas”, ajudei escolas a elaborar os seus “projetos pedagógicos”. Constatei que os currículos eram conhecidos apenas pela cor das capas. Os professores não os tinham lido e copiavam “projetos” de outras escolas, para os apresentar aos inspetores como se fossem seus. 

Nesse faz-de-conta, como em muitos outros simulacros de reforma, se hipotecou a dignificação do profissional desenvolvimento humano, se perdeu mais uma oportunidade de elevar o estatuto social da profissão de professor.

Em 1978, era publicado o primeiro número do “Projeto”, boletim do recém-criado Centro de Documentação Pedagógica. Eram muitas as notas de leitura e os boletins seguintes davam notícia de encontros de tertúlias literárias. Apoiamos centenas de outros projetos e concebemos a “Associação PROF”, que, em 1992, criaria o primeiro centro de formação contínua.

Em 1987, foi eleito coordenador concelhio do Programa Interministerial de Promoção do Sucesso Educativo (PIPSE), que visava reforçar a ação e os meios educativos em zonas prioritárias de intervenção caracterizadas por índices muito elevados de insucesso. 

As ações prioritárias incidiram sobre: o reforço dos cuidados de alimentação, a prestação dos cuidados de saúde, prevenção e diagnóstico, o alargamento da cobertura em educação pré-escolar, o fortalecimento da educação especial, o apoio a famílias carenciadas, o apoio pedagógico, a Iniciação profissional, entre outras. 

Em 1991, o programa foi extinto. E, em 2020, um edital do Programa Nacional de Promoção do Sucesso Escolar (PNPSE) repetia intenções plasmadas no PIPSE de 1987, num sofisticado discurso, que não disfarçava a pobreza da prática. Trinta anos depois do PIPSE, o ministério da educação apenas mudara uma letra: o I era substituído por um N. 

Sem abandonar a equipe da Ponte, jamais saindo do chão da escola, participei em todos os projetos reformadores, voluntária, gratuita e… entusiasticamente.

Em mais de três décadas, muitas réplicas de antigos programas e projetos tinham sido lançadas, todas com efeito nulo. Por exemplo, na década de noventa, o projeto de “Gestão Flexível do Currículo”. Acompanhei todo o processo e li o relatório que, com esmero, o Vítor fez. O relatório de avaliação apontava para a necessidade de rever o modelo de ensinagem. 

Nessa altura, eu era membro do Conselho Nacional de Educação. E fui autor de um Parecer sobre uma proposta de lei de “Reorganização Curricular”. Nele evidenciei a necessidade de rever o “modelo de ensinagem”. Já então, era urgente conceber um modelo alternativo ao que herdáramos da Prússia Militar. 

Vinte anos depois, o ministério lançou o projeto “Autonomia e Flexibilização Curricular”. O relatório de avaliação desse projeto era semelhante a uma réplica do relatório dos anos noventa. Apenas acrescentava um absurdo a que chamaram “inovação”: passar de trimestre para semestre.

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCLXXIX)

São Cristóvão, 28 de junho de 2043

Na véspera do 27 de junho de há vinte anos, a Caetana me ligou, dizendo ter descoberto um professor que ainda não tinha morrido. Na manhã seguinte, bem cedo, que a tarde seria de mais de 40 graus, com a Cristina, a Maria e o Leandro, abalei para São Cristóvão, ao encontro do Nuno e dos seus jovens alunos. 

O Nuno explicou a opção por aquele lugar. E, se a Lei de Bases propunha que o professor residisse na comunidade onde exercesse o seu múnus profissional, o Nuno estava a pensar ficar por lá. Tinha passado por escolas-presídios, na região de Lisboa, e até tinha pensado em desistir de continuar professor. Felizmente, ainda estava vivo.

Apresentou-nos os seus alunos, um a um. O Rafael, um exímio domador de cavalos. O André, um promissor rapper. A Alice, de quem diziam ser mentirosa, mas que apenas era imaginativa. Nas paredes, pinturas feitas pelas crianças. No ambiente, a proverbial amorosidade alentejana.

Os “finalistas” do quarto ano só falavam de despedidas. No ano seguinte, deveriam viajar, diariamente, quarenta quilómetros para ir fazer o quinto ano na sede do município.

“Porquê?” – perguntei – “Por que terão de ir para a sede do município? O que irão aprender por lá que não possam aprender aqui?”

“Nada” – foi a resposta.

“Então…?”

A aldeia dispunha de uma seleta equipe de formadores: a Dona Joaquina, que sabia usar ervas medicinais, e outros “especialistas em saberes locais”, habitantes habilitados com tecnologias sociais ajustadas ao meio, professores aposentados, que desejavam continuar a ensinar… Até o Leandro, professor de música, colocou a hipótese de ir para lá morar.

Então, por que carga de água as crianças seriam forçadas a viajar?

“Aqui, é só até ao quarto ano. Já foi até ao sexto. Mas, agora, só podem ficar até ao quarto. No próximo ano letivo, terão de ir para Montemor.”

“Quarto ano”, “quinto ano”, “sexto ano”, a costumeira segmentação cartesiana. Sendo a escolaridade organizada em “ciclo”, de ciclo quase não se falava. 

O Rafael disse que preferia ficar com os amigos. E eu perguntei a professores e a gestores por que razão teria o Rafael de sair da sua terra? Por que não ficavam ali os alunos do segundo e terceiro ciclo? E os do Secundário? E até os universitários! 

Se, ao longo do ano letivo, precisassem de ir ao “centro de interpretação” ou a uma sessão de teatro, o “transporte escolar” os levaria. A propósito: escrevi “ano letivo”, mas por que havia “ano letivo”? A inteligência parava de funcionar em junho e voltava a funcionar em setembro?

O amigo Matias me enviara um texto produzido, em dezembro de 2016, por um “aluno triste do 9º ano”. Tinha por título “The dark side of de moon”.

“Até ao 8º ano, era um aluno que passava sempre com uma ou zero negativas. A primeira vez que reprovei foi no oitavo, com 4 negativas, foi a partir daí que comecei a ficar sem um bocado de interesse. 

Mas, na segunda vez no 8º ano, lá consegui passar. 

No ano a seguir, a primeira vez no 9º ano. Reprovei outra vez por culpa minha, porque não queria saber da escola, reprovei com sete negativas. 

Agora é a segunda vez no 9º ano. Entrei bem o período com interesse nas disciplinas, mas agora já estou a perder um bocado o interesse nas disciplinas. Quando começar o 2º período, vai começar muito diferente de como acabou o 1º período. O que me levou a ficar sem interesse pela escola foi por alguns professores do ano passado, que estavam sempre a reclamar comigo. E também estava desanimado, por causa de já ter reprovado uma vez.”

No dia seguinte à nossa ida a São Cristóvão, aconteceria uma “mutação genética” do sistema. Amanhã, disso vos falarei.

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCLXXVIII)

Amendoeira, 27 de junho de 2043

No início deste século, se vaticinava o fim da espécie, daqui a cerca de cinquenta anos. Não creio que tal aconteça. Mas, à cautela, fomos fazendo a nossa parte, no reino da educação, contribuindo para criar uma construção social de aprendizagem, que substituísse a velha construção parida na Prússia militar do século XVIII e que, por pouco (felizmente!), não cumpriu o seu fatal destino.

Durante meio século, fazendo a minha parte, atravessei o oceano, vezes sem conta. Recordo-me de, no final do périplo de vinte e três, me terem perguntado se eu iria mesmo parar de viajar. Respondi que iria tentar reduzir ao mínimo possível a minha andarilhagem. 

Por finais de junho, partira de Milfontes para o Freixo, na companhia da Tânia e da Ariane, uma aliança luso-brasileira, que, nos anos seguintes, protegeriam o Pedro, a Inês e o Valentim das agruras das salas de aula. Para trás ficavam mais de meia centena de lugares e uma nova geração de projetos. Hoje, revi um vídeo desse tempo. Nele, um amigo me interpelava.

“Então, ficará por cá?”

“Também ficarei por cá. Em setembro, voltarei Portugal. Mas, continuarei a viver no Brasil.” 

“E o que fará, quando voltar à pátria?”

“Trarei notícias da mátria Brasil, da terra que adotou o Mestre Agostinho e onde ele criou a primeira comunidade de que há memória.”

“E o que fará, entretanto? Continuará a acompanhar o projeto das comunidades?”

“Certamente. Mesmo longe, estarei por perto. “

“E o que fará, tão longe desta terra e dos projetos que por cá deixou?”

“É certo e sabido que a Internet tem contribuído para aumentar a solidão das pessoas e para desumanizar, ainda mais, a educação que cá se faz. Mas a Internet também pode ser um instrumento de humanização, bem usado pela A.R.C.A.”

Netos queridos, em outra cartinha vos direi o que foi a ARCA. Por agora, vos direi que, durante essas viagens, ajudei muitas famílias a reivindicar uma nova educação para os seus filhos. A sociedade despertava para uma realidade até então oculta sob um manto diáfano de fantasia. Sonhos viravam realidade acreditávamos ter “chegado a hora”. Apressei-me a enviar a uma Alma Gentil a boa notícia recebida do Adrian e da Raquel:

“Conseguimos abrir turma piloto com a Professora Rute! A Rute está entusiasmada e a diretora está contente por avançarmos.

Obrigado por tudo o que fez por nós e por nos guiar, nestas últimas semanas. Fez-nos não desistir e continuar a lutar. Em menos de um mês, estivemos juntos pela primeira vez e tudo mudou na nossa vida. Conseguimos juntar uma comunidade de pais interessados e uma professora viva, em apenas três dias. Agora, temos uma Professora viva e uma diretora alinhada.

Soubemos que já esteve nessa escola, há uns anos, e que até existe um livro sobre uma entrevista que fez lá. 

Um muito obrigado nosso! Um forte abraço!”

Nesse mesmo dia, já perto do fim da viagem a Portugal, a Cristina e a Caetana encontravam, em São Cristóvão, mais um professor vivo. Para lá fomos, no dia seguinte. No Portugal de 2023 se concretizava a “profecia”, que Agostinho deixara no Brasil de 1964:

“Nas chamas se consumirão hierarquias e autocratas; o que esperamos que surja é o lugar de educação e de vida para adultos e para crianças, em que o criar vá muito além do saber e lhe seja este puro servo, em que a liberdade crie sua própria disciplina; que das máquinas de fabricar adultos nem as ruínas sobrem; que a criança cresça harmoniosamente e livremente, sem as deformações que lhe infligimos, na vida que lhe fabricámos; que seja perfeita, na perfeição de suas conscientes intenções, não na perfeição do modelo que lhe demos”.

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCLXXVII)

Foros de Vale Figueira, 26 de junho de 2043

Neste mesmo dia, mas de há vinte anos, uma jornalista portuguesa publicou um artigo com o título: “Exames nacionais: vamos tirar a pressão”.

“Joana está a estudar para os exames nacionais do secundário. Está confiante, na última prova teve 20 valores (numa escala de 0 a 20). Ao seu lado, o telemóvel toca, é uma notificação: os rankings!

“Em que lugar ficou a minha escola?”

Procura a sua escola que, habitualmente fica em boa posição. Confirma-o com um sorriso, mas este desaparece quando encontra a nota de MACS. 

“Como é que é possível?”

De semblante carregado e lápis na mão, Joana começa a comparar a sua nota interna, aquela com que vai a exame, olha para a média da disciplina a nível nacional e a média da cadeira na sua escola (mais baixa que a nacional). 

“Isto não bate certo… Se calhar a minha nota interna não corresponde ao que eu sei, se calhar acho que estou bem preparada para o exame, mas não estou… Se calhar sei menos, comparativamente à média nacional… Como é que a média da escola foi tão baixa?”

Joana não aguenta e liga à mãe, quase em pânico…”

Voltarei ao artigo da Bárbara Wong (a jornalista). Mas, por agora, me quedarei pelo comentário a um vídeo que, também nesse dia – não seria poer acaso que haveria acasos… – e que, de algum modo esclarece a situação de “pânico” que se vivia em vésperas de exame de acesso à universidade.

Na outra margem do Atlântico, o Vítor, eminente professor universitário foi convidado para uma audiência na câmara dos deputados e começou por dizer: 

“No Brasil, está se fazendo aquilo que se deve fazer em educação. Estamos a formar pessoas para passar de ano, para ter um diploma. Que passem no SAEB, essa coisa horrenda, ou num ENEM, que não mede absolutamente nada.

Temos milhões de pessoas que sabem ler e escrever e que não leem nem escrevem. A pesquisa diz-nos que temos 65% de analfabetos funcionais. São analfabetos com diploma”.

O Vítor citava uma obra chamada de “VIDA E MORTE DO GRANDE SISTEMA ESCOLAR AMERICANO”, de que espero poder falar-vos amanhã, e concluía:

“A nossa escola está atrasada, pelo menos, cem anos. As ciências da educação não estão aplicadas na educação”.

Pois não. E o obsceno silêncio dos cientistas da educação perante a triste situação me fazia sentir vergonha

Para quem não saiba, o ENEM era a prova de acesso do “ensino inferior” ao “ensino superior”. O insigne professor e hábil pesquisador autor dessas frases denunciava a farsa dos exames e referia-se á importação de um modelo educacional oriundo do Estados Unidos.

No Brasil, o novo governo optara pela “sobralização” do ministério da educação, modismo norte-americano, exemplo típico de neocolonização que, ao longo de um mandato, apenas contribuiu para a mercantilização da escola pública. 

Em Portugal, usava-se o provérbio “da Espanha, nem bons ventos nem bons casamentos”. Se, no Brasil, nem “bons ventos”, nem algo inovador chegava dos anglo-saxônicos, certo é que, também em Portugal, não se estava “fazendo aquilo que se deveria fazer em educação”. 

A Lei de Bases não era cumprida. Os projetos educativos das escolas e os projetos de intervenção dos candidatos a diretores não eram cumpridos. 

Decretos como o 55/2018 tinham sido “neutralizados” por uma regulamentação de cariz técnico-instrumental e burocrático. Parecia que a única lei cumprida no reino da educação era… a “lei da gravidade”.

No encontro do Freixo do Meio, realizado a 29 de junho de 2023, os iniciadores de uma nova construção social de aprendizagem e de educação anunciavam o cumprimento da lei, fundamentado numa ciência prudente.

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCLXXV)

Santiago do Escoural, 24 de junho de 2043

Já havia participado em muitos projetos com as caraterísticas da Ponte e do Âncora. A Escola Aberta de São Paulo já garantia a todos os seus alunos o direito à educação. Enquanto isso, em Portugal, ainda havia professores agarrados a velhas e excludentes práticas. 

No junho de vinte e três, ainda havia diretores de  agrupamentos de escolas que inventavam pretextos para manter o status quo:

“Tenho que consultar o pedagógico.”

“Temos que pedir à Dgest.”

Era evidente que nada disso seria preciso fazer. Eram pretextos usados para adiar o cumprimento do projeto da escola (as práticas contrariavam o projeto escrito…), inviabilizar melhorias já comprovadas nas avaliações de outros projetos. 

Entre os anos de 2023 e 2024, redes de comunidades de aprendizagem surgiram, nas duas margens do Atlântico assentes na lei e cientificamente fundamentadas. Durante muitos anos, recorrendo à análise documental, à observação, a entrevistas e registos de encontros informais, esboçáramos um “ponto de situação” da educação. Reconhecendo a necessidade de validação dos dados obtidos, questionamos conclusões, testando-as em processos de mudança e inovação. 

Contemplando indicadores tradicionais e tendo por referência projetos de reconhecida excelência académica e inclusão social, elaboramos uma proposta de intervenção, para implementação de uma educação integral, humanizadora.

Se a manutenção de “centros de estudo” e de “explicações”, o elevado índice de reprovação e os “planos de recuperação”, eram algumas das evidências da falência do modelo instrucionista, por que se deveria adiar transformações?

Já vos tinha falado daquilo que era suposto que, nos círculos de aprendizagem, os jovens do núcleo de Iniciação aprendessem. Desta feita, não escapareis a mais um exercício de didática mínima. Em breves linhas, vos mostrarei o que esperávamos que os jovens aprendessem no núcleo de Desenvolvimento.

Aprendia-se através da reconstrução da experiência. Também se aprendia por associação. E nunca se aprendia uma coisa só. Toda a aprendizagem deveria ser integrada à vida, isto é, adquirida numa experiência real de vida

No núcleo de Desenvolvimento eram trabalhadas competências nas dimensões Linguística, Identitária, Naturalista, Lógico-matemática, Artística e Educação Físico-Motora. 

O jovem aprendia a compreender as suas responsabilidades e a ajudar a cumpri-las, em equipe. 

Mantinha uma boa relação com os outros jovens, aceitava e prestava ajuda, sempre que solicitado. 

Era persistente e revelava concentração no desempenho de tarefas, ultrapassando dificuldades. 

Tomava iniciativas adequadas às situações, sem intervenção alheia. 

Revelava segurança na execução das tarefas a seu cargo. 

Participava com criatividade e ativamente nas atividades realizadas pela escola. 

Aprendia a escutar, a intervir e a fundamentar. 

Aprendia a elaborar, desenvolver e atualizar planificações individuais, explicitando as suas intenções. 

Tornava-se capaz de extrair informações de materiais de pesquisa, de as trabalhar criticamente, de construir conhecimento e de o divulgar, comunicar… partilhar. 

Praticava sociocracia, técnicas de resolução de conflitos, tomada de decisões e reconhecimento de diferentes pontos de vista. 

Mobilizava saberes, para compreender e transformar realidades. 

Na pesquisa, manifestava a utilização de processos complexos de pensamento (a seleção, a análise, a síntese, o senso crítico, a comparação, a avaliação, a comunicação)… autonomamente. 

 

Por: José Pacheco

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